Nasci em Pinhalzinho, em 1988 e hoje moro em Blumenau. É muito louco para quem vive a poucos minutos da praia pensar que alguém pode passar a vida sem conhecer o mar. Mas pra quem vem de um município pequeno e encantador do Oeste de Santa Catarina, maluco é pensar como alguém consegue viver tão perto dele e simplesmente não dedicar os primeiros segundos de contato visual para se sentir pequeno, inundado e infinitamente feliz.

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Tenho pelo Oeste o mesmo sentimento que o interiorano tem pelo litoral. Não consigo entender como é possível que, do quintal de casa, alguém aviste o Sol fazendo a curva do horizonte e não se sinta absolutamente privilegiado.

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O interior de Santa Catarina é simplesmente inacreditável. São dezenas de pequenos municípios com centenas de olhares diferentes sobre a vida e milhares de emoções escondidas em cada portinha. Uma progressão assim, geométrica mesmo. O povo do interior não fala de sentimentos, mas não significa que eles não sintam com intensidade. Pode não ser tão viciado em tecnologia, mas está longe de ser desinformado. Tem uma vida simples, mas não significa que não seja absolutamente feliz.

Com a informação mais rápida e simples, há empresas lá vendendo conhecimento e tecnologia para multinacionais.

Pra quem ouve as histórias que começam com “nasceu num pequeno município do interior…”, pode parecer que chegar à cidade grande é uma grande conquista. Mas se engana. Sair do interior não é evoluir. É apenas mudar de ares, mas não mudar nunca o jeito de ver a vida.

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O sonho dourado das oportunidades profissionais que as grandes cidades vendiam para conquistar os aguerridos trabalhadores do Oeste, por exemplo, vai aos poucos sendo corroído pela maresia. Com a informação mais rápida e simples, há empresas lá vendendo conhecimento e tecnologia para multinacionais. Há hotéis que antes ofereciam abrigo apenas para quem viajava a trabalho se transformando em opção turística lotada o ano inteiro.

Enquanto nas cidades grandes os produtos orgânicos aumentam de preço a cada piscada, no interior cada um cuida da sua própria horta. E o escambo, que tanta gente planeja começar a fazer com o vizinho nas cidades grandes, é uma prática que nunca foi abandonada por lá.

Os móveis de madeira de demolição que nos home centers ganham apelos marketeiros de sustentabilidade, no interior decoram as casas sem nenhuma cerimônia. Nos centros, os fogões à lenha são o sonho de muita gente e lá é raro encontrar quem não tenha. Nós acordamos a noite com o vizinho de cima sapateando de madrugada, lá todo mundo mora na sua própria casa – que pode ser um casebre ou uma mansão, mas é sua.

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O interior está se tornando hype. E a simplicidade de quem vive lá talvez ainda não permita que eles saibam nem o que é isso.

Os livros têm a pretensão de ensinar a felicidade dizem pra pisar na grama, tomar café sentado à mesa, compartilhar momentos com a família, cozinhar com calma, tirar uma sesta depois do almoço, respirar ar puro. Deveriam indicar uma semana detox lá pelas bandas de Nova Erechim.

O interior está se tornando hype. E a simplicidade de quem vive lá talvez ainda não permita que eles saibam nem o que é isso. Eis aí um dos motivos para visitar e valorizar o nosso interior: os títulos e rótulos que deixam as pessoas nas cidades cada vez mais difíceis de conviver, ficam de lado. O que o interiorano mais quer é companhia e boas histórias para dividir um chimarrão. Tolo de quem não souber aproveitar.

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Marina Melz é blogueira do Invisível Particular