Da Itália, onde mora desde os quatro anos com os pais adotivos, Tatiana Ribeiro da Silva viu numa página do facebook a esperança de reencontrar a mãe biológica. Aos 27 anos, lembrava pouco da infância vivida em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, mas o suficiente para que de uma sala de operações no centro de Florianópolis, o major Marcus Claudino conseguisse cruzar informações e revelar quem é e como vive a família que ela não vê há mais de duas décadas.
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Todo esse processo de reconhecimento aconteceu via SOS Desaparecidos de Santa Catarina, único centro da Polícia Militar no país específico ao trabalho de reencontro.
Depois da publicação da série Órfãos do Brasil, que retomou a história dos bebês vítimas do tráfico internacional na década de 80 – publicada em agosto de 2012 e que continua em apuração pelo Diário Catarinense – o SOS da polícia no Estado acabou se tornando ponto de referência para quem mora do exterior e procura por pessoas brasileiras.
Lyor Vilk, que nasceu em Curitiba e mora em Israel, é um dos precursores na busca por familiares brasileiros. Destaque na série do DC, ele aprendeu a falar português, é engajado no grupo de vítimas que vive no exterior e um dos braços de divulgação do serviço da PM de Santa Catarina entre os que querem redescobrir as origens.
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Dois encontros e oito casos em análise
É em Lyor, inclusive, que o major e coordenador do Centro se apóia para conseguir se comunicar com outros jovens, com idiomas que variam entre o hebraico, francês, italiano e inglês – tudo através da internet.
O SOS localizou duas famílias, em março e em junho, e trabalha com outros oito casos que provavelmente estejam ligados à venda de crianças e falsificação de documentos.
– Nós não trabalhamos com investigação criminal, de polícia. Para isso existem duas delegacias no Brasil, uma no Paraná e outra em Minas Gerais. O nosso trabalho é diferenciado, é o de unir as pessoas independente do motivo pelo qual tenham se perdido na vida – diz o major Marcus Claudino.
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Reencontro pela tela do computador
Com auxílio da tecnologia, dois irmãos que tiveram seus destinos apartados depois de uma adoção internacional conversaram nesta quinta-feira pela primeira vez. Diante de seu computador, na cidade de Nápoles, na Itália, sorria e chorava uma engenheira sanitária de 27 anos, adotada aos quatro anos por um casal de italianos.
Do outro lado da tela, no juizado da 3ª Vara da Infância e Juventude de Porto Alegre, estava o irmão que ela até pouco tempo nem sabia existir: um adolescente de 17 anos, internado na Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase) por roubo a pedestre. E também a mãe de ambos, uma ex-moradora de rua com distúrbios mentais.
A engenheira, que faz tratamento psiquiátrico, avisou que por enquanto não tem condições de vir ao Brasil. Mas o contato não será interrompido. Um novo bate-papo virtual entre os dois já foi marcado para a segunda-feira.
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– Isso só reforça que a vida é feita do lugar onde a gente nasce e de oportunidades. Precisamos criar as oportunidades certas – observa a juíza Vera Lúcia Deboni, que testemunhou o encontro.
A diferença entre Tatiana e os traficados
Aparentemente, Tatiana não se enquadra na história dos jovens que foram traficados quando bebês. As diferenças começam pelo ano em que ela foi adotada pela família italiana.
Apesar de ter a mesma idade dos outros jovens que foram vendidos, ela foi para fora do país com quatro anos e não bebê, o que a deixa de fora do período de pico de atuação das quadrilhas, entre 1986 e 1988. Além disso, a documentação estava correta – ao contrários dos outros jovens, não se verificou adulteração nos documentos e não havia nenhuma referência as nomes dos traficantes que se verificou nos casos confirmados de venda.
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Tatiana foi encaminhada para adoção junto com o irmão mais novo, os dois foram separados da família biológica pelo Estado por viverem em situação de vulnerabilidade social. Ela e o irmão, na época com um ano, foram adotados pela mesma família _ ele tem 16 anos e não quis contato com a mãe brasileira.
Como funciona o trabalho do SOS
– o trabalho começa com o pedido de ajuda. A partir das primeiras conversas é feito um cruzamento de dados, via sistema das polícias, os homônimos são analisados e as informações encaminhadas para a Justiça. O encontro só acontece com a participação de assistência social e se houver certeza de que o encontrado é a pessoa que está sendo procurada.
– esse trabalho é feito desde 2011 e funciona na sede do comando geral, no centro de Florianópolis. Por mês, são registrados entre 80 e cem pedidos de ajuda de dentro e de fora do país. No Brasil, 34 pessoas já foram encontradas.
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– o contato com o SOS pode ser feito pelo e-mail desaparecidos@pm.sc.gov.br, através do site ou ainda o contato pode ser feito via Facebook.