A Oktoberfest cresceu. A 34ª edição da festa evoluiu, ganhou mais dinheiro – foram R$ 4,25 milhões de lucro nos 19 dias de festa em 2017, quase 11 vezes maior do que em 2012 – e faz a roda do turismo e lazer da cidade girar. Tratada estrategicamente como um produto, ela se tornou em um curto espaço de tempo um meio para custear a própria Vila Germânica e fundamentalmente para financiar outros eventos organizados pelo poder público em Blumenau: Magia de Natal, Osterdorf, Réveillon e Sabores de SC (confira na tabela) saíram do papel graças ao lucro que vem dos pavilhões durante a folia em outubro.

Continua depois da publicidade

A maior festa alemã do Brasil passou a ter relevância no entretenimento e no social. Muitas pessoas indiretamente passaram a ter ligação com a festa (conheça a história de Maria Gessir Ribeiro abaixo). Basta perguntar para qualquer uma das 80 meninas que fazem parte do programa que envolve o handebol na cidade. Foi graças a uma parte do superávit da festa no ano passado (R$ 10 mil) que elas puderam ter bolas novas para jogar, treinar e representar o município em competições pelo país. Futebol, futsal, basquete e vôlei também foram beneficiados.

A festa assumiu a organização financeira e responsabilidade como pré-requisitos. Passou a ser gerida como uma empresa, mas com a diferença de que não precisa fracionar esse montante entre sócios ou acionistas. O oposto disso. Pega o que sobra e divide entre setores da comunidade para impulsionar o entretenimento e o lazer na cidade de janeiro a janeiro, gerando movimento e mais receitas.

Modelo de gestão se estende ao Vale do Itajaí

Em um contexto que envolve lucro, movimentação de turistas e giro econômico na cidade, é quase inevitável despertar interesse também nos vizinhos. Isso traz à tona a ideia do Circuito Festas de Outubro, uma espécie de aproveitamento turístico de municípios como Brusque (Fenarreco), Itajaí (Marejada), Timbó (Festa do Imigrante) e Porto Belo (Festival do Camarão) daquilo que é gerado por Blumenau. Essas cidades não apenas se inspiram no modelo da Oktober, como se apegam ao público da festa para atraí-los. E isso é visto com bons olhos.

Continua depois da publicidade

A organização da Fenarreco admite que precisa se reestruturar para se tornar cada vez mais atrativa ao visitante. O diretor da Secretaria de Turismo de Brusque, Norberto Maestri, se reunirá ainda neste ano com os organizadores da festa blumenauense. O objetivo é adquirir conhecimento, entender como é feita a captação de patrocínios, a estruturação dos pavilhões, a contratação de bandas e a organização de desfiles.

– Temos que copiar o que dá certo e buscar informações com quem conhece. Queremos todas as informações possíveis e até as impossíveis. A Oktober é a mãe de todas as festas, e as filhas precisam estar preparadas e bem arrumadas para quando vier visita – brinca Maestri.

O mesmo vale para Itajaí. Reposicionar a Marejada no calendário e consolidá-la novamente é o objetivo do município que também se baseia no formato da Oktoberfest. A ideia é trazer novamente confiança à festa e dar a ela uma identidade e, depois, desenvolvê-la ao ponto de gerar superávit para o município do litoral. E engana-se quem pensa que esse é um pensamento a longo prazo. Com o exemplo de Blumenau, quer gerar lucro ao apostar principalmente na gastronomia do evento. Na opinião do secretário de Turismo de Itajaí, Evandro Neiva, isso se dá pela forma como ela foi tratada, com uma gestão pública tendo status de iniciativa privada:

– Não é nenhum problema copiar algo que dá certo, mas nós temos que preparar e adaptar a cidade para isso. A festa tem que ter uma gestão profissional e não pode ficar na mesmice. Imagino a Marejada em breve com o mesmo modelo de Blumenau, gerando lucros e ajudando outros eventos e instituições na cidade.

Continua depois da publicidade

Os eventos que a festa financia no restante do ano

A Oktoberfest atravessa a atual fase com projetos bem delineados. O lucro que cresce a cada ano não passa nem perto do caixa único da prefeitura, fica no orçamento da própria Vila Germânica. Isso não quer dizer que não ajude o município. O secretário de Gestão e Transparência Paulo Costa explica que, graças à verba deixada pelos visitantes, o município precisa repassar menos dinheiro à manutenção da estrutura onde ocorre a festa – mais da metade do lucro deste ano irá para manter a Vila –, mas também ao estímulo do turismo de forma geral.

