Cinco pontos levaram o Ministério Público Federal a mover ação na Justiça para a suspensão da votação do Plano Diretor de Florianópolis na Câmara de Vereadores que estava marcada para esta terça-feira. Enquanto a prefeitura ingressa com recurso no Tribunal Regional Federal da 4ª região (TRF4), em Porto Alegre (RS), para tentar evitar o prazo que vence nesta quarta-feira para o retorno do projeto de lei para o Executivo, a procuradora da República Analúcia Hartmann comemora a decisão da Justiça Federal.

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O juiz Marcelo Krás Borges concedeu 60 dias para que a administração municipal realize 14 audiências públicas – 13 distritais e uma geral -, sob pena de multa em caso de descumprimento no valor de R$ 1 milhão. Na decisão, Borges afirma que as audiências públicas não foram suficientes para discutir o projeto e que, feitas às pressas, as últimas tiveram a intenção de apenas mostrar a proposta, sem acatar sugestões da população. Esse foi o principal argumento da procuradora.

Além da falta de participação popular na elaboração do Plano, Analúcia ainda aponta a rápida tramitação do projeto na Câmara de Vereadores, a falta de disponibilização dos documentos e do anteprojeto para apreciação da população, a dissolução do Núcleo Gestor em período crucial para a proposta e a falta de orientação do Ministério das Cidades, que fiscaliza a elaboração dos planos diretores em todo o país.

O superintendente do Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (Ipuf), Dalmo Vieira Filho, afirmou que a prefeitura vai recorrer. Disse que o Executivo realizou durante os sete anos em que o plano foi discutido mais de mil audiências públicas, sendo que 54 reuniões foram feitas apenas no segundo semestre deste ano. Segundo o procurador-geral do município, Julio Cesar Marcellino Júnior, a prefeitura recebeu notificação no final da quinta-feira para se manifestar sobre as acusações do MPF. O prazo para resposta era até domingo.

Com o feriado no dia 15 de novembro, o procurador afirma que a administração não teve dias úteis para conseguir coletar os documentos e atas que comprovam a realização das audiências.

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– Vamos juntar as mais de mil atas de reuniões e encaminhar como recurso ao Tribunal Regional Federal. Vou pessoalmente a Porto Alegre cuidar disso – diz.

Câmara de Vereadores devolveu projeto ao Executivo

A Câmara de Vereadores, segundo o presidente César Faria (PSD), foi comunicada oficialmente da decisão do juiz e determinou a suspensão da votação e o retorno do projeto ao Executivo. Disse que a Casa havia recebido na tarde de segunda-feira uma notificação para prestar esclarecimento sobre a tramitação do projeto de lei, que ia para votação ontem. Faria diz que as 620 emendas que o Legislativo propôs ao projeto seriam votadas.

– Acreditamos que a matéria tem que ser votada. Foram setes anos de trâmite com ampla participação popular – conclui.

Os cinco pontos questionados pelo Ministério Público

Audiências Públicas

Segundo Analúcia Hartmann, procuradora da República, nos sete anos em que o Plano Diretor foi discutido houve participação popular. Mas quando o projeto já estava consolidado e deveria ir para discussão final, esse processo foi interrompido.

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Para ela, foi realizada apenas uma audiência pública, o restante foram reuniões. Não houve participação efetiva da população. A procuradora diz que teve acesso a registros das reuniões e em algumas os funcionários do Ipuf não sabiam responder os questionamentos da comunidade. Em outra, não teve quórum. Além disso, de acordo com ela, a única audiência pública que ocorreu não teve aviso com 15 dias de antecedência e ampla divulgação na mídia, como manda o Ministério das Cidades.

Tramitação na Câmara

A procuradora da república alega que a tramitação foi muito rápida na Câmara. Analúcia recebeu a informação de que o procurador da Câmara teve que emitir parecer sobre o projeto de lei em um dia e acredita que o número de emendas indica que alguma coisa estava errada.

Ela afirma que tem gravações da audiência pública proposta pela Câmara em que o secretário Dalmo diz que é para que a pessoa encaminhe a documentação que ele vai incorporar ao projeto. De acordo com ela, isso deveria ser feito quando o anteprojeto estava no executivo e não transformando as sugestões em emenda.

Dissolução do Núcleo Gestor

O Núcleo Gestor, conforme Analúcia, foi dissolvido depois de uma reunião antes da entrega do projeto de lei à Câmara de Vereadores. Na reunião, em que o secretário Dalmo estava presente, os membros do núcleo votaram pela realização de 13 audiências públicas nos distritos. A procuradora afirma que o secretário não concordou com o posicionamento. Logo após, um decreto revogou o Núcleo Gestor, que havia sido legalmente formado no início do mandato do prefeito Cesar Souza Júnior para contribuir com as discussões do Plano Diretor. O rompimento com o Núcleo Gestor, de acordo com ela, foi unilateral.

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Falta de parceria com Ministério das Cidades

O secretário Dalmo, segundo Analúcia, disse que pediu orientações para o Ministério das Cidades para elaboração do Plano Diretor. No entanto, ela disse que entrou em contato com a Advocacia Geral da União, mas que eles informaram que nunca prestaram esclarecimentos à prefeitura. O Ministério das Cidades também foi criticado pelo MPF porque não fiscalizou as discussões do Plano Diretor em Florianópolis.

Transparência com o projeto

Conforme a ação civil pública movida pelo MPF, não teriam sido disponibilizados o anteprojeto, os mapas e as plantas do Plano Diretor em local que a população pudesse ter acesso para poder questionar nas supostas audiências públicas. Analúcia diz que tentou encontrar documentações no site da prefeitura, mas não obteve acesso. A procuradora ainda argumenta que os vereadores receberam as plantas do Plano depois que ele entrou em tramitação. Para ela, isso significa que não estavam prontas e não puderam ser avaliadas pela população.

Um terço dos entrevistados diz desconhecer o projeto

Cerca de um terço (35%) dos entrevistados em uma pesquisa do Instituto Mapa declarou não ter conhecimento do que seja o Plano Diretor, mas 79% dizem acreditar que está de acordo com o que almejam para a cidade. A maioria (75%) também demonstra incredulidade no cumprimento das ações. Temas que envolvem a revitalização da Baía Sul e do Centro e as diretrizes para novas construções são os principais pontos de discordância, segundo a pesquisa. Do documento de mais de 100 páginas da prefeitura, composto por 329 artigos, o Mapa selecionou 36 temas considerados os mais discutidos publicamente.