Visivelmente incomodado e irritado em sua primeira entrevista sobre as acusações no escândalo do desvio de subvenções por Organizações Não-Governamentais fantasmas, o ex-deputado estadual e ex-secretário de Estado de Turismo, Esporte e Cultura Gilmar Knaesel (PSDB) se diz alvo de perseguição, faz desafios sobre alguma prova que o incrimine e questiona por que a Assembleia Legislativa, o Fundo Social e a Fesporte não tiveram os repasses investigados. Ele admite apenas a existência de falha administrativa pela equipe e falta de fiscalização pelo Estado sobre a devida aplicação do dinheiro.

Continua depois da publicidade

Dois dias após a Justiça aceitar a denúncia criminal do Ministério Público de SC contra ele e mais 12 pessoas por uma série de crimes apurados na Operação Bola Murcha, como associação criminosa, peculato e corrupção, confira as principais partes da conversa com o repórter Edivaldo Dondossola, da RBS TV, e o Diário Catarinense, em Florianópolis, na tarde desta sexta-feira:

O Ministério Público coloca o senhor como coordenador de um suposto esquema de desvio de dinheiro em eventos que nunca existiram. O que tem a dizer sobre isso?

Sobre a origem da denúncia, esta entidade apresentou documentos legais, não é possível detectar se o endereço confere ou não, que é hoje a acusação porque o endereço é fantasma. Isso é impossível porque nunca foi feita fiscalização in-loco.

Continua depois da publicidade

O senhor conhecia a entidade Mente Sã Corpo São de Biguaçu?

Não, conheci o presidente no presídio. Essa entidade se cadastrou, passou pelo jurídico, comprovou a sua legalidade e o que se comprovou agora é que apresentou endereço falso da sua sede. Ora, o jurídico jamais poderia detectar isso porque não se faz vistoria in-loco, isso foi feito agora.

Knaesel é alvo da Operação Bola Murcha por repasses a ONGs em eventos inexistentes

Nunca se checa se a entidade existe?

Não, nem hoje se faz. A checagem é documental, tem fé pública. Ela apresentou os documentos, tudo reconhecido em cartório, endereço confere com o da Receita Federal, Estadual. Aparentemente estava apta para receber recursos públicos. Solicitou recursos para realizar copa de futebol suíço em Biguaçu de R$ 219 mil, valor do evento, sub-14, sub-16, sub-20. A área técnica avaliou o projeto e disse que ela não tinha capacidade de fazer evento tão grande e liberou 1/3 do valor, R$ 69 mil. A partir do recebimento do recurso a responsabilidade é da entidade, a minha responsabilidade é até liberar o dinheiro. Em 19 de setembro de 2008 a minha gerente de fiscalização e controle detectou possíveis irregularidades. Quem denunciou ao TCE e depois ao MP/SC e à Deic foi a secretaria de Turismo e começou quando eu era secretário, sobre justificar os cheques avulsos de R$ 5 mil e R$ 7 mil e fez vários ofícios. A entidade não respondeu. Que conluio é esse se eu nem conheço o presidente da entidade? O MP afirma que seis entidades tiveram ligações, das quais três nunca receberam dinheiro, nem um real da secretaria de Turismo. Receberam de outros órgãos, por que os outros não? Por que só Gilmar Knaesel?

Quem seriam esses outros órgãos?

Fundo Social, Fesporte e Assembleia Legislativa liberaram recursos para essas entidades. Está aqui (mostra documentos), está nos autos e fizeram vistas grossas por que? E o mais grave: a denúncia da promotora se baseia que é essa entidade, esta Mente Sã, foi criada exclusivamente para fraudar o Seitec (Sistema Estadual de Turismo, Cultura e Esporte) conforme cinco projetos que ela põe. O primeiro foi liberado pelo Fundo Social, o segundo pela Alesc, o terceiro pela Fesporte, o quarto pela secretaria de Turismo e o quinto pela Fesporte. E o que está se dizendo: que Gilmar Knaesel foi responsável por um grande esquema de desvio de dinheiro e está aqui a prova que o recurso veio de outros órgãos também. Fala-se que foram R$ 513 mil, dos quais são 22 subvenções. Oito foram do Fundo Social, cinco da Fesporte, três da Alesc quando eu não era deputado e seis da Secretaria de Turismo, Cultura e Esporte e uma dessas eu nem era mais secretário.

Continua depois da publicidade

O procurador Diogo Ringenberg diz que o senhor estaria envolvido em quase 700 processos no Tribunal de Contas do Estado (TCE), já recebeu mais de 170 multas por irregularidades no repasse de recursos e que já teria sido recomendado pelo TCE que revisse a sua conduta diante do que foi apresentado.

O que está se falando é em multas administrativas, não em desvio de dinheiro.

E esses 700 processos que o TCE fala?

Eu liberei ao longo de oito anos mais de cinco mil convênios, todos estão sendo fiscalizados pelo TCE, erros administrativos. Eu não tinha equipe, pode ter sido alguma falta de assinatura, publicação no Diário Oficial, algum parecer, mas nenhum dolo, nenhuma má fé, nenhum desvio. Você falou o nome de uma pessoa que se coloca como colaborador da Justiça, fugindo das suas atribuições, ele não foi requisitado e ao mesmo tempo se coloca como acusador.

A partir do momento que o senhor libera o recurso não era da sua responsabilidade?

