A diarista Elaine Raber, 47 anos, que cuidou de Bernardo Uglione Boldrini, 11 anos, de 2007 a 2009, não foi chamada pelo Ministério Público (MP) durante o processo que determinou a permanência da guarda do menino com o pai, o médico Leandro Boldrini, 38 anos. Na manhã desta sexta-feira (18), Elaine explicou que só foi procurada pela Polícia Civil na terça-feira, dia 8 de abril, quando Bernardo já estava desaparecido.

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– Nunca me procuraram. Eu tinha comentado com meus amigos e com a Jussara (Uglione, avó materna do garoto). A única vez que eu falei foi no depoimento à delegada (Caroline Bamberg). Para a polícia, eu neguei porque tinha medo. Não ia falar alguma coisa para depois ter de arcar com as consequências. Eu não sabia que o Bernardo estava morto.

O advogado Marlon Balbon Taborda, que representa a avó materna de Bernardo, morto no dia 4 de abril, alertou ao Conselho Tutelar de Santa Maria, no dia 22 de novembro de 2013, e ao Ministério Público de Três Passos, em 6 de dezembro do mesmo ano, sobre o risco de vida que corria o menino.

Em troca de e-mails obtida por Zero Hora, Taborda informa, baseado em denúncia feita por Elaine, que o garoto “estava andando pela rua, abandonado, que foi tentado ser asfixiado em uma noite quando estava em casa, fato confirmado pelo menino”. Conforme o Ministério Público, a denúncia é de 2012.

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Em outro trecho do documento, o advogado da família alertou: “A (babá) me expôs de forma categórica no telefone que quem fez isso foi a atual esposa do pai do menino. Disse também que a ‘polícia bateu lá’, e que o pai do Bernardo estaria internado por motivos alheios. Em suma, a preocupação da avó é que o seu neto esteja sem referencial de família, pois estaria abandonado pelo pai e com estranhos”.

Antes de procurar o Ministério Público, Taborda enviou a mesma denúncia ao Conselho Tutelar de Santa Maria. No documento encaminhado aos conselheiros, o advogado explica que, diante das ameaças, o menino estaria com uma outra família, que o acolheu diversas vezes.

O texto diz o seguinte: “(A família) confirmou que o menino realmente está com ela, e que não tem e nem quer ter notícia do pai do menino BERNARDO, de nome LEANDRO BOLDRINI. Que o menino está sem pai e sem mãe. Deu a entender que algo grave aconteceu, mas não disse e a avó não sabe o que… Assim sendo, o que se precisa é averiguar a situação”.

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Os e-mails obtidos por Zero Hora são entre novembro de 2013 e dezembro do mesmo ano. A última mensagem encaminhada pelo Ministério Público de Três Passos convida o advogado e a avó de Bernardo a irem até a cidade para esclarecer as denúncias. Taborda alegou que ela era doente e não podia se deslocar, tendo que falar ao MP em Santa Maria, cidade onde reside.

Procurado por Zero Hora, o Ministério Público, por meio da assessoria de comunicação social, confirma que a ex-babá não foi ouvida. De acordo com o MP, a ex-funcionária da família teria sido ouvida pelo Conselho Tutelar de Três Passos, que encaminhou o caso à Promotoria.

Juiz tentou aproximação da família

Em janeiro, Bernardo foi levado ao MP por um agente da rede de proteção. Negou sofrer maus-tratos físicos e violência, mas disse que o pai era indiferente e que a madrasta implicava com ele. No final de janeiro, a promotora ingressou com ação na Justiça pedindo que a guarda provisória fosse dada para a avó materna, em Santa Maria.

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O juiz entendeu por marcar uma audiência com o pai de Bernardo, que ocorreu no começo de fevereiro. Durante a conversa, o pai admitiu falhas, disse que trabalhava demais e pediu uma chance de reaproximação com o filho. Bernardo também aceitou: “vamos tentar”, disse na ocasião o menino.

Conforme a promotora, foi estipulado um prazo para uma nova avaliação da situação. Desde então, nenhuma informação sobre problemas na relação chegou ao MP. Dinamárcia destacou que em toda a apuração não surgiu qualquer indício de que o menino corresse perigo ou estivesse sofrendo violência.

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Bernardo Uglione Boldrini, 11 anos, desapareceu no dia 4 de abril, uma sexta-feira, em Três Passos, município do Noroeste. De acordo com o pai, o médico cirurgião Leandro Boldrini, 38 anos, ele teria ido à tarde para a cidade de Frederico Westphalen com a madrasta, Graciele Ugolini, 32 anos, para comprar uma TV.

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De volta a Três Passos, o menino teria dito que passaria o final de semana na casa de um amigo. Como no domingo ele não retornou, o pai acionou a polícia. Boldrini chegou a contatar uma rádio local para anunciar o desaparecimento. Cartazes com fotos de Bernardo foram espalhados pela cidade, por Santa Maria e Passo Fundo.

Na noite de segunda-feira, dia 14, o corpo do menino foi encontrado no interior de Frederico Westphalen dentro de um saco plástico e enterrado às margens do Rio Mico, na localidade de Linha São Francisco, interior do município.

Segundo a Polícia Civil, Bernardo foi dopado antes de ser morto com uma injeção letal no dia 4. Seu corpo foi velado em Santa Maria e sepultado na mesma cidade. No dia 14, foram presos o médico Leandro Boldrini _ que tem uma clínica particular em Três Passos e atua no hospital do município _, a madrasta e uma terceira pessoa, identificada como Edelvania Wirganovicz, 40 anos, que colaborou com a identificação do corpo. O casal aparentava uma vida dupla, segundo relatos de amigos e vizinhos.

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* Colaborou Rossana Silva