Projetos como o que foi discutido nesta terça-feira na Câmara de Florianópolis, proibindo que vereadores assumam cargos no Executivo sem renunciarem ao cargo, ganharam espaço em Santa Catarina depois que Balneário Piçarras aprovou proposta semelhante no mês passado. Já há debate ou projetos praticamente iguais protocolados em pelo menos quatro das 15 maiores cidades do Estado. Com justificativas de separação dos poderes e diminuição do revezamento de cargos pelos partidos, a medida também tem levantado dúvidas sobre a constitucionalidade. Para especialistas, a ação é totalmente legal e até saudável para o processo político.
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Em todos os casos a mudança ocorre por uma emenda à Lei Orgânica Municipal (LOM) de cada cidade. Com pequenas variações, os textos basicamente determinam que os vereadores não podem apenas se licenciar das câmaras para ocuparem cargos no Executivo, mas sim precisam renunciar. A proposição foi votada e aprovada primeiro em Piçarras, mas a ideia ganhou corpo em Florianópolis. O vereador Pedrão Silvestre (PP), autor do projeto na Capital, encaminhou cópias do embasamento da proposta para vereadores do mesmo partido, de outras Casas, que aderiram ao movimento. Em Florianópolis, o projeto ia a votação ontem, mas recebeu uma emenda e voltou para as comissões.
A Constituição Federal fala apenas da situação de deputados e senadores. O advogado mestre em Direito Público pela UFSC e professor de Direito Constitucional e de Direito Processual Constitucional, Ruy Espíndola, analisa que, embora possa haver alguma brecha para questionamento, o entendimento geral é de que a alteração na LOM não fere a Carta Magna do país:
— Avalio que isso está dentro da capacidade de autoconfirmação do município de legislar essa restrição. Feriria apenas um costume estabelecido, que é autorizado pelas leis, e talvez o Tribunal de Justiça ou o STF poderiam num recurso entender diferente. Não vejo inconstitucionalidade e acho que está na competência do vereador. Inclusive vejo isso como um passo adiante para a melhor independência dos poderes.
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A opinião do advogado mestre e doutor em Direito Constitucional pela UFSC Luiz Magno Pinto Bastos Júnior é parecida. Ele pondera somente que, diante da cultura política brasileira, talvez fosse mais interessante uma mudança a médio ou longo prazo, visando uma adaptação maior ao processo por parte dos políticos.
— Não há nenhum impedimento de que possam firmar essa regra, não vislumbro nenhuma proibição constitucional. Até porque não se trata de que o vereador não pode assumir secretaria senão perde o cargo, mas sim que a licença não pode ser pedida com esse fundamento — diz.
O advogado mestre em Direito Constitucional pela UFSC José Sérgio da Silva Cristóvam considera ainda que, além de ser plenamente constitucional, a prática seria inclusive saudável à democracia.
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— A Constituição estabelece o princípio de separação dos poderes, com independência e autonomia. Nesse sentido o projeto visa manter os eleitos no legislativo para legislarem. Me parece que isso fortalece esse o processo de separar os poderes. É um caminho na direção correta, que fortalece a democracia — comenta.
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Onde há discussão
Balneário Piçarras
Autor do projeto: vereador Oswaldo Moreira da Silva Junior (PP)
– Emenda à Lei Orgânica Municipal foi aprovada em 18 de outubro por unanimidade. Com a aprovação da proibição, o artigo 45 da LOM conta agora com o artigo ¿B¿, vedando que o vereador aceite ¿cargo, emprego ou função, no âmbito da administração pública direta, indireta, fundacional ou autárquica, salvo mediante aprovação em concurso público¿. A troca do Legislativo pelo Executivo só será possível se os políticos renunciarem ao mandato na Câmara.
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Itajaí
Autor do projeto: vereadora Anna Carolina (PSDB)
– Projeto chegou na Câmara no dia 3 de novembro e ainda precisa passar pelas comissões de Constituição e Justiça e de Trabalho antes de ir a plenário. A alteração é no artigo 20 da Lei Orgânica Municipal, vedando que vereadores ocupem cargo ou função no Executivo sem que renunciem ao mandato, inclusive o cargo de secretário municipal, presidente de empresa pública, ou superintendência de autarquia, ressalvada a admissão por concurso público.
Balneário Camboriú
Autor do projeto: vereador Leonardo Piruka (PP)
– Proposta que altera a Lei Orgânica de Balneário entrou na Casa em 27 de novembro e ainda precisa passar por duas comissões antes de ir a plenário. O projeto muda o artigo 33 da LOM, vedando ao vereador aceitar, exercer ou ocupar cargo ou função no poder executivo municipal, inclusive o cargo de secretário municipal, presidente de empresa pública ou superintendência de autarquia. A única possibilidade seria com a renúncia ao mandato.
Florianópolis
Autor do projeto: Pedrão Silvestre (PP)
– Proposta de emenda à Lei Orgânica n 075/15 que altera o art 43 da Lei Orgânica Municipal de Florianópolis e veda o vereador de aceitar, exercer ou ocupar cargo ou função no poder Executivo. Tramita na Câmara desde 3 de setembro de 2015. Ontem chegou a entrar em discussão e estava prestes a ir à votação até que oito vereadores assinaram uma emenda à matéria. A ideia propõe que o projeto só entre em vigência em 2021. Agora o projeto retorna para as comissões.
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Outras cidades
Pelo menos outros três municípios _ Navegantes, Camboriú e Jaraguá do Sul _ discutem o assunto, mas ainda não foram protocolados projetos nas Câmaras de Vereadores, seja como proposta de emenda às leis orgânicas, seja como projeto de iniciativa popular.
O que diz a Constituição Federal
A Constituição fala apenas em deputados federais e senadores, não citando nominalmente a situação dos vereadores.
Artigo 56
Não perderá o mandato o deputado ou senador:
I – investido no cargo de ministro de Estado, governador de território, secretário de Estado, do Distrito Federal, de Território, de Prefeitura de Capital ou chefe de missão diplomática temporária;
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II – licenciado pela respectiva Casa por motivo de doença, ou para tratar, sem remuneração, de interesse particular, desde que, neste caso, o afastamento não ultrapasse cento e vinte dias por sessão legislativa.
§ 1º O suplente será convocado nos casos de vaga, de investidura em funções previstas neste artigo ou de licença superior a cento e vinte dias.
§ 2º Ocorrendo vaga e não havendo suplente, far-se-á eleição para preenchê-la se faltarem mais de quinze meses para o término do mandato.
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§ 3º Na hipótese do inciso I, o deputado ou senador poderá optar pela remuneração do mandato.