Os moradores de São José ainda não sabem como ficará a nova cara do Centro Histórico, mas não tem problema: o suspense faz parte do plano da Fundação Municipal de Cultura e Turismo, que prefere aguardar as sugestões dos arquitetos antes de começar a desenhar a reforma. O concurso aberto em dezembro dá algumas orientações para os participantes, mas é subjetivo o bastante para permitir projetos um tanto diferentes. Em março, o vencedor será anunciado e, em breve, toda a região deve se transformar num grande canteiro de obras.

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O espaço possui uma grande riqueza arquitetônica, com prédios dos séculos 18 e 19, mas a desconfiguração da área é perceptível: na parte inferior do Largo da Matriz, por exemplo, o prédio da Câmara dos Vereadores (ex-prefeitura municipal) impede a visão do mar desde a década de 1970. O Centro de Vigilância e Saúde, uma igreja evangélica e um ginásio de esportes também destoam do cenário açoriano, embora não obstruam o visual como a Câmara. Alguns prédios centenários foram transformados ao longo do tempo, e outros estão abandonados à própria sorte.

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– A ideia do concurso é justamente apontar o melhor jeito de fazer essas mudanças. Se soubéssemos qual é a forma ideal, nem precisava de concurso, apenas contratávamos um arquiteto – explica Caê de Souza Martins, superintendente adjunto da Fundação de Cultura e Turismo.

Como a fundação não tem uma equipe própria de arquitetos, o concurso está sendo organizado pela sede catarinense do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB/SC). O período para envio de projetos vai até 10 de março. Após análise técnica da IAB/SC, todos os trabalhos selecionados deverão passar pela votação de uma comissão popular formada por integrantes de diversos setores da sociedade. O vencedor do concurso levará a bolada de R$ 40 mil, pagos pela prefeitura de São José.

– A primeira comissão vai analisar os fatores técnicos dos projetos, enquanto a segunda vai votar no mais adaptado à realidade local. Se a IAB aprovar apenas um trabalho, a votação nem será necessária. Entretanto, se vários passarem pela análise, a população deverá escolher o melhor – conta Martins.

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Beco da Carioca será o primeiro a sofrer transformações

Embora a iniciativa preveja alterações por todo o Centro Histórico, o destaque é a restauração de um importante marco na trajetória josefense: o Beco da Carioca, que abriga um reservatório de água construído em 1840 nas proximidades da Igreja Matriz. O edital do concurso prevê não apenas a restauração do espaço, mas também a construção de um parque que tenha o Beco como ponto central.

Cheiro ruim e estado de abandono impedem reflexão sobre caráter histórico do espaço. Foto: Cristiano Estrela/Agência RBS

A prefeitura de São José já adquiriu um terreno vizinho e está tentando comprar outro, somando uma área de aproximadamente 1,2 mil m². Para a Fundação de Cultura e Turismo, é provável que o Beco seja o primeiro ponto atingido pelas reformas – tanto pela importância que o local possui quanto pelo avançado estado de degradação em que se encontra.

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Antigamente, a cisterna do Beco era a fonte de água de muitos moradores da região. O local possui uma espécie de tanque coletivo onde as escravas lavavam as roupas dos senhores brancos durante o século 19. Hoje, o cheiro ruim e o estado de abandono impedem qualquer reflexão sobre o caráter histórico que o Beco ainda guarda. As crianças da cidade fazem passeios e visitam a área, mas não há sequer uma placa explicando do que se trata aquela estrutura.

Vizinha do Beco da Carioca, Ruth Machado mora na região desde que nasceu. Ela lembra que, quando era criança, o espaço ainda era parte importante na rotina dos habitantes:

– Vinha gente de longe tomar água aqui. A qualidade da fonte era famosa em toda a cidade. Um vizinho, por exemplo, pegava o carrinho de mão e vinha enchê-lo quando faltava água – relembra.

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Priorizar o mar e os pedestres

O foco do plano de reestruturação é a área da Praça Hercílio Luz, onde estão o Theatro Adolpho Mello e a igreja Matriz, mas as vias de acesso também deverão sofrer importantes alterações. O edital pede que os arquitetos proponham mudanças no trecho compreendido entre a Praia Comprida e o acesso à Ponta de Baixo, uma área de aproximadamente três quilômetros. Bastante abrangente, o documento especifica apenas que o ponto principal é a “priorização do pedestre e melhorias de circulação viária”.

Segundo a Fundação de Cultura e Turismo, já é possível eliminar tanto a possibilidade de uma via exclusiva para pedestres quanto a de uma via expressa. A superintendente da fundação, Elenita Gerlach Koerich, acredita que o projeto escolhido deverá consolidar um espaço para caminhadas, consequentemente valorizando o comércio local.

Demolição de prédios da região não é descartada

Uma reestruturação como a que a prefeitura está prevendo exige envolvimento de vários setores da sociedade, principalmente quando se leva em conta o gasto que a operação exige. Por isso, os projetos aprovados pela análise técnica da IAB/SC deverão ainda passar pelo crivo de uma comissão popular – ainda não montada -, formada por integrantes de diversos setores sociais.

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Câmara de Vereadores foge do ideal, mas reforma há três anos custou R$ 2 milhões aos cofres públicos. Foto: Cristiano Estrela/Agência RBS

O prédio da Câmara de Vereadores de São José, por exemplo, foi erguido na década de 1970 e foge completamente do idealizado pela Fundação de Cultura, mas uma reforma no edifício feita há três anos custou cerca de R$ 2 milhões aos cofres municipais. Hoje, a Câmara usa apenas energia eólica, reaproveita água da chuva para os banheiros e jardins, tornando-se uma referência de sustentabilidade em prédios governamentais.

– Como poderíamos propor que um prédio desse tamanho seja simplesmente destruído? Não faz sentido, seria um desperdício de dinheiro público. Estamos aguardando os projetos para tentar encontrar a solução ideal. Quem sabe um mirante, uma reforma externa? Os arquitetos que vão nos apontar isso – explica Caê Martins.

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