O vídeo publicado pela Polícia Militar nas redes sociais externando o descontentamento de oficiais da corporação com o Poder Judiciário segue gerando debate em Santa Catarina. Na manhã deste domingo, a Associação dos Magistrados de Santa Catarina (AMC) divulgou nova nota para mostrar o “profundo descontentamento com as recentes manifestações do Comando-Geral que (…) endereça insinuações à atuação do Poder Judiciário no âmbito criminal”. No sábado, também por meio da AMC, o juiz Renato Guilherme Gomes Cunha também rebateu as críticas feitas pela corporação e oficiais.

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Na nota deste domingo, apesar de elogiar o esforço dos agentes “mesmo diante de vastas dificuldades estruturais e dos riscos inerentes às funções” e de reconhecer o trabalho da polícia, a AMC pondera que é impossível aceitar que a conversa seja substituída por ataques subliminares e depoimentos oriundos do Comando Geral da Polícia Militar que desprezam o contexto, como verificado em vídeo institucional”.

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A associação ainda lembra que os magistrados tomam as decisões com base na constituição e que, no que diz respeito ao julgamento de infratores, a classe aplica regras pertinente a cada caso concreto, seja para soltar ou prender criminosos.

“Se imperfeições existem para o combate à violência e à criminalidade – e temos a convicção que sim – (…), que sejam trazidas para debate em ambiente e momento próprios, visando construção de soluções integradas que realmente possam servir ao fim maior pretendido, isto é, o de trazer segurança e tranquilidade à Sociedade”, finaliza a associação em nota.

Confira a nota da AMC na íntegra:

NOTA PÚBLICA

A Associação dos Magistrados Catarinenses (AMC) vem externar profundo descontentamento com as recentes manifestações do Comando Geral da Polícia Militar do Estado de Santa Catarina que, por meio de vídeo institucional, declarações nas redes sociais, notas e entrevistas jornalísticas endereça insinuações e críticas à atuação do Poder Judiciário no âmbito da jurisdição criminal.

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De pronto, lembra-se que, a partir de mandamentos contidos na Constituição da República, incumbe ao Estado o dever de promover e garantir segurança à Sociedade, sendo essa tarefa, então, distribuída entre os diversos Poderes e Órgãos Públicos.

Ao Poder Judiciário, por intermédio de seus Juízes e Tribunais, é estabelecida competência para processar e julgar eventuais infratores, além de acompanhar a execução das penalidades porventura aplicadas, tudo diante de legislação previamente posta, em que identificados os tipos penais (crimes e contravenções) e suas sanções, os procedimentos a serem observados na apuração dos fatos e a disciplina do respectivo cumprimento de pena.

E assim tem se pautado a Magistratura de Santa Catarina, sempre pronta a enfrentar as questões que lhes são trazidas e a rapidamente responder, aplicando as regras pertinentes a cada caso concreto, seja para decretar ou respaldar a necessária segregação dos ofensores, seja para ordenar sua soltura quando não estejam presentes as hipóteses de prisão ou o ato se mostrar desvestido das formalidades legais. Em qualquer das situações, vale colocar, as decisões e sentenças ainda se sujeitam ao reexame por Órgão Julgador colegiado do Tribunal de Justiça, mediante provocação dos legitimados.

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Essas as obrigações e os limites traçados por um Estado Democrático de Direito, que exige fiel observância da Constituição e das leis.

É certo que com igual preocupação também agem todos os demais atores dessa complexa engrenagem – Polícia Militar, Polícia Civil, Polícia Federal, Instituto de Perícias, Ministério Público, Defensoria Pública, Advocacia Privada e Sistema Prisional –, isso na busca do cumprimento de suas honrosas e indispensáveis atribuições.

A eles rendemos elogios pelo esforço contínuo e pelos relevantes serviços prestados à Sociedade catarinense, mesmo diante de vastas dificuldades estruturais e dos riscos inerentes às funções.

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No entanto, impossível aceitar que o diálogo, a parceria e o bom trato, que sempre nortearam o convívio entre as Instituições, sejam descartados e suplantados por ataques subliminares e depoimentos oriundos do Comando Geral da Polícia Militar que desprezam o contexto, como verificado em vídeo institucional (em que, na verdade, a prisão em flagrante restou relaxada por vício, mas presente anterior ordem de prisão temporária decretada pelo mesmo Juiz e pendente de satisfação pelas autoridades policiais) ou em notas e declarações contra o cumprimento de determinação que hoje é expressa na Súmula Vinculante n. 56 do Supremo Tribunal Federal.

Se imperfeições existem para o combate à violência e à criminalidade – e temos a convicção que sim, inclusive com origem na legislação penal e processual penal, ou mesmo no desatendimento, pelo próprio Poder Executivo estadual, de regras e condições para segregação de presos provisórios e condenados, grande propulsor da reincidência –, que sejam trazidas para debate em ambiente e momento próprios, visando construção de soluções integradas que realmente possam servir ao fim maior pretendido, isto é, o de trazer segurança e tranquilidade à Sociedade.

O tema em apreço se mostra relevante não só pelos valores envolvidos, mas principalmente pelos desafios que apresenta, exigindo serenidade, responsabilidade e ações conjuntas em que os propósitos se coloquem acima de pontuais divergências.

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Florianópolis, 16 de julho de 2016.

Odson Cardoso Filho

Presidente da AMC