Bandeiras indicando o lugar dos vigias nas dunas próximas à orla, canoas na beira do mar e ansiedade no ar. As praias de Florianópolis ganharam novas cores e sentimentos na manhã de segunda-feira, 01, quando foi aberta oficialmente mais uma temporada de pesca da tainha. Até o dia 15 de maio, apenas as canoas de pesca artesanal poderão cercar os cardumes, e, a partir da segunda metade do mês, embarcações motorizadas também estarão aptas a capturar o peixe mais famoso da Ilha.

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Para dar a largada à temporada, o Rancho de Pesca Cultural Manoel Rafael organizou o tradicional encontro na praia do Campeche, sul de Florianópolis. Mais de 500 pessoas estiverem presentes no evento, que teve início com a procissão do Monumento do Pescador, na Av. Pequeno Príncipe, até a praia, seguida de uma missa.

— Querendo ou não, sentar numa canoa dessas não é fácil. É uma responsabilidade grande, até porque passar um ‘marzinho’ não é tão fácil. Por isso, independente da crença, a gente vem na missa e faz um pensamento positivo para saber que estamos abençoados, que alguém está nos protegendo — conta o jovem pescador Welington Costa, de 24 anos.

Além do cerimonial religioso que pede a proteção aos pescadores, o encontro teve café da manhã, roda de capoeira, boi de mamão, exposição de fotografias e a participação de entidades de preservação ambiental, como o Projeto Tamar e o Movimento SOS Campeche Praia Limpa.

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— Nosso objetivo maior é juntar os povos, tanto pescadores e moradores, quanto as autoridades que dão suporte para nós pescarmos. A comunidade precisa mostrar às autoridades que precisamos ser respeitados e que precisamos de praia limpa, saúde boa e educação de qualidade — afirmou o idealizador do encontro e presidente de honra da Associação de Pescadores do Campeche, Getúlio Manoel Inácio, de 66 anos.

O encontro acontece há 12 anos e parece atingir o objetivo proposto por Getúlio. Além da comunidade, diversas autoridades estiveram presentes, entre elas vereadores, o superintendente federal de Agricultura em Santa Cantarina — órgão que regula a pesca —, Jacir Massi, e o prefeito Gean Loureiro.

— Hoje começa a safra da tainha de uma maneira festiva. A pesca artesanal é um setor importante, porque mantém a subsistência de várias famílias e carrega a história e tradição da cidade. Nossa expectativa é que possa ter uma safra semelhante à do ano passado, que foi muito positiva — disse o prefeito.

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Em 2016, foram capturadas cerca de 3,5 mil toneladas de tainha e, de acordo com a avaliação da Federação Catarinense de Pescadores, foi a melhor safra nos últimos 30 anos. Para este ano, a previsão é de que a safra atinja pelo menos a metade deste montante.

Surfista-pescador leva tradição adiante

É notória no litoral catarinense a tensão entre surfistas e pescadores entre os meses de maio e julho. Apenas nesses três meses é permitida a pesca da tainha, mas é também neste período que as praias costumam receber as melhores ondas do ano. Nas últimas temporadas, especialmente em Florianópolis, entidades que representam as duas comunidades têm buscado acordos para evitar maiores atritos, mas, ao fim e ao cabo, o respeito e o bom senso são definitivos para um clima amistoso entre as partes.

Nativo do Campeche, Welington Costa, de 24 anos, vem de uma família tradicional de pescadores do Sul da Ilha e tem no sangue o amor pela captura das tainhas, mas, assim como muitos de sua geração, também costuma navegar nos mares em cima de uma prancha de surf. Essa comunhão de sentimentos proporciona ao jovem a clareza de quem valoriza ambas as culturas.

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— É um assunto bem delicado essa guerra de surfistas e pescadores, mas tudo deve partir da base do respeito ao limite do próximo. O surf, querendo ou não, tem ano inteiro. A pesca são só dois, três meses. Não custa o pessoal respeitar, até porque a pesca artesanal é centenária, não começou agora. Se todo mundo se respeitar, vai fluir — afirma.

Ao lado dos colegas do Rancho do Segredo, considerado o rancho da renovação de pescadores artesanais no Sul da Ilha, Welington presta atenção a cada detalhe e a cada ensinamento dos mais velhos. O “seu” João Onofre Fernandes, de 78 anos, não entra mais no mar com sua canoa: é de fora da água que, agora, passa seus ensinamentos.

— Meu pai sempre dizia que sem união não há força. Se um cordão é fraco, dois ou três são mais fortes. Isso é uma coisa da antiguidade, mas que a gente tenta passar para os mais jovens. Esse espírito de companheirismo é fundamental na hora da pesca — comenta Onofre.

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De ontem, até o final de julho, todos os dias os vigias estarão posicionados na beira da praia à espera do cardume, enquanto o feijão cozinha na panela dentro do rancho. Mas não estranhe se encontrar os pescadores de “bobeira” na praia.

— Às vezes, o pessoal está jogando dominó ou conversa fora, mas é só até aparecer o cardume. Aí, é outra praia, outro clima. Os velhinhos, que são mais ágeis que muitos jovens por aí, já saem disparados em direção à canoa. É tudo bem rápido. Quem se distrair, perde a chance de observar a pesca — encerra Welington.

Captura de cardumes

No sul da Ilha, o vento Norte e as ondas fortes não proporcionaram as condições ideais para que os barcos entrassem na água para fazer o cerco aos cardumes no primeiro dia da temporada. Coube à praia dos Ingleses, no norte da Ilha, registrar o primeiro cardume pescado, com a captura de cerca de 370 tainhas por volta das 7h de segunda-feira, 01.

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Quem quiser acompanhar as capturas ao longo de toda a temporada, pode acessar um mapa colaborativo criado na plataforma Google Maps, onde os pescadores marcam o local e a quantidade de peixes capturados. De quebra, é possível ver em detalhes como foi a pesca da tainha em 2016. Acesse aqui.

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