Diante da polêmica sobre a construção de um novo porto em São Francisco do Sul, o AN convidou a Tetra Tech, empresa contratada pelo Porto Brasil Sul, para realizar o estudo de impacto ambiental do empreendimento, e um especialista do Projeto Babitonga Ativa para analisarem cinco grandes áreas que poderão sofrer consequências com a obra. O Porto Brasil Sul também detalha quais medidas a empresa propõe para reduzir e conter possíveis danos ao meio ambiente.
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O empreendimento, orçado em US$ 1 bilhão, será o maior do Sul e o quinto maior multicargas do País caso seja autorizado pelos órgãos ambientais a se instalar na cidade de São Francisco do Sul. Na última semana, a empresa Tetra Tech apresentou o estudo de impacto ambiental durante a audiência pública. Foram identificados 47 potenciais impactos, sendo alguns deles restritos apenas a uma fase do empreendimento (planejamento) e outros com ocorrência em mais de uma fase (implantação e operação). Essas alterações podem ocorrer na área de instalação, que fica na Ponta do Sumidouro, entre as praias do Capri e do Forte, mas também em toda a cidade e região.
O empreendimento, caso autorizado, será construído em uma área de 146 hectares, com sete terminais, oito berços de atracação e projeção de movimentar 20 milhões de toneladas por ano. De acordo com a empresa, na fase de construção, o Porto Brasil Sul iria gerar três mil empregos diretos, com foco na contratação de mão de obra no município. Além disso, a arrecadação de tributos decorrentes dos investimentos realizados no projeto seria de R$ 3,7 bilhões até 2030.
Neste momento, o porto ainda depende da licença ambiental da Fundação do Meio Ambiente (Fatma) para continuar o processo de autorização e começar a obra. Com o estudo de impacto ambiental concluído, a Fatma tem um ano para analisar os dados e pedir estudos complementares, caso seja necessário.
O doutor em oceanografia e coordenador científico do projeto Babitonga Ativa, Leopoldo Cavaleri Gerhardinger, critica o fato da Fatma fazer a análise separada dos demais empreendimentos que estão em fase de licenciamento para se instalar na região. Segundo ele, seria importante um planejamento integrado que pudesse prever os efeitos cumulativos gerados por todas as construções juntas, levando em conta a sustentabilidade da região.
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Com a licença ambiental concedida, a WorldPort, idealizadora do Porto Brasil Sul ainda terá de obter o licenciamento de instalação, que autoriza o início das obras. E depois, o licenciamento de operação, que libera o porto para começar a operar. A expectativa da empresa é de que as obras tenham duração de seis anos, com a primeira etapa entregue em meados de 2021.
Segundo o estudo da empresa, o empreendimento foi considerado, do ponto de vista técnico, viável ambientalmente pela consultoria, condicionado ao fato da efetiva execução das medidas de controle e dos programas ambientais propostos.
1- FAUNA E VEGETAÇÃO
O estudo de impacto ambiental prevê possíveis alterações na dinâmica da fauna aquática, a diminuição da cobertura vegetal nativa e a expulsão e redução da abundância e diversidade da fauna terrestre, entre outros. O doutor em oceanografia e coordenador científico do projeto Babitonga Ativa, Leopoldo Cavaleri Gerhardinger, aponta como uma das maiores consequências a extinção de uma grande área de vegetação de mangue e restinga.
No total, uma área de 114,43 hectares (1,1 milhão de metros quadrados) seria afetada para a construção do porto. Segundo Gerhardinger, as áreas de manguezais e restingas têm função social e ecológica.
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– O manguezal da Babitonga tem quase 80% de todos os manguezais de Santa Catarina. Esse ecossistema é berçário para muitas espécies de peixes que são exploradas comercialmente. Na restinga, existem espécies de mamíferos, aves e plantas que são únicas desse ambiente – explica.
De acordo com o Porto Brasil Sul, as atividades de limpeza e preparação do terreno que implicam na supressão de vegetação nativa serão objeto de programas específicos, como manutenção de uma área de 350 hectares no mesmo bioma – a ser aprovada pelo órgão ambiental – como medida compensatória.
A empresa também explica que os impactos previstos para as comunidades planctônicas, bentônicas e de peixes serão alvo de ações de monitoramento, que deverão contemplar também as faixas das praias do Forte, Sumidouro e Capri. Os principais programas a serem implantados são: Programa Ambiental da Construção, Programa de Gerenciamento Ambiental da Operação, Programa de Monitoramento da Fauna Aquática e Programa de Educação Ambiental.
Outra preocupação apontada pelo especialista é que o estudo de impacto não incluiu análise sobre preocupações frequentes de quem trabalha na área marinha, como a bioincrustação. O problema é o risco dos navios, que vêm de outros lugares do mundo, trazerem organismos que podem entrar na Baía da Babitonga e se proliferar, prejudicando outras espécies do local. Isso poderia afetar a maricultura de mexilhão e mariscos, por exemplo.