É que as multas do TCE são erros administrativos.

Provocados por quem?

Pela minha equipe. Eu não sou o gerente, eu não sou o jurídico, não tenho como olhar tudo isso. Sou responsabilizado por ser o ordenador, agora pergunte quanto tem o Fundo Social? Por que não falam dos outros órgãos?

Continua depois da publicidade

O senhor acha que está sendo perseguido?

Mais claro que isso, que é perseguição pessoal? Eu estou respondendo esses processos do TCE com muita tranquilidade, faz parte do jogo, estou me defendendo, me justificando, mas não venham me dizer que é dolo. Que venha uma pessoa a se identificar, com nome, endereço e venha dizer alguma vez que teve desvio de dinheiro comigo enquanto eu fui secretário. Faço esse desafio, uma ONG, seja lá o que for, que prove que teve algum conluio.

Durante a sua gestão foram liberados, ainda segundo o MP, R$ 14 milhões…

(Interrompe) Foram mais de R$ 400 milhões liberados, o nosso orçamento era R$ 100 milhões anuais. Como eu ia controlar o que a outra conta faz? É bem clara a lei, a minha responsabilidade é até liberar o curso, mas não venham falar em desvio de dinheiro.

O senhor conhece Leandro Laércio de Souza? (responsável por criar as ONGs que recebiam os recursos, segundo a polícia). Qual a sua relação com ele?

Continua depois da publicidade

Conheço essa pessoa, que é amiga do Kléber (Arlindo Kléber Corrêa, ex-assessor de Knaesel) que foi meu assessor. Conheço mais de 50 mil pessoas no Estado, não tenho intimidade, não sou amigo pessoal.

Escutas de Knaesel indicam contatos e tentativas de escapar da investigação

Numa das ligações interceptadas pela polícia o senhor fala a essa pessoa (Leandro) para fazer cópias, o que quis dizer? A polícia diz que ali o senhor não quis se incriminar…

Essa escuta foi depois do depoimento. Obstrução da Justiça após dar o depoimento? Era cópia do TCE, do processo. Ele queria que uma pessoa olhasse o processo dele no TCE e quem me ligou foi o Kléber, não foi esse cidadão.

Continua depois da publicidade

O seu assessor o Arlindo Kléber também foi denunciado por fazer parte do esquema.

Sim. Não tem nada de prova isso.

“Li as 800 folhas e não achei”, diz advogado Gilmar Knaesel

Essa 1ª Copa de Futebol Amador Suíço de Biguaçu não se realizou.

Isso se sabe só agora, na época não tinha como fazer. Ela apresentou na prestação de contas as fotos, matéria jornalística, como vamos saber disso?

O senhor então admite ao menos que teve falha do Estado em não fiscalizar?

Continua tendo, não só na minha gestão. O Estado não vai lá fiscalizar. Tudo foi feita às claras. O recurso vai para um produtor cultural, um atleta, não podemos ir lá grudar. Ele vai prestar as contas.

Denúncia de falsificação de assinatura gerou investigação da operação Bola Murcha

Por que o senhor acha então que a Deic o associou a essas pessoas?

Onde está o motivo? Eu só posso entender que haja motivação pessoal. Essa pessoa (Diogo Ringenberg, procurador do MP junto ao TCE) se coloca acima das atribuições, ele tem direitos e deveres, vai lá… Por que não denunciou o Fundo Social, a Fesporte e a Alesc?

Continua depois da publicidade

A Fesporte é vinculada à secretaria de Turismo, Cultura e Esporte.

É vinculada, mas tem autonomia administrativa, jurídica e financeira e o diretor é indicado pelo governador, eu não indiquei nenhum.

MPSC denuncia Knaesel e mais 12 pessoas na operação Bola Murcha

A Deic afirma que houve recebimento de vantagens, dinheiro, desviados de subvenções. Como será a sua defesa em relação a isso?

Prova, cadê a prova? Nenhuma pessoa que foi lá depor disse que deu dinheiro para mim, nenhuma. Há uma vontade de me incriminar porque eu não estava no processo, reabriram processo de 2015 instigado por alguém. Das 13 pessoas relacionadas eu conheço duas.

Continua depois da publicidade

Mas segundo a polícia há pessoas que confessaram que havia um esquema.

A polícia… o delegado vai ter que responder muita coisa lá na frente: coação, fazer pergunta a pessoa para uma grávida e dizer ‘ó, teu filho vai nascer na cadeia, vou te prender’, ou tu falar… ‘e Gilmar Knaesel tu conhece?’. Aí a pessoa diz ‘é eu já ouvi falar dele, ele libera recursos para as entidades’. Cadê a prova?

Saiba quem são os 13 indiciados na Operação Bola Murcha, da Deic

Após a sua soltura a defesa questionou as condições que o senhor foi colocado na cadeia. O que tem a dizer a respeito?

Isso quem disse foi o próprio desembargador, que a minha prisão foi totalmente ilegal. Algema não é violência? O delegado oferecer delação premiada, tortura psicológica, dizer ‘eu te tiro do processo, você muda teu depoimento que te tiro agora’, isso não é tortura psicológica? Foi oferecido aos outros (presos), me contaram. Fui para uma penitenciária, que só pode ir quem tem condenação, sofri todos os tratos de um condenado. Isso não é tortura?

Continua depois da publicidade