Depois de ver a posse dos aprovados no concurso público de 2015 adiada pela terceira vez, outra polêmica mexe com o efetivo da Polícia Militar de SC. A partir desta semana, 102 cidades do Estado com menos de oito policiais nas guarnições voltam a aplicar a escala de 24 horas de serviço por 48 horas de descanso na PM, conforme despacho assinado pela Secretaria de Segurança Pública com base em estudos do próprio comando da corporação. A escala atual de 12x24h/12x48h garante que o expediente ultrapasse no máximo 16 horas nas 40 horas semanais estipuladas por lei – o que é considerado aceitável pela categoria dentro da reestruturação financeira que a carreira teve em 2013. Com 24x48h, o total mensal pode chegar a até 80 horas a mais do que manda a legislação.

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Governo de SC adia pela terceira vez posse de aprovados em concurso da PM

A mudança causou revolta na Associação de Praças do Estado de SC (Aprasc), que afirma que a alteração quebra um acordo feito em 2013, quando o pagamento de horas extras foi extinto para a criação do subsídio unificado da PM. A nova forma de vencimento acabou com todos os “penduricalhos”, expressão usada pelos soldados para se referir a ganhos que não fazem parte do salário – adicional noturno, triênio e a hora extra, entre outros.

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Conforme a Aprasc, na época ficou acertado que a PM não teria mais a escala 24 por 48 horas, e que ela seria usada exclusivamente no Corpo de Bombeiros Militar, por apenas mais um ano apenas, em “regime de prontidão”. A diretoria da associação diz que vai buscar medidas legais contra a modificação.

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– Com uma escala 18x54h e gerenciamento, a PM pode trabalhar com o mesmo efetivo que tem hoje. Com 24x48h querem que o policial trabalhe de graça. O governo e o comando da PM institucionalizaram a escravidão e mentiram para os praças. Mentira, a palavra é essa. Vamos lançar uma campanha reprovando a decisão e não vamos aceitá-la. É uma traição – declara o presidente da Aprasc, cabo Elisandro Lotin de Souza.

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Ele também pondera que a própria Medida Provisória nº 202, editada em agosto de 2015 e que regulamenta a jornada de trabalho e muda os critérios para a concessão da Indenização por Regime de Serviço Ativo (Iresa), deixa claro que a escala 24×48 não é aplicável à PM.

Associação diz que vai se mobilizar contra a medida

Apesar de a MP 202 abrir a possibilidade de o comandante-geral criar qualquer escala com autorização do secretário da Segurança Pública, de acordo com a necessidade, o coordenador de Assuntos Jurídicos da Aprasc, subtenente Edson Garcia Fortuna, avalia que o caso desse despacho não é uma medida específica e nem por tempo determinado:

– Abre precedente para fazer qualquer escala, a qualquer tempo e em qualquer lugar.

Os praças se mobilizam para participar da reunião na Comissão de Finanças da Assembleia Legislativa, que vai tratar da MP 202, nesta quarta-feira, às 9h. A direção da Aprasc apresentou uma série de emendas e espera que o posicionamento do relator da MP, deputado Marcos Vieira (PSDB). Além disso, reuniões regionais e, possivelmente, uma assembleia estadual nas próximas semanas vão discutir eventuais mobilizações da categoria.

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O que dizem a SSP e a Polícia Militar

A SSP informou que a assinatura do despacho é apenas um ato protocolar sobre um estudo técnico feito pelo comando-geral da Polícia Militar e pelo Estado Maior-Geral, responsáveis por definir essa mudança. A PM se pronunciou por meio de nota oficial. Confira a íntegra:

“A medida foi tomada depois de uma análise apurada da atividade operacional, objetivando manter a presença da Polícia Militar nas 24 horas do dia, nos 295 municípios do Estado. Sem a adoção desta medida não seria possível garantir o efetivo mínimo da Polícia Militar em alguns municípios, de forma a realizar a segurança da população catarinense e dos visitantes. É medida excepcional, temporária e somente será efetivada quando a conjuntura local assim exigir.

Centro de Comunicação Social da PMSC”.

Especialistas têm posições contrárias

Quantidade e qualidade nem sempre andam lado a lado. É nessa linha a análise do professor de Direito da Univali e especialista em segurança Alceu de Oliveira Pinto Júnior sobre a mudança na jornada de trabalho na PM. Embora a escala 24x48h possa dar uma impressão de mais policiamento nas ruas, ele alerta que a decisão não leva em conta a grande carga de tensão inerente à profissão de policial.

– Reflete o problema histórico da falta de efetivo e me parece muito perigoso. O trabalho do PM é tenso, dinâmico. Mesmo com todo o treinamento e experiência, elevar o tempo a que o policial fica exposto a isso é sobrecarregar, é afetar o desempenho e o rendimento dele. A necessidade de atuação não pode ser suplantada pelo sacrifício dos soldados – afirma.

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Já o coronel da reserva do Exército e analista de segurança Eugênio Moretzsohn destaca que a população sofre com a forte sensação de insegurança, e que ela é amenizada pela maior visibilidade da polícia nas ruas e por maior atenção no atendimento aos que a procuram, normalmente fragilizados por assaltos e outras ocorrências.

– O comando da PM de Santa Catarina contará com o irrestrito apoio da população se, para melhor atendê-la, necessitou “descumprir acordos” que nem sequer deveriam ter sido negociados. Tenho a certeza que, se foi necessário modificar a escala para atender à necessidade de reforço no policiamento, essa decisão foi estudada e deliberada por pessoas competentes, responsáveis e que não estão brincando com ninguém – argumenta.