Arrependimento não é uma palavra usada pelo prefeito Udo Döhler ao explicar a decisão de voltar atrás e manter completo o programa de residência médica do Hospital São José de Joinville.
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O prefeito, na verdade, justifica a mudança de planos citando o modelo de contratação dos médicos residentes: como a classificação dos profissionais foi compartilhada com outras unidades do País, a tese é de que os cortes em Joinville poderiam prejudicar os programas de residência nas demais regiões.
Mas a pressão contrária à decisão, em especial por parte da classe médica, não é completamente ignorada por Udo. Ele cita a necessidade de ouvir os “anseios” da população, o bom relacionamento com a Sociedade Joinvilense de Medicina (SJM) e reconhece:
-O bom senso e o aspecto legal nos convenceram de que poderíamos rever essa posição.
A reviravolta em relação à residência médica, no entanto, não muda o discurso de que Joinville não pode arcar com mais despesas na saúde. Udo reforça a preocupação em relação ao comprometimento com a folha salarial e apela por maior participação do Governo Federal no setor.
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A Notícia – Foi alegado que o corte no Hospital São José prejudicaria outros programas de residência. Como isto aconteceria?
Udo Döhler – O edital alcançou diversos Estados. A classificação foi comum entre eles. A nossa suspensão era parcial, mas acabava tornando difícil a acomodação para os demais Estados. Tivemos um contato com o presidente da SJM e observamos que teríamos condições de buscar melhorias no processo dentro do hospital. Nunca passou pela nossa cabeça extinguir a residência. Está aí, colocada, embora não deva ser um ônus do município. É um ônus da União, que responde pelo ensino superior.
A residência não especializa o médico que atua na cidade. São médicos do País inteiro que chegam, fazem a sua residência, e vão embora. E nós tínhamos em 2012 a condição de hospital-escola, que contemplava esse ônus e, hoje, parcialmente está sendo arcado pelo município. Como vivemos um momento difícil da economia, isto está nos obrigando a reduzir despesas. Isto passa, inclusive, pela área da saúde, mas sempre com o intuito de não prejudicar a qualidade de serviço. Para que isso não atrapalhasse a situação dos demais Estados e ao mesmo tempo acomodasse a situação aqui, resolvemos rever a nossa posição.
AN – A repercussão e os argumentos contrários não tiveram peso nesta decisão?
Udo – A nossa posição é atender aos anseios da população. Claro que ouvimos a sociedade. O prefeito não pode cometer o descuido de tomar decisões que não correspondem aos anseios da sociedade. É evidente que o nosso relacionamento com a SJM foi um contato muito bom. Vamos buscar otimizar o processo. O bom senso e o aspecto legal nos convenceram de que poderíamos rever essa posição.
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AN – A suspensão de cerca de 11 mil consultas aos pacientes de municípios vizinhos está mantida?
Udo – Joinville tem gestão plena da saúde, o que nos obriga a atender quem nos procura. Os municípios no entorno não dispõem de infraestrutura médico-hospitalar adequada. Então, aqueles pacientes nos procuram. O São José acolhe 1/4 de pacientes de fora, atende a alta complexidade. Mas esse ônus não pode ser nosso. Toda a emergência dos municípios de fora, estamos acolhendo. Mas aquela pactuada com os municípios através da Amunesc, nós já renunciamos em janeiro. Não é um fato novo, mas ainda não repercutiu porque as consultas de janeiro são historicamente menores. Se os municípios estiverem dispostos a rever esta parceria, tudo bem. Mas, no primeiro momento, buscamos o atendimento à população local para reduzir as filas. Reduzimos de 108 mil para 94 mil consultas. Oferecemos 30 mil consultas por mês, então a fila média é de três meses. Hoje, três meses de fila é um índice excepcional na saúde pública do País.
AN – Credenciar novamente o São José como hospital-escola será um pleito mais forte a partir de agora?
Udo – Claro que, agora, você vai ter mobilização parlamentar. Nós temos deputados federais, senadores, que seguramente vão aproveitar esse momento para lembrar o Governo Federal de rever essa posição em relação à saúde. A questão dos residentes é a ponta do iceberg. É importante para nós porque, no somatório, buscamos a redução de despesas. Mas a União hoje aplica a metade do que devia na Saúde. O Estado cumpre com seu índice constitucional, aplica 13%. O peso constitucional do município é de 15%. E nós chegamos a 40% da nossa receita líquida com saúde. Daqui a pouco, a receita do município é consumida pela saúde. Isto é perverso.
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Cabe ao município o atendimento básico. A alta complexidade cabe ao Estado, com recursos da União. O SUS paga de R$ 8,00 a R$ 10,00 por uma consulta. Esse valor foi fixado dez anos atrás, como se não houvesse inflação. Esse modelo precisa ser revisto, vai se agravar.
Exoneração de comissionados é avaliada
O anúncio de que a Prefeitura de Joinville planeja cortar até 20% dos cargos comissionados (cerca de cem postos) como medida de contenção de despesas não significa, segundo o prefeito Udo Döhler, que os cortes já tenham prazos definidos para acontecer ou que todos os cem funcionários de confiança serão necessariamente demitidos.
A maior preocupação, diz Udo, é poder garantir o pagamento dos servidores. Ao mesmo tempo, a Prefeitura precisa apertar os cintos para não comprometer ainda mais a receita do município com a folha salarial: hoje, a folha abocanha 52,6% da receita. Como o limite prudencial é de 51,3%, o percentual atual tem de ser reduzido.
– Vou ter que reduzir isto e tenho um prazo para fazê-lo, de oito meses. Se não o fizer, estou cometendo um ato de improbidade administrativa. Aí, sou obrigado a reduzir o quadro de servidores, que começa pelos contratados, comissionados, e assim por diante. Coloquei (os cem comissionados) como meta porque preciso quantificar. Mas, se não for necessário, eles não serão dispensados porque precisamos dos servidores – analisa.
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Ainda no início do ano passado, diz Udo, já havia indicativos de que não seria possível pagar o 13º salário dos servidores caso o município não cortasse despesas. O comprometimento da folha, completa, cresceu a partir de fatores como a educação infantil, que abriu 8 mil vagas nos últimos anos e agregou cerca de 450 novos servidores ao município.