Na primeira metade do século 20, o sociólogo americano Robert Merton tentou explicar a violência urbana pela teoria da anomia. Segundo ela, a pressão social para que as pessoas progridam economicamente, na felicidade do ter e não do ser, é imposta e não decorre de livre escolha do indivíduo. E como os meios para se chegar a essa meta não são oferecidos para todos, muitos se desligam do coletivo e de suas regras e passam a agir na marginalidade.

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Quatro bairros concentram quase um terço das mortes violentas de Joinville

Apesar do tempo, essa teoria continua a fornecer elementos que podem ajudar a explicar o mundo de hoje. Vivemos num ambiente de desigualdade social, onde se formam consumidores e não cidadãos. Desta maneira, quando as oportunidades não são iguais para todos, onde a riqueza é concentrada e onde as instituições falham, a violência cresce e a paz acaba acontecendo pela força, através de ações de confronto, desprovidas de fundamentos científicos, que apenas fazem vencer eleições mas nada previnem.

Joinvilenses mostram o que fazem para diminuir a sensação de insegurança na cidade

Em outros termos, numa sociedade líquida (Bauman), onde não mais se acredita no Estado, gerido que é por governos incapazes de garantir a resolução dos problemas que a vida em sociedade apresenta, as pessoas deixaram de se sentir pertencentes. Nesta crise, órfãs de referências sólidas, premidas pelos meios de consumo e pela coisificação dos relacionamentos, elas partiram para um egocentrismo que solapou a ideia de solidariedade, alteridade e ética. Assim, no lugar de entender o outro e por ele ser reconhecido, a energia é destinada a ser visto, ser falado pelo maior número de pessoas, ainda que pelos meios superficiais e nebulosos das redes sociais.

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Ocorre que harmonia só se estabelece em sociedades onde o contrato social se firma, quando todos se sentem parte de um todo, quando todos são reconhecidos em suas profissões, estudos, modo de vida, quando todos, embora diferentes em sua individualidade, têm direitos iguais, oportunidades iguais. Esse posicionamento não é fruto de idiossincrasias, mas, sim, de submissão à história, à ciência e, especialmente, à Declaração Universal dos Direitos Humanos e à Constituição Federal.

*Juiz da Vara de Execuções de Joinville