Contaminação do rio do Braz atinge mar de Canasvieiras e preocupa veranistas

O ponto 22 da praia de Canasvieiras, no norte da Ilha, é um dos mais movimentados durante a temporada de verão, apesar de avaliado pela Fundação do Meio Ambiente (Fatma) como “impróprio para banho” pelo menos nos últimos três relatórios de balneabilidade. À esquerda da placa está o trapiche onde atracam dezenas de escunas. Já do lado direito está fixado um dos maiores campings de Florianópolis. E exatamente no meio, para decepção dos veranistas, deságua o responsável pela “impropriedade” na praia: o rio do Braz.

O líquido escuro e fétido do curso de água tem concentrada a bactéria E.Coli – presente na flora intestinal e causadora de diarreia – e, naturalmente, não deveria chegar à praia. As chuvas, comuns no fim do ano, propiciam o desvio: do assoreado rio Papaquara para o mar de Canasvieiras.

– Ele tem uma vertente que, de acordo com a maré ou chuvas, vai para a praia de Canasvieiras ou fica retido em uma barra de areia. Quando verte no verão, rompe e leva ao mar todo aquele conteúdo que reteve. O rio do Braz passa por uma série de locais e recebe parte do esgoto dito tratado na ETE de Canasvieiras. Também existem outras possibilidades de esse rio estar recebendo de forma clandestina ligações de diversos contribuintes. Então é um ponto que vem trazendo contaminação para a praia de longa data – explica o responsável técnico da Fatma, Marlon Daniel da Silva.

O turista argentino Franco Chiesa, 27, preferiu ficar na areia a entrar em contato direto com a água poluída do rio do Braz na manhã desta terça-feira, 5.

– É complicado, porque viemos com crianças, então é difícil controlá-las. É uma pena, porque é uma praia muito bonita, e sabemos que isso se espalha, não vai ficar só aqui – lamenta o jovem, que veio de Rosário à capital catarinense pela primeira vez.

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Contaminação por esgoto

Apesar de acumular poucos dejetos, a contaminação do rio do Braz é real. E não é novidade. O caso mais recente foi comprovado em laudo técnico emitido pela Fatma em maio de 2015, quando extravasou esgoto da Estação Elevatória da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan), fixada a poucos metros da areia de Canasvieiras. A Casan negou que o esgoto tenha transbordado novamente e se exime da culpa.

– Quando há muito fluxo de pessoas numa região da cidade ou quando chove intensamente, a ligação clandestina fica mais visível e cheirosa, infelizmente. Justamente devido às dificuldades de a população fazer a ligação correta e diante da impossibilidade legal de a Casan fiscalizar e multar donos de imóveis foi criado, há cinco anos, o programa Floripa Se Liga Na Rede, que percorre casa por casa, empresa por empresa, mostrando o modo correto de fazer a ligação para não extravasar à rua, aos rios e a outros mananciais – informou a Casan pela assessoria de comunicação.

Independentemente do projeto, a Companhia diz ter colocado caminhões-vácuo para sugar esgoto excedente e irregular despejado no norte da Ilha durante o feriadão, levando-o para estações de tratamento. Mas mesmo assim a situação se agravou no fim do ano, quando a contenção das águas do rio do Braz, feita com caminhões de areia e retroescavadeiras da Secretaria de Obras, foi cedida. O secretário Rafael Hahne não atendeu as ligações da reportagem.

A Fatma está avaliando o contexto atual e reconheceu a gravidade. Os responsáveis devem ser formalmente notificados até o fim desta semana. Uma reunião entre fundação, prefeitura de Florianópolis, Casan, e Floram está marcada para a manhã desta quarta-feira.

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Turistas temem virose pela contaminação…

A turista argentina Augustina Padin, 45, vem a Canasvieiras há seis anos, mas está assustada com a realidade encontrada nesta temporada.

– Nunca vi nada desse jeito. Antigamente, vinham caminhões colocar areia ali no rio para bloquear o contato com o mar. Mas agora eles apareceram só no dia 1 ou 2 e não voltaram mais. Muita gente do camping passou mal só de ter entrado no mar e foi embora. Eu tive mal-estar no Ano-Novo e só tomei água mineral – conta.

Os estoques de remédios contra enjôo, vômito, diarreia, mal-estar, tontura e dor de cabeça praticamente zeraram nas farmácias do bairro na última semana.

– Tenho atendido muita gente com sintomas de virose, é a maioria. Só estou conseguindo repor as medicações hoje [terça-feira], porque as distribuidoras estavam em recesso. Acredito que a água do mar contaminada seja a principal justificativa. Crianças podem engolir, mas adultos também podem se contaminar pelos nariz, ouvidos ou olhos – garante a farmacêutica Caroline Niehues.

Felipe Nunes Pereira tem mais cautela, mas corrobora o diagnóstico da colega de profissão e diz que tem atendido em média 200 casos de virose por dia.

– Pode contaminar por qualquer mucosa. Não há como ter certeza, mas fica difícil dizer que não com a cor do rio. Ano passado não foi assim – conta.

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… e Secretaria da Saúde nega

A Diretoria de Vigilância Epidemiológica de Florianópolis ainda não sabe ao certo o número de casos de virose registrados na cidade. Segundo funcionários da Unidade de Pronto Atendimento do norte da Ilha, lotada na manhã desta terça-feira, a doença era a principal motivação dos atendimentos. Mas o secretário de Saúde, Daniel Moutinho Jr, descarta tanto a existência de surto quanto a relação das viroses com a contaminação do mar de Canasvieiras.

– Não tem como fazer uma correlação de nexo causal, como a gente chama, entre a poluição do rio e as viroses. Porque nesta época do ano são bastante comuns as viroses gastrointestinais. Geralmente, tem vinculação muito maior com alimentação. Mas é claro que também há possibilidade de ser causada por ingestão de água contaminada. Teria que ser uma ingestão muito grande para ter doença intestinal. Não basta você tomar banho em alguma água contaminada, isso poderia causar mais doenças de pele.