O posicionamento do juiz federal Marcelo Krás Borges na última quarta-feira sobre o impacto da sentença nos imóveis do entorno da Lagoa da Conceição trouxe um alento aos moradores. Mas a afirmação de que apenas edificações de a partir de 2005 devem ser impactadas pela decisão judicial – que determina desocupação de 30 metros no entorno da lagoa em área de preservação permanente – ainda é insuficiente.

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Audiência conciliatória marcada para o dia 13 de agosto com a prefeitura, moradores e o Ministério Público Federal, autor da ação, terá de responder, pelo menos, sete pontos ainda duvidosos sobre o caso. A reunião com a Justiça deve ser importante para definir se os acessos à Lagoa e a passagem para pedestres também acarretarão desapropriações, mesmo de imóveis regulares e anteriores a 2005.

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Há os casos de imóveis que receberam alvarás de reforma e ampliação. Estão sem respostas a aplicação de multa de cerca de R$ 15 milhões à prefeitura pelo descumprimento de determinações anteriores e como ficarão os acessos a áreas de preservação cultural e ambiental, como a Costa da Lagoa. Nem mesmo o esclarecimento do magistrado ajudou a reduzir a preocupação no Distrito da Lagoa.

– Todos estão aflitos, porque ainda não houve um acordo formal – afirma o presidente da Associação de Moradores da Lagoa, Alésio dos Passos Santos.

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A prefeitura ainda executa o levantamento por fotos aéreas e geoprocessamento para apontar as edificações erguidas nos últimos nove anos. Conforme o secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, Dalmo Vieira Filho, cerca de 300 imóveis foram aprovados com alvarás e habite-se na Lagoa entre 2005 e 2014. Uma análise de cada caso, a ser feita até o dia da audiência, vai apontar quem se enquadra na determinação judicial.

Mas há mais a ser explicado. Procurador-geral do Município, Alessandro Abreu teme que o Ministério Público Federal recue e não concorde em submeter a decisão apenas aos casos posteriores a 2005. Na petição apresentada no dia 2 de julho à Justiça Federal, a procuradora federal Analúcia Hartmann foi incisiva e pede claramente a demolição dos imóveis dentro da área de marinha. Em período de licença, Analúcia só se pronunciará na audiência, segundo a assessoria do MPF.

O juiz Marcelo Krás Borges assumiu o caso porque a titular, Marjôrie da Silva, está em férias. Mas ela deve reassumir o processo após a audiência de conciliação e poderá proferir sentença. São dela as decisões anteriores que, segundo a prefeitura, não deixam claro quais são os imóveis afetados.

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– A única forma de sair com uma definição é todos os atores irem desarmados em busca de uma solução comum – cogita Abreu.

O processo foi conturbado e os moradores não foram ouvidos. No dia 6, a prefeitura fará reunião para explicar os trâmites e ajudar a eleger representantes locais que participarão da audiência com o juiz.

Imagem de 1968 mostra a área sem construções. Foto: Acervo de Dulce Maria Halfpap / Divulgação

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Especialista sugere defesa individual

Nesta segunda-feira à noite, moradores marcaram encontro na sede da Sociedade Amigos da Lagoa para definir se buscam uma defesa coletiva e como farão para garantir que seus imóveis não sejam afetados pela decisão da Justiça Federal.

Presidente da Comissão de Direito Notarial e Registros Públicos da Ordem dos Advogados do Brasil em Santa Catarina, Roberto Pugliese é especialista em terrenos em área de marinha e alerta, no caso da Lagoa da Conceição, para a necessidade de os moradores procurarem auxílio jurídico individual. Conforme Pugliese, é preciso levantar informações que garantam que a construção do imóvel dentro do limite questionado no entorno da Lagoa não tenha ocorrido por má-fé.

– Cada um por si, tem de angariar documentos, provas, buscar um advogado, para ir à Justiça questionar individualmente o seu problema – aconselha.

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Segundo o especialista, a única forma dentro da Justiça para defender direitos reais imobiliários é individualizada, não coletiva. Isso porque cada terreno e cada imóvel têm particularidades que podem impactar na sentença judicial.

