Se há um lugar em que ninguém está sozinho mas muitos se sentem solitários é o Hospital Municipal São José. Na porta do quarto 513, na ala de neurologia, a dona de casa Alice Reck apoia a cabeça no ombro do marido, Vitor Tomaschitz Filho.

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Por um instante, ela fecha o olho esquerdo _ porque o direito está oculto sob um tampão cinza _ e aprecia o som de flautas que vem do corredor. A barulheira incomum para o ambiente não parece incomodar; pelo contrário, é um atrativo para tirá-la da cama, no leito onde está internada desde 13 de dezembro, quando deu entrada no hospital com visão dupla e dor de cabeça.

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Quem puxa a festa é Vera Maria de Miranda, 67 anos, Papai Noel oficial do hospital há exatas duas décadas. Com direito a barba falsa, maquiagem para esconder a face feminina, luvas brancas e sininho, ela percorre os caminhos que conhece tão bem junto ao grupo de voluntárias do São José, com o qual se reúne toda segunda-feira à tarde, faça chuva ou sol. De quarto em quarto, durante cerca de 4 horas, as mulheres distribuem presentes e alegria.

-Antigamente, a gente dava comida, frutas, panetone, fazia um café para os internos. Mas, como alguns têm restrição alimentar devido ao tratamento, hoje os presenteamos com itens não comestíveis. Neste ano, compramos 300 toalhas de rosto.

Durante o ano, o grupo organiza eventos e mantém um brechó no próprio hospital. Com o dinheiro arrecadado, prestam auxílio aos pacientes carentes, doando a eles roupas e itens de higiene pessoal. O dinheiro também serve para comprarem os presentes de Natal.

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Como a toalhinha que recebeu, o diagnóstico de Alice veio com surpresa: trombose no cérebro, um tipo de acidente vascular cerebral (AVC). O tratamento exige acompanhamento médico periódico e medicação oral por seis meses. Nesses 46 anos de existência, internada pela primeira vez na vida, passar o Natal longe de casa não é tarefa fácil. A saudade aperta e deixa um nó no coração.

-Foi um susto, um grande baque, especialmente porque nunca senti nada que indicasse o que estava por vir. Mas já estou preparada psicologicamente para passar este Natal aqui. O importante neste ano é me recuperar. Minha saúde é a prioridade-, conta Alice.

Há mais de 40 anos, a família do esposo se reúne para cear na noite de 24 de dezembro. Dia 25, o casal costuma celebrar com os familiares de Alice. Mas Vitor garante que a mulher pode ficar tranquila, porque em janeiro já estarão reunidos com quem amam. Grata pelo carinho, ela concorda:

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-São novos desafios na nossa vida, mas não podemos nos abater. Este é o momento para ficarmos mais fortes. Até brinquei com as enfermeiras que vou deixar uma meia para o Papai Noel me presentear-, diz a paciente enquanto abre um sorriso confiante.

– A gente tem que se adaptar. O Natal, neste ano, será diferente, mais ainda é Natal. Temos que manter o otimismo, tem gente muito pior.

No outro lado do corredor, Arielson da Costa Dias, de apenas 22 anos, permanece quieto na cama enquanto a festa natalina rola solta a alguns metros. Um tumor na perna esquerda fez com que o rapaz mudasse temporariamente de lar: da casa para o hospital.

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Dia 7 de novembro, sua perna foi amputada. Enquanto se recuperava, descobriu outro tumor, desta vez na espinha. O câncer o paralisou da cintura pra baixo. Em 25 de novembro, voltou ao leito de hospital.

-O Natal vai ser a mesma coisa este ano. Estar feliz ajuda-, garante ele.

E o motivo da felicidade, pelo sorriso que estampa no rosto, tem tudo para ser a esposa, grávida de quatro meses de um menino. Joinvilense, a jovem é a metade de Ariel há oito meses. Natural do Maranhão, ele vive há quatro anos em Joinville. Sua mãe, Lindalva Alves da Costa, 60 anos, está aqui para cuidar do filho e quer levar toda a família para o Nordeste quando o garoto se recuperar.

-É só o tempo que manda aqui e a força de Deus. Se ele me deixar sem as duas pernas, ainda tenho duas mãos para me virar-, fala o paciente com toda a fé dentro de si, torcendo para que neste Natal, quando faz sua última sessão de radioterapia e se prepara para a químio, tenha o pedido que fez ao Papai Noel atendido: receber alta.

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