ELE e ELA numa cama de motel de luxo.

ELE – Não dá! Não dá! Depois que soube que seria nomeado desembargador, não consigo mais fazer nada.

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ELA – Mas meu amor, o sonho de qualquer juiz é um dia ser desembargador, ministro. Até eu ficava sonhando: Ritinha, assessora do desembargador Gomes…

ELE – Aí é que está o problema. Sempre tive medo dessa palavra. A primeira vez que ouvi, ainda na faculdade, nem consegui dormir. Parecia que tinha um DESEMBARGADOR debaixo da minha cama. Eu ficava com medo, era como se ouvisse vozes sussurrando: “DESEMBARGADOR, DESEMBARGADOR, DESEMBARGADOOOOR”.

ELA – Parece criança! Imagina se eu conto isso lá no gabinete, que o doutor Gomes tem medo de bicho-papão.

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ELE (compreendendo a paranoia) – É isso, Ritinha. Desembargador pra mim é como um bicho-papão!

ELA – Era, Gominho! Era bicho-papão. Agora é o nome da tua profissão! Deixa essa história pra lá, vamos brincar de habeas corpus, vamos.

ELE – Sai! Para! Não consigo! Melhor parar com essa brincadeira de pornografia jurídica.

ELA – Ai, Gomes! Na época que você me chamou para trabalhar lá, era a Ritinha da apelação, do agravo retido… Era só enfiteuse, usucapião, efeito devolutivo, efeito suspensivo, ah, delícia aquele Kama Sutra jurídico todinho que você me ensinou. E tinha aquela parte de brocados latinos eróticos que adoro.

ELE – Era outra época. Tinha acabado de passar no concurso. Eu me sentia tão poderoso, mas tão poderoso. Sabia que ia passar a vida inteira sentado na cadeira mais alta, usar elevador exclusivo e ficar longe de advogado. Na faculdade eu não gostava nem de quem queria ser advogado. Mas sempre tive medo dessa hora, sabia que ela ia chegar. Agora voltou aquela coisa.

ELA – O quê? O Desembargador debaixo da cama?

ELE – Não. As vozes. Agora mesmo, quando você me beijava, tinha alguém no meu ouvido dizendo: “DESEMBARGADOR, DESEMBARGADOR …”.

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ELA – Ai, que bobagem, essas coisas não existem. Vem cá, me dá um beijo. Vamos brincar de dicionário jurídico amoroso, assim eu melhoro.

Voltam para debaixo dos lençóis, ouvem-se os beijos.

ELA (interrompendo) – Gominhô?

ELE (ainda beijando) – O quê?

ELA – E se eu passar no concurso pra juíza? Um dia posso ser DESEMBARGADO-RA.

ELE – Aí eu não durmo nunca mais.

Yes, we eat bananas

A pior maneira de lidar com um apelido de escola é não gostar dele. A melhor resposta a uma provocação é provocar. Foi o que fez o jogador Daniel Alves ao comer a banana jogada em campo no último domingo, na partida entre o Barcelona e o Villarreal. Acabei de assistir à cena diversas vezes e parece coisa de filme. O ator improvisa diante da situação que lhe é dada. Um objeto é jogado, ele pega e muda, subverte a dramaturgia. E continua o enredo ensaiado como se o ato de comer a fruta tropical já estivesse no script. E cobrou o escanteio, já com a banana degustada e digerida, para que fosse marcado o gol, como num ato que antecede e enriquece o clímax. Tantas bananas jogadas em campo, tantos sons de macaco vindos de torcida e talvez ele até já tivesse pensado em responder dessa maneira. Mas a cena não poderia ter sido melhor, com a naturalidade do gesto e a inclusão dele na ação central. Sim, eu como bananas e devoro e provoco vocês com minha fome de bola e minha cor!

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