Semen Rozenman está acostumado a correr riscos que outros preferem evitar.

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No celular, carrega fotos de um de seus trabalhos, nas quais aparece a cavalo, vestido com armadura medieval. Rozenman é dublê de cinema.

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, disse que a Ucrânia está à mercê de elementos nazistas e antissemitas. Se esse juízo for correto, a participação do dublê em filmes como Taras Bulba e Belaya Guardia não se compara, em matéria de risco, a sua decisão de se juntar aos protestos antigoverno em Maidan. Rozenman é judeu.

– O principal problema deste país é que os políticos são excessivamente ambiciosos. Eles não prestam atenção às necessidades das pessoas comuns – afirma o dublê.

O balanço do dia:

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Semen Rozenman, dublê de cinema

Foto: Luiz Antônio Araújo

Se o antissemitismo ronda a Ucrânia, como alerta Putin, as potenciais vítimas, como Rozenman, não parecem preocupadas. Zero Hora visitou três instituições judaicas de Kiev na tarde de ontem. Todas funcionam em endereços centrais e de fácil acesso e ostentam placas de identificação e símbolos religiosos visíveis da calçada. Em apenas uma delas, a sinagoga do movimento ortodoxo Chabad Lubavitch, o visitante é obrigado a passar por detector de metais e exibir o interior de bolsas e mochilas – procedimento quase banal se comparado a uma agência bancária brasileira.

Na maior instituição judaica do país, a Sinagoga Central de Kiev, um imponente prédio de dois andares no antigo bairro de Podol, o aparato de segurança limita-se a um portão de ferro aberto, uma guarita e um porteiro. Construído em 1895, o local foi vandalizado durante a ocupação nazista de Kiev.

O rabino-chefe Yaakov Dov Bleich, da União de Organizações Religiosas Judaicas da Ucrânia, comenta a respeito das manifestações do presidente da Rússia na entrevista:

– Não concordo com o senhor Putin. Isso é propaganda russa.

Segundo o rabino, desde janeiro ocorreram quatro ataques de feição antissemita na Ucrânia. Dois deles, nas imediações da Sinagoga Central, tiveram indivíduos como alvos. Autoria e motivações são desconhecidas. Os incidentes, conforme Bleich, podem ser obra de indivíduos ou grupos antissemitas ou “provocações” destinadas a aumentar a tensão no país. Em Zaporija, no sul, coquetéis molotov foram lançados contra uma sinagoga, e, em Simferopol, um templo foi pichado com dizeres antissemitas. Se o número não é insignificante, tampouco faz sombra a outros países: somente no ano passado, foram computados 10 ataques antissemitas na Argentina, seis na França e quatro na Rússia.

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Yaacov Dov Bleich, rabino-chefe de Kiev e da Ucrânia

Foto: Luiz Antônio Araujo

Para Bleich, três partidos – Batkivshchina (Pátria), Udar (Soco) e Svoboda (Liberdade) – abrigam elementos notoriamente antissemitas, mas nenhuma dessas agremiações controla o governo. Por isso, “até que a situação se estabilize”, é preciso dar prioridade à segurança, especialmente de sinagogas e centros comunitários.

– Aguardamos um futuro melhor. Temos grandes esperanças de eleger um novo presidente e um novo governo em maio, afinado com ideias ocidentais – sustenta.

Larisa Zeltser, coordenadora da Claims Conference, entidade de assistência a vítimas do Holocausto na Europa Central e Oriental, vê com desconfiança o movimento de Maidan na Ucrânia:

– É certo que deveríamos mudar o governo, mas não gostei da forma como isso foi feito. Eu preferiria que as coisas tivessem sido feitas de maneira pacífica. Gosto da Rússia e também da União Europeia.

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Formada em engenharia naval em Kaliningrado, de 1974 a 1976, e com uma passagem por Murmansk, ambas na antiga União Soviética (hoje Rússia), onde vivem alguns de seus parentes, Larisa se mostra mais preocupada com o caráter insurrecional do movimento de Maidan do que propriamente com o antissemitismo.

– Quero viver num país tranquilo e pacífico, sem revoluções ou lutas. Trabalho com pessoas que foram vítimas do nazismo. Conheço o problema pela vivência, não pelos livros. Assisti a uma entrevista de um jovem de Pravvy Sektor (Setor Direitista, grupo político de extrema direita) pela TV. Ele propôs uma “Ucrânia para os ucranianos”. Isso é preocupante, porque a Ucrânia é composta de muitas nacionalidades – afirma a engenheira.

Mesmo sem ter pisado em Maidan, Larisa conta com informações de primeira mão sobre o que se passa na praça. Filhos, netos e uma de suas melhores amigas estiveram presentes nos protestos.

Do correspondente

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Conheça, em vídeo, a Praça Maidan, epicentro da revolta ucraniana:

Em fotos, os sinais de luta pela Ucrânia: