O juiz Renato Guilherme Gomes Cunha, de São José, decretou a prisão preventiva de um dos envolvidos na tentativa de latrocínio de um comerciante, cujo relaxamento da prisão em decisão judicial pelo caso causou descontentamento e até gerou um vídeo institucional pela Polícia Militar. O magistrado também rebateu as críticas feitas pela corporação e oficiais.

Continua depois da publicidade

Vídeo: soltura de presos acirra descontentamento policial

A decisão do juiz sobre a prisão preventiva de Iago dos Santos foi divulgada neste sábado pela Associação dos Magistrados Catarinenses (AMC). O documento tem duas páginas. Primeiro, o juiz lembra do oferecimento da denúncia pelo Ministério Público (MP) e depois faz esclarecimentos do caso, tendo em vista ampla repercussão midiática, inclusive institucional, a respeito.

O juiz garante ser equivocada a informação da PM de que o acusado teria sido preso outras sete vezes anteriormente ao roubo em São José e que mais uma vez teria sido solto.

Continua depois da publicidade

— Sete aliás, como diziam lá em Três Riachos (Biguaçu), é o número de mentiroso — afirma o juiz na decisão.

Cunha explica ainda porque não homologou a prisão em flagrante em razão do crime contra o comerciante:

— O flagrante, na ocasião, foi relaxado porque ilegal, foi em completo desacordo com a lei, a quem todos devemos obediência, desde o preso, passando pela polícia e pelo Judiciário, chegando aos mais altos cargos da República e os donos das maiores fortunas do país, e cabe ao Judiciário a garantia que a lei seja respeitada — escreveu.

Continua depois da publicidade

Num segundo ponto, o juiz ressaltou que o suspeito mencionado nas redes sociais e no vídeo da PM está preso e não em razão do flagrante policial de agora ou por causa do alarde feito pelo vídeo institucional da corporação. Segundo o juiz, havia uma prisão temporária decretada por ele em maio do suspeito ainda antes do roubo ao comerciante.

— Se o referido mandado tivesse sido cumprido em maio, aquele que está sendo apontado como autor deste gravíssimo crime nos meios sociais não estaria solto — apontou.

Postagem na página oficial da PM de SC já possuí mais de 12,6 mil compartilhamentos

“10 mil prisões decretadas”
No mesmo despacho, o juiz Renato Guilherme Gomes Cunha alfineta a PM ao ressaltar que há dez mil prisões decretadas pela Justiça em Santa Catarina que ainda não foram cumpridas pela polícia.

Continua depois da publicidade

— A reflexão é que se fossem cumpridos esses mandados, quantos novos crimes seriam evitados, da mesma forma poderia ter sido evitado este porque sua prisão foi decretada um mês e meio antes do novo crime — destacou.

Ao final, o juiz diz lamentar que a PM promova inverdades flagrantes em prejuízo à credibilidade de todas as instituições envolvidas e afirma aguardar maturidade condizente da importância da instituição e de seus membros. A reportagem ainda não conseguiu contato com a defesa de Iago dos Santos, o qual conforme o juiz está preso.

“Faltou profissionalismo da polícia” diz juiz sobre vídeo e críticas feitas pela PM

O juiz Renato Guilherme Gomes Cunha, 37 anos, da Unidade de Combate ao Crime Organizado da Grande Florianópolis, conversou por telefone com o Diário Catarinense na manhã deste sábado.O magistrado fez críticas sobre a postura da Polícia Militar em divulgar um vídeo institucional de um suspeito de crime em São José que supostamente havia sido solto, mas que, conforme o juiz, em nenhum momento foi colocado em liberdade e está preso. Veja os principais trechos:

Continua depois da publicidade

Esse suspeito que a PM afirma ter sido solto então na verdade não foi solto e em nenhum momento ganhou a liberdade?
Não. Havia uma investigação por roubo e em maio encaminharam ao Judiciário requerendo a prisão temporária dele e após manifestação do Ministério Público eu mesmo decretei a prisão temporária dele em maio. O mandado de prisão já estava no sistema de segurança pública desde maio para ser cumprido. Na ocasião que acabou sendo preso em flagrante, que eu acabei relaxando, ele foi mantido preso, esse que aparece no vídeo, o Iago, por força de mandado de prisão anterior.

Então o senhor acha que a PM não checou essa informação que havia mandado de prisão anterior, apenas viu o relaxamento da prisão em flagrante e concluiu que ele havia ganho a liberdade e fez o vídeo?
Exatamente. Houve esse equívoco absurdo e outros, como de que ele foi preso outras sete vezes. Ele foi preso uma única vez. 

Por que o senhor relaxou a prisão em flagrante?
A lei prevê quatro pontos de flagrante: quando está cometendo o crime, quando acaba de cometê-lo, logo após quando há uma perseguição e logo depois quando é encontrado objetos, armas relacionados ao crime. Ele não estava cometendo o crime, não havia acabado de cometer o crime, não houve perseguição e também não foi preso logo depois com arma do crime. Na verdade o que a polícia fez, pelo que eu percebi, ela viu no vídeo quem teria sido o autor, já o conheciam, e foram até a casa dele aguardar que ele saísse. Daí é que houve a perseguição que eles tentaram justificar. Foi um descompasso da lei. 

Continua depois da publicidade

Por que o senhor não decretou a prisão preventiva?
Não houve o pedido pela preventiva (pela Polícia Civil). De qualquer forma ele não foi solto por causa do processo anterior em que já havia a prisão temporária.

Como o senhor está vendo a repercussão desse caso?
Eu acho que faltou um pouco de profissionalismo da polícia. Um pouco não, faltou profissionalismo da polícia. Na prisão, não adianta fazer uma prisão para aparecer ao grande público. Essa prisão tem que ser revestida das formalidades legais. Prender para depois ser solto porque foi feito de forma errada é um grave erro e prejuízo para a administração pública. Outra coisa, na divulgação do vídeo, capricharam muito no vídeo, mas com informações erradas, totalmente deturpadas, tentando trazer uma boa imagem da instituição em detrimento das demais. Na medida que tu tentas aumentar a credibilidade dessa instituição com informações inverídicas, além de atrapalhar e prejudicar a imagem das demais, num segundo momento prejudica a sua própria imagem.

Como o senhor vê as declarações do comando da PM sobre bandidos soltos, essa crítica que eles fazem?
Eu acho que tem que ser colocado a eles também, porque são mais de dez mil mandados de prisão que estão em aberto que a polícia poderia cumprir. Eu acho que o Judiciário que decretou essas mais de dez mil prisões também vê com preocupação esses bandidos soltos. Esse indivíduo que se refere no vídeo, se tivesse sido cumprido esse mandado de prisão antes, ele não teria praticado essa tentativa de latrocínio. A polícia tinha no seu sistema, tinha em mãos o mandado de prisão e só resolveu cumprir depois que ele praticou a tentativa de latrocínio, porque daria repercussão na mídia a sua prisão logo após o crime.

Continua depois da publicidade

Leia as últimas notícias do Diário Catarinense