Mas é no desenvolvimento de outros eventos para o turismo da cidade que está a principal vocação desta Oktoberfest superavitária. O destino da maior parte do lucro da festa é para custear eventos como o Réveillon. Um dos sonhos de consumo é a consolidação do Magia de Natal, responsável por atrair 240 mil pessoas ao Parque Vila Germânica em 2016 e que levou outras 15,8 mil à Vila de Natal este ano no fim de semana de estreia.

Seguramente somos a segunda melhor opção para o Natal no Brasil, dito pelo mercado, isso já é bastante coisa, e queremos consolidar essa condição – define o presidente do Parque Vila Germânica e secretário de Turismo e Lazer, Ricardo Stodieck.

Desta forma, muitas pessoas indiretamente dependem da Oktoberfest para sobreviver. Maria Gessir Ribeiro, 47 anos, responsável pelas mais de 500 peças que compõem o figurino das celebrações natalinas, é uma delas. Os detalhes precisam passar pelo crivo da senhora que é um dos principais nomes por trás dos desfiles do Magia de Natal. Toda a alegria que ela proporciona, para os outros e si mesma, e o emprego dela são garantidos graças a um pedaço da Oktober.

Continua depois da publicidade

– É um cansaço muito grande, porque leva um ano inteiro de dedicação, lavando as peças uma por uma. É quase um trabalho artesanal e, quando eu vejo o sorriso das pessoas e a satisfação durante os desfiles, sempre choro. É a valorização do meu trabalho – relata a funcionária da Associação Blumenauense de Turismo, Eventos e Cultura (Ablutec), que é financiada pelo lucro da festa.

Investimentos também bancam ações gratuitas

Outra prioridade que direciona os investimentos do lucro da Oktober é a oferta de mais eventos gratuitos aos blumenauenses. Nessa conta entram novas ações como a Osterdorf (a Vila de Páscoa), criada em 2013, e o Blumenau a Bordo, idealizado ano passado e que este mês chega à terceira edição com atrações náuticas gratuitas no Rio Itajaí-Açu.

Especialista diz que autonomia favorece visão empresarial

As mudanças na virada dos 30 anos que fizeram a Oktoberfest mais lucrativa e com uma identidade madura são fruto também de uma visão mais empresarial da gestão da festa. O fato de a Vila Germânica não ser tão enraizada na gestão pública e ter mais autonomia na tomada de decisão, dependendo menos de consulta às leis, ao prefeito e à Câmara de Vereadores, é o fator que favorece a visão empreendedora na gestão da Oktoberfest, avalia o economista e professor da Furb Bruno Thiago Tomio.

Mais do que otimizar recursos e gerenciar custos, a Oktoberfest este ano abriu as portas de vez para o patrocínio – seis empresas apoiadoras, contra duas em 2016, surgidas justamente pelo aumento da força da festa. Tomio alerta que o ponto de atenção da interação entre poder público e empresas é que muitas vezes a relação se dá por interesses exclusivamente privados:

Continua depois da publicidade

– Esse é o grande x da questão: como você vai inserir essas parcerias sem destinar benefícios específicos para as empresas. É o ponto fundamental do empreendedorismo do setor público. Esse formato da Oktoberfest cumpre isso, atende ao interesse público, gera benefício de lazer para a população quase sem exclusão, as marcas que patrocinam ganham em seu setor e o poder público consegue um resultado financeiro positivo para a festa.

Se houve um tempo em que lucrar com a Oktoberfest era considerado detalhe, hoje esse objetivo é admitido abertamente, desde que não comprometa a qualidade da festa e não a encareça para a população. A caminhada para isso começou com a correção dos valores dos ingressos e novas parcerias comerciais na alimentação e na bebida, que aumentaram as opções no cardápio para diferentes paladares.

Tudo isso fez com que, mesmo com uma portaria que em 2013 passou a limitar a capacidade de pessoas simultaneamente na Vila Germânica em 40,7 mil pessoas, a festa tivesse aumento de público – 6% a mais neste ano no comparativo com 2016 –, de consumo e de força da marca. Junte a isso uma crise que mudou planos de turistas, que preferiram gastar seus reais por aqui do que trocá-los por dólares, e tenha como resultado final a escalada de crescimento do lucro da festa. O que vem pela frente? A meta é alcançar um público de até 700 mil pessoas, com mais distribuição de visitantes nos dias de semana, entre segunda e quinta-feira.