– Quando eu inaugurar a sede do instituto vai ter até desembargador.
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Da frase atribuída em 2011 a Neiva Quintilhan, diretora-presidente do Instituto Bdoni, vangloriando-se de suas conexões políticas, até a atual situação da ONG que recebeu dinheiro do Ministério do Trabalho para realizar cursos de capacitação em Santa Catarina, há um rastro de dívidas e indícios de irregularidade.
A entidade firmou um convênio de R$ 121 mil com o ministério em 2009, mas os cursos profissionalizantes só começaram em junho de 2011. E o atraso não foi o único problema enfrentado por quem se envolveu na história.
– Todas as professoras tomaram calote. Sempre diziam que estava vindo um documento de Brasília. Aí sempre ficava para a semana que vem. No final do curso, sumiram – diz Angela Toaldo Agostini, que ministrou um curso de camareira. Ela está entre os 10 professores que não receberam pelo trabalho realizado.
As aulas foram oferecidas em salas do Cedup Florianópolis e da Epagri. O acordo com o ministério previa a capacitação de 170 pessoas. Somados os alunos dos dois locais, o número não superava 120 pessoas. Mas Neiva prometia que o curso seria estendido a outras regiões do Estado e que as professoras seriam chamadas para dar aulas novamente, de acordo com Angela.
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A professora diz que após pressão de uma parte dos alunos que tiveram o curso na Epagri, alguns conseguiram seus certificados. Mas deveriam ter sido dados aos alunos vales transporte e alimentação para frequentar as aulas. Foi o contrário. Neiva teria cobrado dos interessados.
A diretora do Cedup de Florianópolis, Eli Boing, guarda dois recibos que mostram as quantias de R$ 90 e R$ 520, cobrados dos participantes dos curso, que deveria ser composto por beneficiários do Bolsa Família de acordo com o edital.
– No término do curso não foram expedidos os certificados e ela falou aos alunos que eles ficariam aqui no Cedup – conta Eli, que foi procurada por várias pessoas que deveriam ter sido beneficiadas pelo convênio após o término das aulas.
A ONG catarinense recebeu R$ 70 mil do Ministério do Trabalho, do total de R$ 121 mil do convênio. Questionada há uma semana sobre por que não repassou todo valor, a assessoria do ministério não respondeu a reportagem. O último repasse data de 20 de abril de 2010.
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No Portal Transparência do governo federal a informação é de que o ministério aguarda a prestação de contas do convênio com Instituto Bdoni. O ministro catarinense Manoel Dias (PDT), que anunciou uma força-tarefa para analisar os convênios depois da série de denúncias de irregularidades que veio à tona em setembro, afirmou que se existirem convênios em que as contas não foram prestadas os responsáveis serão cobrados a restituir os recursos.
::: Pedagoga entrou com processo, mas nunca recebeu
Raquel da Cunha de Melo, 31 anos, foi contratada para ser coordenadora pedagógica dos cursos no Instituto Bdoni e acabou levando um calote de R$ 9 mil, fora sua alimentação e o que trazia para os alunos não passarem fome.
– Como a gente estava dando curso para pessoas carentes, você fica com pena dos estudantes. A gente sabia que eles seriam os mais prejudicados se abandonássemos. Até nos reunimos para discutir isso. Mas, poxa, nós não podíamos deixar os alunos na mão. Eles já eram carentes e estavam ali atrás de alguma estrutura para trabalhar – conta ela.
Raquel entrou com um processo na Justiça. Chegou até a negociar uma forma de pagamento, acordada perante o juiz, mas depois dessa audiência nunca mais ouviu falar de Neiva e o dinheiro nunca foi depositado em sua conta.
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::: Contraponto
Uma sala comercial onde funcionaria o sede do Instituto Bdoni teria sido abandonada por Neiva Quintilhan por uma ação de despejo. O telefone informado na lista telefônica como da ONG dá em um endereço residencial. A tramitação de uma intimação judicial no nome de Neiva, disponível na internet, informa um endereço no bairro Capoeiras. A reportagem do DC esteve no local e falou com Neiva pelo interfone:
– O dinheiro já está vindo do Ministério. Assim que chegar vou pagar todo mundo – disse ela, sem abrir a porta do prédio.