Desempregados, moradores de rua e se dizendo usuários de crack, dois paranaenses de Curitiba foram os primeiros presos em flagrante a serem apresentados a um juiz na chamada audiência de custódia em Santa Catarina, na manhã desta segunda-feira, em Florianópolis. O ato teve a presença do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski.
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A dupla arrombou uma loja de madrugada na Rua Felipe Schmidt, no Centro, e foi detida pela Polícia Militar por tentativa de furto.
Um deles ganhou a liberdade. O outro, por ser reincidente, teve a prisão preventiva decretada e foi encaminhado ao presídio.
Realizada numa sala do Tribunal de Justiça (TJ), a sessão durou menos de 30 minutos. O ministro Lewandowski acompanhou o ato sentado ao lado do juiz Rafael Sandi, que presidiu a audiência. No outro lado do juiz ficou o presidente do TJ, desembargador Nelson Schaeffer Martins.
Parte das autoridades que havia participado do termo de adesão do Estado à iniciativa, numa outra sala, também assistiu, além da imprensa.
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Everton Valdir da Silva Lins, 30 anos, entrou algemado escoltado por um agente do Departamento de Administração Prisional (Deap). Após a rápida formalidade feita pelo juiz, o preso passou a responder perguntas sobre a sua vida e o crime que havia cometido.
Contou que perdeu o emprego há 15 dias de uma empresa em Biguaçu e então passou a fazer artesanato e vender em semáforos. Sem dinheiro, disse que não conseguiu mais pagar o aluguel de uma quitinete, passando a morar na rua. Com a fala mansa e frases curtas, relatou ter sido agredido pelos policiais militares, jogado no chão e pisado.
– Estava sem arma, sou usuário de drogas, não consegui pegar nada da loja. Levei tapas, chutes e empurrões. Fui jogado no chão igual a lixo, não deixaram nem levantar – narrou ao juiz.
Do lado do Ministério Público estavam o procurador-geral de Justiça, Sandro José Neis e dois promotores. Um deles, Alexandre Graziotin, se manifestou pelo homologação do flagrante, mas que não havia a necessidade de mantê-lo atrás das grades com a prisão preventiva.
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A defensora pública, Fernanda Mambrini Rudolfo, observou que o flagrante não estava em ordem, que houve tortura e abuso de autoridade.
Liberdade e promessa de tratamento
O juiz avaliou que a prisão foi legal, que o suposto abuso deve ser apurado em momento oportuno, pois não havia a comprovação e determinou a liberdade provisória, fixando medidas restritivas como comparecimento mensal ao juízo e proibição de frequentar bares e boates.
Everton recebeu o alvará de soltura e a promessa de encaminhamento ao serviço social do Estado para tratamento das drogas.
– Essa é a típica situação onde a pessoa não pode ficar presa e deve sim receber tratamento de saúde – comentou na sala o secretário-adjunto da Justiça e Cidadania, Leandro Lima.
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Segundo homem ouvido tem prisão decretada
Já sem a presença de Lewandowski, o segundo preso ouvido, Reginaldo Mendes, também se disse usuário de crack, desempregado e morador de rua.
De bermuda, chinelo de dedos e com um ferimento na testa, o homem também comentou ter sofrido violência de PMs. O juiz reparou que o ferimento já apresentava cascas e assim não podia ter sido de horas antes.
Ao perceber a chegada da polícia na loja, os dois tentaram se esconder no banheiro e resistiram à prisão tentando impedir que os PMs abrissem a porta.
– Não estava legal. É o vício maldito – admitiu Reginaldo, que devido a outros três antecedentes de furtos e não ter se apresentado ao juízo na última vez que ganhou a liberdade acabou tendo a prisão preventiva decretada.
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– Você já teve oportunidade e não aproveitou – disse o juiz ao preso.
No segundo depoimento, homem ouvido teve a liberdade negada e continuará preso.
Deap manterá agentes no Fórum
As audiências de custódia passarão a acontecer diariamente em Florianópolis, mas ainda sem data para começar. Em 24 horas, os presos em flagrante terão de ser levados ao Fórum, onde participarão da audiência com um juiz.
O Deap anunciou que manterá uma equipe no subsolo do prédio, onde há carceragem e ficarão os detidos enquanto durar a apresentação ao magistrado.
A Central de Penas e Medidas Alternativas atuará em conjunto oferecendo as devidas assistências e dando os encaminhamentos. Por dia, há entre cinco a oito prisões em flagrante na região da Grande Florianópolis.
“Expectativa é trazer maior qualidade na análise das prisões”, diz juiz