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2- SOLO, ÁGUA E ATMOSFERA
No estudo apresentado pela Tetra Tech, o aumento de sólidos e turbidez na água são possíveis consequências das atividades de dragagem e construção das estruturas no mar. Além disso, o manuseio ou armazenamento inadequado dos resíduos sólidos, o lançamento de efluentes líquidos e o trânsito de navios nos píeres podem alterar a qualidade do solo e das águas superficiais e subterrâneas.
De acordo com a empresa, os impactos da dragagem serão minimizados utilizando-se dragas do tipo Hopper, que diminuem a suspensão de sedimento durante o procedimento. Para verificar a qualidade da água durante essas atividades, serão implantados os programas de Monitoramento das Águas e Sedimentos Marinhos e de Controle e Monitoramento da Dragagem. Além disso, será criado um projeto para acompanhar a eficácia do sistema de drenagem e possíveis alterações nos corpos d’agua.
O especialista Leopoldo Cavaleri Gerhardinger aponta um outro revés. Segundo ele, a Transpetro descobriu que existe um problema no duto que passa em frente a Baía da Babitonga. A estrutura estaria se mexendo em razão da quantidade de ondas provocadas pela entrada e saída de navios da região o que exigiria muita atenção.
3- ATIVIDADE DE PESCA
Os potenciais impactos serão a criação de áreas de exclusão de pesca e a restrição de rota de circulação de embarcações pesqueiras. Isso porque não se pode pescar em áreas de atracação e de manobra de navios. Segundo especialista Leopoldo Cavaleri Gerhardinger, cada grande empreendimento construído contribui para o redirecionamento da pesca e quanto menos locais tiverem, mais concentrada ficará a atividade.
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O oceanógrafo também ressalta que a região onde ficará o novo porto é um território importante de pesca, principalmente da tainha. É o local por onde os cardumes de pescado amarelo, tainha, corvina, miragaia e camarão branco entram na Baía da Babitonga.
A WorldPort afirma está prevista a criação do Programa de Apoio à Atividade Pesqueira, que inclui a capacitação de pescadores e a implantação de infraestrutura, relacionandose principalmente com às etapas de beneficiamento e comercialização do pescado.
4- MOBILIDADE E CONDIÇÕES DE VIDA
Um dos impactos relacionados à mobilidade e às condições de vida dos moradores francisquenses será o aumento do tráfego de veículos e a intensificação do uso das rodovias, especialmente por caminhões. Segundo a empresa, para as fases de implantação e operação, o Porto Brasil Sul contará com novos acesso terrestres (rodoviário e ferroviário) para atender a demanda de tráfego.
O corredor previsto terá cerca de 15 quilômetros na direção Norte, até as futuras instalações do porto, e terá licenciamento específico. Segundo a WorldPort, responsável pelo porto, a empresa se compromete a realizar o acesso a partir da fase de obras, evitando a movimentação de caminhões pelas atuais vias de acesso à região do Forte.
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Também estão previstos possíveis incômodos à população com a limpeza do terreno e a construção do empreendimento, além da alteração da qualidade do ar por causa do tráfego de veículos. Para reduzir a emissão de gases e poeiras, a empresa prevê a manutenção e o monitoramento dos veículos e maquinários movidos à diesel, a umectação das vias não pavimentadas e a implantação de acessos próprios.
Além disso, também serão aplicadas medidas para controlar e atenuar os níveis de ruído e vibração. O coordenador científico do projeto Babitonga Ativa avalia que uma das maiores preocupações é o uso da água. Segundo ele, não foi realizado um estudo de demanda de água.
5- PAISAGEM E PATRIMÔNIO
As obras de implantação do Porto Brasil Sul também devem causar alteração da paisagem natural nos ambientes marinho e terrestre. Isso porque serão construídos píeres, cais e berços de atracação, além da presença de guindastes e movimentações de embarcações responsáveis pela execução das obras no mar. Também haverá a supressão da vegetação natural e elevação do terreno da área de implantação do porto em aproximadamente quatro metros e meio em relação à estrada do Capri.
O estudo de impacto prevê ainda que poderá haver interferências em áreas protegidas por causa das atividades de limpeza e preparação do terreno, além de alteração ou destruição do patrimônio arqueológico. Segundo o especialista Leopoldo Cavaleri Gerhardinger, outro impacto será na estabilidade da linha de costa porque a empresa pretende fazer uma barreira de contenção para evitar ondas. O especialista explica que é possível que ocorrram erosões e engorda de praias em alguns locais.
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Para minimizar as alterações na paisagem, a empresa vai adotar um sistema de controle previsto em programas a serem criados. Também vai definir as medidas cabíveis para o monitoramento ou resgate arqueológico após a conclusão de estudos que estão sendo realizados. Caberá ao Instituto do patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) indicar as medidas mitigatórios ou compensatórias a serem realizadas. Em relação às áreas protegidas, não haverá como reduzir os impactos. Por isso, serão aplicadas medidas compensatórias para a recuperação ecológica em área equivalente à desmatada.
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