Engenheiro civil, professor da UFSC e diretor técnico da Associação Catarinense de Engenharia, Roberto de Oliveira acredita que o processo de deterioração das pontes Colombo Salles e Pedro Ivo Campos tende a ser cada vez mais acelerado caso não ocorram intervenções.
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Mas, para Oliveira, que atuou como técnico não remunerado no relatório sobre as pontes encomendado pelo Deinfra, não há risco de colapso imediato. Confira a entrevista:
As pontes correm algum risco direto de colapso?
Não. Há fissuras pontuais que não comprometem a estrutura, mas gosto de comparar a situação das pontes com uma febre de 36ºC, 37ºC. Não é grave, a pessoa não vai morrer por causa disso, porém se não for tomada nenhuma providência, pode acabar se tornando muito mais perigoso. Em ambas as pontes não houve nem mesmo aquela manutençãozinha básica ao longo de todos estes anos, o que levou à situação atual.
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Se não há risco de colapso, qual é a situação que mais oferece risco às pessoas?
Acredito que sejam as placas de concreto, que estão se soltando e caindo direto no mar. A 30 metros de altura, uma placa dessas chega na água como se fosse uma bomba. Se uma delas cai dentro de um barco, mesmo um grande, a embarcação vai a pique em poucos minutos. Ou pior ainda, se tiver alguém no caminho, é cortado no meio, esmagado. Esse é o problema mais grave e que precisa de uma solução imediata.
As fissuras no concreto são um assunto preocupante?
O concreto é um material poroso que, quanto mais fechado, mais resistente é. Mas isso não quer dizer que ele vai durar para sempre. Na década de 1970, quando a Colombo Salles foi erguida, a norma definia um comprimento de concreto de 1,5 centímetro. Estas normas já caducaram. Em um ambiente como esses, qualquer rachadura faz a atmosfera salina alcançar a armadura (parte de metal). O mínimo recomendável hoje seria de 4,5 centímetros. Quando uma fissura permite a entrada da atmosfera, o aço começa a oxidar e incha, acelerando muito o processo de deterioração.
O custo de uma grande reforma seria mais alto ou mais baixo que o de pequenos e constantes reparos?
As intervenções contínuas e a curto prazo são mais baratas e mais factíveis do que os grandes reparos. Se deixar acumular, acaba ficando do jeito que está agora, e aí são necessárias grandes intervenções, que mobilizam muita gente. É como a manutenção de um carro: não foi feito o básico, então vai ser preciso mexer no motor. Agora, imagine uma ação de manutenção ou um acidente que interrompa o trânsito nas pontes durante um período maior. O que você acha que vai acontecer na cidade?
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E essas pequenas manutenções não atrapalhariam o trânsito da mesma forma?
Eventualmente, mas para não se chegar à necessidade de cortar o trânsito totalmente, é preciso fazer pequenas intervenções o tempo inteiro, que interrompam o fluxo por algumas horas da madrugada. Senão, mais cedo ou mais tarde – provavelmente até mais cedo que se espera – será preciso fazer uma ação maior e parar o trânsito. Isso é mais danoso à mobilidade da cidade e à própria estrutura da ponte.
Quanto tempo as pontes continuam em bom funcionamento sem nenhuma intervenção?
Acredito que de 10 a 15 anos. Depois, vai ser preciso parar tudo, fechar o trânsito e realizar uma manutenção séria. Por enquanto, os carros podem passar tranquilamente, mas todo o resto está ruim. Me chamam de catastrofista porque eu falo isso, mas eu sou engenheiro, e o engenheiro é treinado para pensar as catástrofes e evitá-las.
O relatório encomendado pelo Deinfra ressalta que é necessário remover qualquer tipo de cabo ou tubulação que passe por dentro da ponte. Estes cabos oferecem algum risco à população?
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Primeiro, porque se deixar os cabos como estão, eles são facilmente roubados. É o que já acontece em muitos lugares da cidade. Mas além disso, há lugares que estão interditados, que oferecem grave risco às pessoas que chegam perto deles. Durante a nossa visita fomos acompanhados por técnicos da Celesc porque há cabos de alta tensão que, se a pessoa passa a menos de 30 centímetros dele, já é puxada – e morre na hora, não apenas leva um choquezinho. Isso acontece principalmente perto das cabeceiras, que são de ainda mais fácil acesso.
Como a engenharia como um todo tem encarado essa prática da manutenção contínua em estruturas de grande porte?
Mesmo nas escolas de engenharia o concreto é pensado como algo que dura para sempre. Uma das culpas é do currículo da engenharia – menos, talvez, a engenharia mecânica e a elétrica, que pensam muito mais nos bens duráveis. É difícil incorporar conceitos de manutenção numa edificação ou numa ponte de grande porte, mas existem autores muito bons que trabalham com este foco. Não é só fazer a manutenção, é preciso fazer um plano que preveja ações constantes e o tempo inteiro.
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Por quê você acha que a manutenção não foi feita da forma correta nas últimas décadas?
Ao invés de fazer a manutenção de uma ponte, o governo pode fazer 20 pontes pequenas em diversas cidades, o que rende muito mais votos. O resultado é esse aí: na prática, a manutenção permanente sai muito caro politicamente, mas bem mais barato no que diz respeito ao patrimônio da cidade. As pontes e todo o investimento feito nelas não são do Deinfra ou do governo, são nossos.
Se você fosse liderar uma intervenção nas pontes, o que faria primeiro?
A primeira coisa que eu faria é recuperar todo o cobrimento de concreto. Depois mexeríamos nos pontos mais específicos. A recuperação da face externa tem tanto um caráter técnico quanto estético: aumenta a estabilidade e tira esse mau aspecto que as pontes adquiriram.