Descobrir, conhecer e cuidar de 166 anos – sem contar a pré-história – é tarefa para poucos. Como se tivessem sido escolhidos por doutor Hermann Bruno Otto Blumenau, Sueli Petry e Adalberto Day zelam pelas memórias da cidade. Cada um à sua maneira dedica os dias a registrar e proteger os fatos que narram o desenvolvimento da comunidade e contam hoje um pouco de suas versões preferidas dos acontecimentos.
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A menina do arquivo
Foi nas páginas das antigas enciclopédias – o refúgio dos estudantes na era pré-internet – que a menina Sueli descobriu o encanto pela história. Ela queria conhecer o mundo e se imaginava naqueles lugares distantes, conhecendo culturas diferentes da dela, que fora criada na pequena Indaial dos anos 1950. A magia continuou e a levou para a faculdade de História e para o mestrado, onde ela se viu, mais uma vez, encantada.
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Desta vez foram os clubes de caça e tiro, que desfilavam sisudos e tradicionais pela Rua XV de Novembro em um 2 de setembro longínquo, despertando a curiosidade da jovem pesquisadora. Só mais alguns passos e o destino estava traçado: a apuração para a tese, os primeiros contatos com o singelo arquivo histórico dos meados dos anos 1970, uma conversa. A professora que criticava a (falta de) organização foi alçada a arquivista oficial. Começava um longo casamento que já dura quatro décadas:
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– Está chegando a minha “expulsória” (aposentadoria compulsória do serviço público) e acho que vou trabalhar voluntariamente, porque 40 anos fazendo o que você ama, não dá para parar, nem posso.
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Foi assim, através dos clubes de caça e tiro, que a professora e diretora do Patrimônio Histórico-Museológico de Blumenau, Sueli Maria Vanzuita Petry, 67 anos, imergiu na história da cidade e se tornou uma guardiã dos capítulos que formaram a porção de terra germano-brasileira incrustada no Vale do Itajaí. Entre as prateleiras do Arquivo Histórico José Ferreira da Silva ela guarda as próprias memórias, que se misturam às lembranças dos cidadãos que doaram alguma parte de sua história para integrar a biografia da cidade.
– No incêndio de 1958 (na antiga sede da prefeitura, onde atualmente funciona a Fundação Cultural) foram perdidos praticamente todos os documentos do arquivo, então foi preciso recuperar muita coisa e, para conseguir isso, sempre contamos com as pessoas – conta, relatando o “trabalho de formiguinha” para conquistar a confiança da comunidade.
Entrevista | Sueli Petry
Qual o seu episódio preferido da história de Blumenau?
Todas as histórias são interessantes, mas quando fui a Hamburgo, na Alemanha, que é um dos principais portos de onde saíram os imigrantes, e vi o rio Elba, me emocionei muito porque lembrei das cartas que li onde eles se despediam e diziam: “Adeus, pátria querida. Estamos atravessando o Elba para entrar no (mar) Báltico e chegar ao (oceano) Atlântico, nunca mais te verei”. Aquilo me emocionou, as cartas e o que as pessoas sentiam.
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E qual o seu personagem preferido da história de Blumenau?
Admiro muito Gustav Salinger, Pedro Christiano Feddersen, que foram pessoas que alavancaram o progresso, e também Alwin Schrader. Nós temos personagens bem interessantes, os anônimos que fizeram a história e não são lembrados, porque nós sabemos que se há o grande empresário, o grande comerciante, nos bastidores eram os colonos e operários que eram as formigas que carregavam a folha maior.
Uma saudade da antiga Blumenau que conheceu?
De ver a Rua XV de Novembro fervilhando de pessoas, olhando as vitrines… Era uma Blumenau que já não existe mais, tenho plena consciência, mas as pessoas vinham de trem, e como filha de ferroviário me incluo nessa porque morava em Gaspar, e vir a Blumenau era como ir a São Paulo, à grande metrópole. E tenho saudade dos passeios que se faziam com tranquilidade, mesmo com o trânsito que existia.
Indicações de Blumenau
– Um museu: Todos têm uma particularidade, um sentimento, não tenho uma preferência. O Museu de Hábitos e Costumes tem um glamour diferente. Assim como o Museu da Família Colonial, que tem um valor inestimável.
– Um tesouro escondido: São tantos! Mas acho que o blumenauense, para descobrir os seus tesouros perdidos, ele primeiro precisa descobrir a si mesmo. Quem é a minha cidade? O que faço pela minha cidade? Preservo o meu patrimônio cultural? Acho que o tesouro está dentro de nós mesmos.
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– Um cartão-postal: Têm vários, mas um que gosto muito é a Igreja Evangélica.
– Um capítulo desconhecido da história: A transição dos anos 1940 e 1950, o período após a Segunda Guerra Mundial.