Privada de seu maior artista, o presidente Hugo Chávez (1954 – 2013), que gostava de cantar e dançar em comícios e chegou a gravar um disco em 2007, a campanha presidencial deste ano atraiu talentos tão ou mais reconhecidos dentro e fora da Venezuela.
Continua depois da publicidade
Três dias antes do início da votação, governo e oposição abastecem sites de compartilhamento e redes sociais com canções, jingles e paródias. O hit, até o momento, é a salsa Mentira Fresca, que teria sido composta pelo ator venezuelano Rolando Padilla e foi gravada pelo cantor portorriquenho Willie Colón, radicado nos Estados Unidos. Num trocadilho com o nome do presidente e candidato à reeleição Nicolás Maduro, a canção caiu no gosto dos internautas antichavistas e mereceu reportagem do jornal The New York Times, dos Estados Unidos.
Divulgada há uma semana por Colón, simpatizante do candidato oposicionista Henrique Capriles, acompanhada de um recado em sua conta no Twitter (“Para Capriles e Venezuela aqui estou enviando. Ataca, Magro!”, ), Mentira Fresca não cita o presidente pelo nome, mas é de uma agressividade explícita:
“Mentira Fresca falou outra vez pela televisão / Nos disse a todos que aqui não haveria desvalorização / Suplente encarregado de piorar o desastre / Em apenas cem dias nos aplicaste um pacotaço”. Imediatamente, Capriles passou a se referir a Maduro pelo apelido.
Continua depois da publicidade
Assista a vídeo com Mentira Fresca, de Willie Colón:
Com milhões de fãs na Venezuela, Colón provocou reação do próprio Maduro, que o acusou de ter caído “na lama”.
– Por que você caiu na decadência tão cedo? Se gostávamos tanto de você… como músico lhe admirávamos. Por que tinhas que cair no lodo? O que eu fiz a você? Por favor, por quê? Se você é portorriquenho, beija a mão ao amo imperial, que submeteu tua pátria a ser uma colônia? – esbravejou o presidente num comício.
A resposta veio na voz de outro portorriquenho, Eddie Palmieri, cantor e pianista de jazz. Chama-se Segura tua Língua e, já de início, bate de volta:
Continua depois da publicidade
“Neste mundo / Existe uma coisa muito ruim / Que coisa? Que coisa? Que coisa? / A língua”).
Assista a vídeo com Segura tua Língua, de Eddie Palmieri
Não foi apenas entre artistas estrangeiros que a campanha provocou controvérsia. Na Venezuela, os ídolos artísticos estão rigorosamente divididos entre Maduro e Capriles. O poeta William Osuna, a atriz Susej Vera, a cantora Lilia Vera e o dramaturgo Román Chalbaud declararam apoio ao presidente. Em ato realizado no domingo passado num teatro caraquenho, Lilia Vera, uma espécie de Mercedes Sosa venezuelana, afirmou:
– Não podemos permitir à oposição fascista que nos dirijamos a uma guerra, porque isso é o que querem. Tudo o que disseram de nosso processo não é de graça. Não nos farão esquecer as verdades desse 11 de abril de 2002 (data da tentativa malograda de golpe contra Chávez).
Continua depois da publicidade
A polêmica não se restringe ao mundo cultural. Na Argentina, o Prêmio Nobel de Literatura e ex-candidato à presidência do Peru Mario Vargas Llosa, um dos maiores críticos do chavismo, referiu-se ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como “propagandista escandaloso do chavismo”.
– É um espetáculo lamentável ver presidentes democráticos, que impulsionaram políticas democráticas, e ver sua cumplicidade no plano internacional com populismos, ou semiditaduras – disse o escritor, complementando em seguida que “o caso mais escandaloso é o de Lula”.