Há 34 anos, Darci e Ivanilda Reinke saíram da casa em Schroeder e compraram um imóvel em um terreno bucólico em meio aos pastos do bairro Rio da Luz, em Jaraguá do Sul.
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A casa grande e antiga eleva-se em relação às moradias vizinhas e chama atenção pela arquitetura. O imóvel é de 1921 e hoje está vazio, com o telhado torto pela ação do tempo. A casa faz parte da área considerada patrimônio histórico nacional, que abarca todo o bairro e se estende até a região do Testo Alto, em Pomerode.
O conjunto rural foi tombado em dezembro de 2007 e integra os Roteiros Nacionais de Imigração. Sete anos depois, porém, moradores relatam mais incômodos do que benefícios com a medida.
_ Paramos no tempo _ lamenta Darci, resumindo um sentimento compartilhado por muitos moradores.
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Muitos imóveis antigos estão com problemas estruturais. Há telhados caídos, paredes em mau estado de conservação e goteiras.
Um dos maiores problemas são os cupins, que consomem a madeira que forma a base de muitas casas. Alterando a paisagem, muitos moradores construíram novas casas ao lado dos patrimônios antigos e é comum encontrar essa dupla nos terrenos: imóveis centenários ladeados por casas modernas. A alternativa é vista como a única saída, já que muitos não percebem opções de restauro por causa do alto custo dessas obras.
Muitos moradores sentem que estão presos em um emaranhado de normas. Há a impressão de que não há nada que possa ser feito no bairro sem a autorização do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) _ o que, em muitos casos, é verdade. Pouco mais de cinco anos após o tombamento, uma portaria foi publicada, tornando claras as novas normas do bairro. Ali está elencado tudo o que pode e que não pode ser realizado.
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Reformas, por exemplo, precisam de autorização do instituto. Novas casas devem seguir padrões de construção predeterminados.
Há normas distintas para diferentes trechos do bairro, porém, toda e qualquer intervenção deve ser avaliada previamente. Inclusive as mudanças na paisagem, já que não são apenas os imóveis que são tombados, mas todo o conjunto formado por casas, relevo e vegetação.
Apesar de compreender as dificuldades encontradas por moradores, Maria Regina Weissheimer, arquiteta e urbanista do Iphan de Santa Catarina, defende a importância do tombamento.
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_ Quando se trata de preservação do patrimônio, o interesse público se sobrepõe ao interesse individual ou privado. Pode parecer difícil e, de fato, é uma questão complexa, mas o que está em jogo, no caso de Rio da Luz, é um interesse nacional por esse pequeno recorte territorial que guarda uma das mais preciosas heranças do processo de imigração no século 19 no Brasil _ ressalta.
Projetos devem ser enviados ao instituto
Maria Regina Weissheimer, arquiteta e urbanista do Iphan de Santa Catarina, explica que quem deseja intervir nos imóveis deve enviar um projeto ao instituto, que tem até 45 dias para análise e emissão de um parecer técnico. Há ainda a opção para famílias que não têm recursos para a obra.
– Precisa ser um imóvel localizado dentro da área tombada e ter valor cultural, e a aferição é feita pelo Iphan. As solicitações são avaliadas caso a caso e tudo dependerá também da disponibilidade de recursos – explica Maria Regina.
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É o caso dos Reinke. A casa antiga foi reformada em 1998 e resistiu por anos, porém, os cupins voltaram a prejudicar a estrutura. Já com o decreto do tombamento, o casal não encontrou meios de fazer um restauro. Em 2010, uma nova casa foi construída ao lado da antiga e é lá que a família vive, enquanto a casa histórica, vazia, é cada vez mais degradada pela ação do tempo.
Neste ano, o casal irá enviar a documentação e espera conseguir o benefício para a reforma. Segundo o chefe do serviço do Iphan em Jaraguá do Sul, Marcelo Levandowski, eles são uma das primeiras famílias a buscar esse tipo de recursos no bairro. Ele ressalta que são as próprias famílias que devem procurar o instituto e alertar para problemas estruturais, pedindo auxílio para eventuais restauros.
Apesar da alegação de haver relatórios sobre a estrutura do bairro, a Fundação Cultural de Jaraguá do Sul mantém apenas levantamentos dos imóveis das duas ruas principais do bairro. Foi apenas a partir de 2011, quando um termo de ajustamento de conduta (TAC) foi assinado entre Prefeitura, Iphan e Ministério Público, que as atenções voltaram-se mais intensamente para o bairro. Mesmo assim, uma das primeiras ações de grande porte desde então é a atual reforma da Casa Rux.
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Segundo Egon Lotário Jagnow, da Fundação Cultural de Jaraguá do Sul, um dos termos do TAC deve sair do papel neste ano. A intenção é contratar uma empresa que fará um levantamento completo do bairro, com informações sobre topografia, rios, perfil socioeconômico e cultural.
– As pessoas ainda não descobriram o valor desse local. Ter uma paisagem cultural tombada é algo maravilhoso – defende .
Ilse Rahn é uma das moradoras que descobriu esse potencial. Ela reformou a casa enxaimel há 12 anos, antes do tombamento. A residência ainda serve de moradia para ela e o filho, que criou ao lado do imóvel o Pesque e Pague Alcir. Nos fins de semana, são servidas porções e a propriedade passou a ser rentável com o novo negócio.
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Casa Rux, de 1915, está em reforma
Construção de 1915, a Casa Rux está sem moradores desde 2007. A família construiu uma casa nova ao lado da antiga por causa dos problemas estruturais da casa em enxaimel. Após diversos pedidos dos Rux, o imóvel finalmente passa por reforma. A obra começou no fim do ano passado, ficou parada por dois meses por falta de uma licença, e agora funcionários retornaram ao trabalho.
Toda a estrutura será restaurada: as madeiras serão trocadas, paredes e telhas, renovadas. O projeto é executado e custeado pelo Iphan, que investe R$ 300 mil na obra. A previsão de entrega é para outubro. Segundo Maria Regina Weissheimer, a reforma foi aprovada porque um dos proprietários demonstrou interesse em abri-la para visitação.
A família, de fato, pensa em abrir o imóvel para visitação. Até 2007, mesmo quando o espaço era utilizado como moradia, suas portas eram abertas à comunidade. Com os problemas na estrutura, ela foi fechada, mas Evandro Rux, filho dos atuais proprietários Edvino e Cristiana Rux, pensa não apenas em morar ali, mas em transformar a casa em um ponto turístico. Para isso, porém, ele conta com ajudas necessárias:
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_ Primeiro, temos que ter turistas, para começar a funcionar. Hoje não vale a pena sair do trabalho na fábrica para ficar aqui e receber só um turista por semana. O tombamento será bom para o bairro a longo prazo, mas até agora não mudou nada _ afirma Evandro