Prometo que este será meu último Contexto sobre Bali este ano (nunca se sabe onde poderemos estar amanhã), mas faltaram algumas considerações na semana passada, por conta do limite desta coluna (no caso 3,4 mil caracteres – que geralmente ultrapasso), então, as faço agora.

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A Ilha de Bali, uma das milhares do arquipélago Indonésio, é a única hinduísta num mar de ilhas muçulmanas ao redor. É também uma ilha com governo autônomo cuja subordinação ao governo geral da Republica da Indonésia – capital Jacarta – torna-se restrito, para a felicidade geral da sua população feminina que não precisa ficar coberta da cabeça aos pés com lenços e burcas num calor úmido que ultrapassa os 30 graus o ano todo, assim como para os moradores estrangeiros vindos de todos os cantos do mundo, bem como a população de turistas. E todos estes estrangeiros, assim como o próprio balinês, querem de Bali o que ela tem de melhor: seu despojamento.

Por mais que existam beach clubs privados e requintados, com belíssimas piscinas na beira da praia, serviço impecável, comida internacional e drinks lindos e exóticos, os seus frequentadores andam de bermudas, vestidinhos soltos e chinelos de dedo. Nada de carão, bocão e cabelão ou corpinhos embalados à vácuo. O conforto e a simplicidade tomam conta e servem quase como normas de comportamento. É claro que nestes locais também encontramos novos ricos, gente excêntrica e extravagante, mas são quase todos como peixes fora d’água, pulando deslocados e chamando a atenção de forma muito mais negativa do que positiva, quando realmente chamam a atenção. A maioria é mesmo ignorada, pois dentro da cartilha do despojamento, não ligar para a forma como o “vizinho” se porta é regra.

Este despojamento, no sentido de despir ou desembaraçar, estende-se a qualquer local, lojas de grifes, restaurantes, banco, templos, shoppings, boates, enfim, anda-se pela ilha como quem vai à praia e ninguém olha ou deixa de atender com simpatia porque não se está devidamente vestido para a ocasião. Em Bali, roupa é só roupa, e não funciona como mapa existencial ou saldo de crédito bancário.

Mas voltando ao fato desta província ser basicamente de religião hindu, contra alguns poucos católicos e mulçumanos, isto a torna ainda mais especial, pois graças a esta religião, o dia a dia do nativo é repleto de rituais e oferendas que encantam até os mais céticos. Todas as casas possuem pequenos templos ou altares na parte externa que são diariamente enfeitados com dádivas expostas em pequenas cestas de palha junto a flores e outros objetos e onde são acessos incensos em nome dos deuses.

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Os hindus acreditam no Karma ou o nosso conhecido “aqui se faz, aqui se paga”, e com a ajuda de várias divindades e crenças (leia-se atitudes) sobre bons e maus espíritos que povoam o imaginário balinês, não é difícil tender a associar sua religiosidade com os baixos índices de roubos e violência na ilha registrados. Ainda bem que nenhum juiz desinformado passou pela encantadora Bali para legislar sem conhecimento de causa sobre o que é divino ou não. Sorte deles que sua religião, mesmo diferente do resto do país, está acima do ego e do despreparo humano.

E só para finalizar, deixo aqui uma curiosidade, ainda se tratando de karma e reencarnações – questão intrínseca ao hinduísmo. O balinês acredita que o cachorro é a pior encarnação que possa existir, pois são seres de pouca luz. Se confere não sei, mas acredito que os cães de Bali acreditam nesta ideia. Eles, que passam o dia dormindo e pacificamente largados nas ruas, ao entardecer transformam-se, andam em pequenas matilhas e se tornam muito agressivos com os pedestres, além do que são os mais feios que já vi.

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