As bonecas e brinquedos que lotam uma sala do antigo centro de educação ficaram órfãos, e a comunidade do Monte Cristo acordou mais triste nesta terça-feira com a notícia da morte precoce de Lídia Almeida de Oliveira, 59 anos, líder comunitária mais conhecida por seu Museu de Brinquedos. A mulher, que há anos lutava contra problemas no coração, não resistiu a um infarto fulminante no fim da tarde de segunda, poucas horas após voltar pra casa de uma internação.
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:: Tem uma caçadora de brinquedos no Bairro Monte Cristo, em Florianópolis
Em uma estante dezenas de bonecas aguardavam na fila para serem concertadas por Lídia, trabalho que desenvolvia desde que chegou em Florianópolis, vinda de Caçador em 1995, “com uma trouxinha e R$ 5 no bolso”. Logo recebeu do companheiro uma bonequinha de plástico achada na rua, e depois passou a colecionar:
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– Nunca tive boneca na infância e a partir daquele dia eu passei a recolher – contou ao Hora, em entrevista em janeiro de 2015.

Foto: Betina Humeres / Agência RBS
A coleção de bonecas era a alegria de Lídia, conta a vizinha Neiva da Silva, 60 anos. Foi nos braços dela que a amiga passou mal na tarde de segunda. Ela conta que Lídia pediu ajuda e foi levada para o hospital, mas não teve jeito. Ao entrar novamente na sala do Museu de Brinquedos, Neiva não aguentou:
– Ela estava animada pois tinha descoberto um lugar novo para pescar, coisa que ela também adorava. Toda vez que estava ruim ela pedia para que quando morresse a gente cuidasse dos brinquedos e do “velho” dela. Mas eu falava pra ela parar de falar essas besteiras, porque às vezes passava mal, mas depois já tava boa. Pensei que ia ser assim de novo – falou emocionada.
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Reunidos no velório no salão da Igreja que dona Lídia frequentava, a poucos metros de casa, familiares e amigos lamentavam a grande perda para o Monte Cristo. Cada detalhe da casa e da rua eram cuidados pelo senhora, que cultivava um jardim com flores e plantas na calçada.
A filha Claudineia, bastante abalada, falou sobre a mãe:
– Era uma mãezona para todos nós. Cuidava de tudo e de todos, vamos continuar trabalhando para cuidar dos brinquedos que ela pediu – disse.
O líder comunitário Ivan Carlos da Luz, conta que eles foram grande parceiros:
– Ela era uma pessoas maravilhosa, que lutou muito por melhorias nessa comunidade. Uma referência para todos nós. Se alguém encontrava um documento perdido na rua, levava na casa dela. O Museu dos Brinquedos já recebeu até visitas internacionais graças ao trabalho dela – contou.
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Vida de batalha
Lídia nasceu e foi criada em Caçador, onde teve cinco filhas. Morando no interior do município, ela revelou em uma entrevista ao Hora em 2011 que nunca ganhou um presente. Até as roupas eram feitas de sacolas:
– Nós vivíamos numa miséria sem igual. Nem para as minhas filhas eu tive condições de comprar uma boneca – contou.
Quando se mudou para Florianópolis, foi direto viver no Monte Cristo, de onde nunca saiu. Lá começou sua história de luta por melhorias na comunidade e a coleção de bonecas. No início, Lídia guardava os brinquedos num quarto da residência. Só que a dona de casa teve que abrigar uma das filhas e foi obrigada a dar uma parte dos brinquedos até poder utilizar o cômodo do prédio público abandonado.
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– Jurei que não iria chorar, porque eles fazem parte de uma infância que não tive – lembrou, com lágrimas nos olhos.
Ultimamente ,dona Lídia andava descontente com a falta de projetos para as crianças da comunidade, e cobrava a revitalização do prédio em que mantinha o museu para uso comunitário.
A mulher deixa o marido, cinco filhas, 15 netos e quatro bisnetos. O enterro está previsto para acontecer às 15h30 no Cemitério São Cristóvão, em Coqueiros
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