Salas vazias, computadores desligados, quadra de esportes desocupada. Este era o cenário que a reportagem da Hora encontrou na Fundação Catarinense de Assistência Social (Fucas) na manhã desta terça-feira, 20. Pelo menos 200 crianças e adolescentes moradores do Morro da Caixa, região continental de Florianópolis, deixam de ser atendidos pela entidade, que ainda não iniciou as aulas. A falta de verba e endividamento da instituição, que precisou da intervenção do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), impedem o retorno das atividades.
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Enquanto isso, os 33 funcionários da Fucas, que estão sem receber o salário desde novembro, fazem greve e aguardam que o novo interventor indicado pelo MPSC consiga reativar a entidade. A assistente social Juliane Soares Feubach comenta que o trabalho realizado pela fundação é muito importante para os jovens que vivem numa comunidade conhecida pelo poder do tráfico de drogas.
— O fato de nós estarmos parados indica que a violência pode aumentar cada vez mais, porque estamos deixando essas crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade. Eles ficam vulneráveis ao tráfico de drogas e podem ser aliciados a qualquer momento. Lógico, nada impede que, mesmo em atividades, eles sejam aliciados também, mas a probabilidade é muito menor — diz Juliane.
Na sexta-feira, 16, o juiz da 2ª Vara Cível da Comarca da Capital do Continente, Cláudio Eduardo Regis de Figueiredo e Silva, deferiu liminarmente o pedido do MP para nomear Luiz Antônio Costa, ex-membro do conselho fiscal, como administrador provisório da Fucas. Costa assinou o Termo de Compromisso nesta segunda, 19, e assume o cargo nesta terça-feira, 20.
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Ele ficará à frente da instituição por seis meses e terá a missão de reestruturar administrativamente a entidade, adotar medidas para arrecadar dinheiro — como a venda de um imóvel de propriedade da Fucas em Jurerê, que custa R$ 4,5 milhões — e recuperar os recursos investidos em fundos — a antiga administração aplicou um patrimônio de R$ 46,9 milhões em ativos sem liquidez.
Intervenção e investigação do Ministério Público
Em novembro do ano passado, a 25ª Promotoria de Justiça instaurou inquérito civil para apurar possível responsabilidade dos gestores da Fucas para o endividamento da entidade. No entanto, o agravamento da crise na fundação, incluindo atrasos em pagamentos de salários e falta de pagamento a fornecedores e prestadores de serviços, fez com que o MPSC interferisse na administração da fundação.
Em fevereiro deste ano, durante reunião na sede da OAB de Florianópolis entre o MPSC e o conselho curador da Fucas, o então diretor-presidente da entidade, Roberto Ulisses de Alencar, renunciou ao cargo. Na mesma ocasião, a promotoria indicou o nome de Costa para assumir como representante legal da entidade.
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Pais preocupados
A Fucas atende, desde 2003, cerca de 200 crianças e adolescentes carentes, principalmente do Morro da Caixa. A entidade oferece oito oficinas no contraturno escolar — judô, dança, circo, informática, artesanato, esporte de quadra, recrearte e jiu-jitsu — além de curso de capacitação para Jovem Aprendiz, com mais 262 vagas.
Trabalhar com arte circense é o sonho de Letícia Rosa dos Santos, de 13 anos. Desde os 11 anos ela faz aulas de circo, judô, informática e esportes de quadra na Fucas e se apaixonou pela arte circense.
— Ela quer muito continuar na Fucas porque é o que mais gosta, ela adora o circo. A vontade dela é seguir a carreira circense, tanto é que fazia muitas apresentações. Eu espero que as aulas voltem — diz a mãe de Letícia, a auxiliar de serviços gerais Marciane Rosa Ribeiro, 37.
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Moradoras do Morro da Caixa, atualmente a filha de Marciane estuda meio período e à tarde fica em casa na companhia da avó, mas já está matriculada na Fucas para, quem sabe, voltar a praticar as atividades que tanto gosta.
Os filhos da faxineira Alexandra Rosa Sales, 35 anos, estão sem participar das aulas desde outubro do ano passado. A mais velha, de 17 anos, participava do curso de capacitação de Jovem Aprendiz, e o mais novo, de 14, fazia diversas oficinas, como judô.
— O meu filho mais novo, por exemplo, ia direto da escola para a Fucas, mas como não serviam mais refeições na fundação, não tinha como deixar ele sem almoçar — conta a mãe, que .
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— Começou com a falta de alimento, atraso nos salários e não chegávamos a um acordo entre pais, funcionários e coordenação. É uma situação muito ruim para nós pais, porque era uma tranquilidade que nós tínhamos para deixar os filhos em segurança, é bem complicado deixa-los livres nessa idade.
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