O Filho Eterno , livro do escritor lageano Cristóvão Tezza que documenta o desabafo do pai de uma criança com síndrome de down, acaba de ser adaptado para os cinemas. Dirigido por Paulo Machline e estrelado por Marcos Veras, o filme está em cartaz em SC e o colunista de cinema do DC Andrei Lehnemann conversou com o diretor sobre o longa.
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Confira a entrevista:
Como você se familiarizou com o trabalho do Cristóvão Tezza e qual foi seu primeiro contato com o livro e a adaptação do Leonardo Levis?
Foi o Rodrigo Teixeira, o produtor do filme, que entrou em contato comigo. Ele era dono dos direitos do livro do Cristóvão e me ofereceu o trabalho. Eu era familiarizado com algumas obras do Tezza, mas ainda não havia lido O Filho Eterno. Como é um trabalho super importante e desafiador, eu li a obra algumas vezes antes de finalmente aceitar a dirigir. O fato de não conhecer esse universo do down deu um impulso também, pois você tem duas formas de dirigir: ou você domina o assunto ou você mergulha nesse mundo e traz uma novidade. Fiz questão de conhecer o Cristovão, em decorrência…
Ele assistiu ao filme? Gostou?
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Sim! Ele assistiu na pré-estreia de Curitiba. Ficou bem sensibilizado. Ele não gosta que o associem ao personagem, como se fosse algo autobiográfico. Gosta de dizer que é um livro que mescla ficção e o real.
Falando em Curitiba, você falou anteriormente que boa parte do filme foi filmada lá. Houve alguma cidade específica que pensasse na ambientação ou queria que o espectador pudesse dar uma identidade própria para o município?
Acho que foi mais ou menos o que tu falou. O principal objetivo era uma cidade fora do eixo Rio-São Paulo. Eu ia bastante para Curitiba, onde o Tezza está morando. Nessas idas e vindas, eu comecei a fotografar a cidade. Falei com o Rodrigo (Teixeira) e procuramos a produtora Grafo, quem nos deu um apoio grande por lá. Ficamos por lá, pelas vantagens técnicas e jurídicas.
Mas você cita bastante Florianópolis durante O Filho Eterno.
Sim, era meu desejo filmar na Ilha, mas não conseguimos. Caro demais. Em compensação, acabamos realizando algumas filmagens ali na Barra do Saí, que fica na divisa com o Paraná. É a praia que aparece no filme.
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O personagem do Veras é uma pessoa bastante detestável, no ponto de vista empático, já que seu “desabafo” soa bastante cruel na maior parte do tempo. Como você procurou driblar essa faceta desumana do personagem?
Acho que isso está diretamente relacionado à contratação do (Marcos) Veras. Ele não foi a minha primeira escolha, na fase de produção. Pensei em algumas escolhas mais óbvias, porém quando pensávamos no filme e no perfil solar que o personagem precisava, já que precisávamos contrastar essas ações cruéis do Roberto com alguma bondade, o Marcos foi o melhor nome para a narrativa. Já que ele tem esse viés cômico, ele traz uma leveza para a dramaticidade do seu protagonista. Há uma empatia natural e o público não torce contra ele. Nosso principal desejo era fazer com que todos entendessem que, no fundo, ele queria amar aquela criança. Ele só não sabia como.

Aliás, falando na criança, o Pedro Vinícius traz uma suavidade muito boa para a trama e faz ela respirar em muitos momentos. O processo de escolha até chegar a ele foi difícil? Quantas crianças passaram por testes?
Devemos ter entrevistado umas 100 famílias. Procuramos, primeiro, instituições que trabalhassem com crianças com esse perfil. Conhecemos as famílias, o que foi o mais importante. E fomos diminuindo o número até chegar a 10, 3 e, claro, o Pedro.
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Foi o primeiro trabalho dele, certo?
O primeiro. Ele ainda nem sabia como era um set de filmagens. Os três garotos eram muito bons. O Pedro foi escolhido bastante em função da postura da família. Os outros dois já tinham feito alguns trabalhos, como propagandas. Mas ficamos encantados com o Pedro e seus pais. Confiamos muito no instinto dele para desenvolver seu personagem.
Essa separação entre a personagem de Falabella e do Veras é uma decisão ousada, até por sugerir que a trama seja mais focada no pai do que na mãe. Foi algo consciente? A proposta era o desabafo do ponto de vista do pai?
No livro de Tezza, a mãe nem é muito referenciada. No filme, ela tinha duas funções objetivas: demonstrar a facilidade da mãe de cuidar da cria e a falta de escolha, pois você observa que em momento algum ela questiona essa condição. Isso é bem comum, de acordo com as famílias que entrevistei na produção. A mãe aceita instantaneamente que aquele é seu filho e ela viverá com isso. O pai que é mais difícil em lidar. O papel de Débora, além disso, evidenciava que, apesar de tudo, a mãe também sofre. É difícil pra ela, igualmente, embora os sentimentos do pais sejam os que mais acentuamos. Ela tem uma força gigante para lidar com aquilo tudo.
Como você percebe o amadurecimento de seus filmes – desde Uma História de Futebol, que foi inclusive indicado ao Oscar, até esse O Filho Eterno? Quem era você antes e quem é você agora?
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Acho que o processo diz muito a respeito de nossa própria autodescoberta. Os filmes estão cada vez mais meus. Agora mesmo, eu estou filmando uma série no Uruguai para a HBO. Uma História de Futebol era uma história que eu queria muito contar, Natimorto não era tanto um filme meu, mas a partir dali comecei de novo. Trinta foi um projeto todo meu, eu fiz o roteiro. E, agora, O Filho Eterno tem muito de mim. Foi como fazer um filme de época com baixo orçamento. Mas confiaram bastante no meu trabalho. O resultado foi esse.
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