Em entrevista à jornalista Larissa Vier, da RBS TV, o empresário aposentado João José Gonçalves, 75 anos, contou detalhes sobre os 15 dias em que ficou em poder de sequestradores, desde o momento em que foi raptado, em São João Batista, os três cativeiros em que permaneceu, no litoral do Paraná, e a libertação pela polícia na sexta-feira de Natal.
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O sequestro terminou com a prisão de pelo menos dois criminosos. Um deles é um morador de São João Batista, vizinho da vítima e apontado como um dos principais mentores do crime.
No sábado, pouco depois de receber o barbeiro em casa, em São João Batista, João relatou as conversas que os bandidos tinham com ele, o lugar em que ficou cheio de baratas e insetos, o receio de não ver mais os netos, ser jogado em um buraco e depois enterrado como um indigente.
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João revelou que quando estava no cativeiro os bandidos fizeram pelo menos três gravações como prova de vida que foi enviada aos familiares durante a negociação. Os sequestradores pediram R$ 8 milhões.
Segundo disse ainda na sexta-feira ao Diário Catarinense o delegado da Diretoria Estadual de Investigações Criminais (Deic), Anselmo Cruz, o resgate não foi pago.
Conforme o delegado da Deic, os presos são Paulo Roberto da Silva, morador de São João Batista e vizinho que sabia todos os passos da vítima, e Honorato de Jesus Freitas. A reportagem ainda não teve acesso a eles nem aos seus advogados.
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Anselmo, a cúpula da Polícia Civil e da Secretaria de Segurança Pública de Santa Catarina darão detalhes do sequestro em uma entrevista coletiva marcada para às 10h desta segunda-feira, na Deic, em Florianópolis.
A Polícia Civil do Paraná divulgou que os sequestradores foram presos na sexta-feira à tarde na BR-277, perto de São Luiz do Purunã, quando estavam negociando o resgate. Logo em seguida, a polícia estourou o cativeiro em uma operação que envolveu a Deic catarinense e policiais do grupo Tigre (Tático Integrado de Grupos de Repressão Especial).
A operação no Paraná contou com 20 policiais, sendo 12 de Santa Catarina e oito do Tigre.
Confira a entrevista da RBS TV com o empresário João José Gonçalves:
Qual a sensação de voltar para casa ainda mais no dia de Natal?
Esperança muito grande, ver a minha família, deixar todos os meus amigos tranquilos. É demais, a pressão, ninguém sabia explicar nada.
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Como foi nesses 15 dias? Eles maltrataram o senhor?
Não. Eu sempre fui educado com eles e eles comigo. Fiquei em três cativeiros.
O senhor é diabético, precisa tomar remédio, como foi isso?
Passei o nome do medicamento às dez da noite, às quatro horas da madrugada já chegaram com o medicamento. A preocupação deles com a minha saúde era grande.
Eles queriam que o senhor estivesse bem?
É. Porque de certo pensavam ‘vão jogar esse homem onde se ele ficar mal’.
Em algum momento sentiu medo?
Não, nunca senti medo. Ficava no quarto sozinho, trancado. O que me emocionava um pouco é quando eu me lembrava dos netos. Pensava, ‘de certo daqui eu não vou embora mais, o que eu vou deixar para os meus netos se não ver mais’. O cantão que eu tava lá… Pensei comigo, ‘jogam num buraco aí, sem documento nenhum, enterram como indigente’.
A sua família já tinha me dito que o senhor era forte, mas não imaginava o quão forte o senhor era para aguentar…
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Não é forte… Quando a gente está forte tem que se sentir forte e quando está abalado também.
Rezou muito?
Sempre rezei, rezava muito. Todo domingo eu vou na missa. Rezei para Santa Paulina, Nossa Senhora do Bom Socorro e Nossa Senhora Aparecida, que arrumassem um jeito para sair tudo na boa, a minha família e que os próprios bandidos, que Deus olhasse o lado deles também para esquecer dessas coisas ruins. Porque segurar um homem de 75 anos num quartinho de 1,5m x 1,5m em cima de um sofá bem ruim. Dormi sentado, tinha muito inseto, barata.
E o trabalho dos policiais, o que o senhor tem para falar?
Meu Deus do céu, quando eles me pegaram no cativeiro eu disse: meu Deus! Que Deus ilumine esses homens, me pegar num canto desse aqui, que Deus olhe para vocês o resto da vida. Fizeram um trabalho muito bonito.
Como foi durante o trajeto até o cativeiro?
Já fui caminhoneiro e no trajeto que estavam me levando às vezes eu dava uma espiadinha para fora. Diziam ‘tá olhando o quê?’, ‘Tô olhando nada, essa chuva’. Aí notei que subimos a serra, passamos o pedágio, andaram direto a Curitiba, depois estrada de chão, rodamos um pedaço e me levaram para um cativeiro com a cabeça tapada. Aí tiraram o pano e veio um e me trouxe uma comidinha. Disse: ‘não quero não’. Aí veio outro com touca, ofereciam água, tomar banho. Estavam sempre encapuzados.
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Agora é retomar a vida?
É, ficar com a família. Para ver se eu estava vivo um dia eles (sequestradores) fizeram uma entrevista e depois passaram para alguém da família. Falei que tenho uns netos muito queridos, 16 netos e dois bisnetos. Não tinha televisão na época e arrumei um monte de filhos. Falei sobre a vida. Depois em outra entrevista que fizeram falei que perdi um neto. Perguntavam mais coisas, qual o relógio que eu mais gostava, pediam para lembrar de algo antigo, coisas pessoais, cor do carro antigo. Vou tocar a vida com mais receio, não quero que aconteça com minha família, o sofrimento todo, fica um trauma.
O senhor desconfiou naquele dia de alguém?
Desconfiei, vi atrás de mim um carro com placa de São Francisco. Fui correndo para casa pegar o telefone e ligar para a polícia. Em casa entrei na garagem e estava fechada. Quando voltei pegaram a chave da minha mão e disseram que era sequestro e me botaram dentro do carro.
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