As dúvidas sobre a Lagoa

Apesar de o juiz federal Marcelo Krás Borges vir a público semana passada, vários quesitos não foram esclarecidos na sentença e deverão ser apontados na audiência de conciliação do dia 13 de agosto, segundo fontes ouvidas pelo DC:

1 Concordância _ o receio da prefeitura é que o Ministério Público Federal discorde em incluir na sentença apenas os imóveis autorizados após 2005 dentro do limite de 30 metros no entorno da Lagoa. Mas a decisão final cabe ao juiz

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2 Multa milionária _ a Justiça determinará se houve descumprimento da sentença no passado, que acarretaria numa multa de quase R$ 15 milhões hoje. Seria preciso provar que houve construções após 2005, o que o MPF aponta no processo, segundo a Justiça Federal

3 Área para pedestres _ o destino da faixa de 15 metros destinada a pedestres não ficou claro. Se tiver de ser em todo o trecho, será necessário desapropriar algumas construções que são, inclusive, anteriores a 2005

4 Acessos à Lagoa _ a construção de acessos com três metros de largura a cada 125 metros precisa ser esclarecida. Se for levada em consideração, provocaria desapropriações de imóveis anteriores a 2005. Moradores querem apontar onde é viável e necessária

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5 Costa da Lagoa e áreas de preservação _ é uma das áreas mais vulneráveis da Lagoa, a Costa da Lagoa abriga moradias de interesse cultural, conforme o novo plano diretor, em meio à vegetação. Abrir acessos provocaria dano ambiental e impacto local. Alternativa seria reabertura e manutenção das trilhas históricas. Outra possibilidade é a sentença focar somente o trecho urbanizado da Lagoa

6 Reformas _ se a sentença também vai considerar imóveis que obtiveram alvará de reforma e ampliação e estão dentro da faixa dos 30 metros. Por exemplo, um imóvel que foi apenas reformado deveria ser excluído da medida, mas incluído o que ampliou o uso do solo

7 A sentença _ ponto de insegurança dos moradores e da prefeitura: o juiz federal da Vara Ambiental, Marcelo Krás Borges, vai comandar a audiência conciliatória e, por isso, veio a público esclarecer que os impactos da sentença se restringem a imóveis posteriores a 2005. Mas a titular do processo é a Marjôrie da Silva, em férias, que pode ter outro entendimento e incluir na decisão imóveis anteriores a 2005, conforme sugere o MPF

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Entenda o caso

2003 _ início da ação do MPF, motivada por avanço de obras irregulares na Lagoa

2005/2006 _ em liminar, Justiça determina embargo de obras, levantamento de imóveis na faixa da área de 15 metros _ previstos no Código de Águas e pela Lei do Plano Diretor de Balneários _ e fixa multa diária de R$ 1 mil

2010 _ Decisão reitera necessidade de levantamento e ordena que a prefeitura regularize construções no entorno da Lagoa, com multa de R$ 10 mil por cada caso descumprido

2011-2013 _ Outras decisões reiteram exigências anteriores e ampliam a área de desocupação para 30 metros aos que estão em área urbana consolidada

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2014 _ Em 2 de julho, o MPF apresenta pedido de execução de pena e acusa prefeitura de não ter feito levantamento. A prefeitura chegou a apresentar um cronograma com ações previstas até janeiro de 2016, mas foi considerado incompleto pelo MPF. A audiência conciliatória do próximo dia 13 tratará do novo cronograma

O QUE DETERMINA A AÇÃO

– Fazer um levantamento de todas as áreas de marinha ocupadas na região e identificar quem são os responsáveis e se há alvarás

– Iniciar processos administrativos para liberar a margem da Lagoa respeitando 30 metros no entorno

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– Dentro do espaço, 15 metros devem ser dedicados à circulação de pessoas

– A cada 125 metros, garantir acessos ou caminhos à Lagoa com largura de três metros

– Em caso de descumprimento cabe multa e o prefeito pode ser processado por improbidade administrativa