Problemas na legislação e má gestão de empresas são apontadas como as principais causas para o atraso de obras públicas em Santa Catarina.
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Escalado pelo governador Raimundo Colombo para falar sobre a demora nas entregas, após as notícias a respeito da construtora Espaço Aberto (responsável pelas obras de restauração da Ponte Hercílio Luz) virem à tona, Cobalchini reafirma a possibilidade de rescisão de contrato com empresas que não cumprirem cronogramas.
Veja infográfico com todas as obras em atraso
Diário Catarinense – Como empresas com históricos de atrasos seguem vencendo licitações?
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Valdir Cobalchini – A legislação é falha. Quando se trata de obras é o menor preço, não é questão técnica. Você não pode escolher a melhor empresa, vai ter de escolher o menor preço. Acho que a legislação precisa avançar neste sentido.
DC – A fiscalização dessas obras não pode ser mais forte?
Cobalchini – Você admite atraso em função de um fator que surja depois da assinatura do contrato, durante a execução da obra. Por exemplo, um fenômeno climático, hipótese em que tem de haver aditivo para consertar um projeto. Afora isso, quando é culpa do executor, acho que o Estado não pode ser tolerante. Tem de usar os mecanismos previstos em contrato, notificar do atraso, multa, rescisão. Mas devido à legislação, que prevê muita judicialização, você acaba tendo atraso até mesmo antes do início da obra. Muitos recursos são previstos, administrativos, judiciais, que acabam demorando meses até um desfecho. Algumas empresas oferecem desconto de 20%, 30% e depois acabam abandonando ou forçando aditivos. Não estou me referindo especificamente a esta (Espaço Aberto).
DC – A fiscalização não percebe?
Cobalchini – A fiscalização tem agido com rigor, mas a legislação é branda. Mudamos em algumas coisas também. O Estado contratava uma empresa para fazer a supervisão da obra, para fazer o acompanhamento e pagava mensalmente. Não pagamos mais assim porque, quanto mais demorasse a obra, mais a empresa receberia. Agora nós estamos fazendo por percentual da obra, passou a não ser mais interessante a demora. Não temos sido tolerantes. Tanto é verdade que no caso específico dessa, eu próprio, em reunião com o governador e com outros secretários, disse que a gente não podia mais ficar se enganando. Temos sido muito rigorosos, seja com essa, seja com outras. Temos ingressado em juízo contra empresas por atrasos, por má qualidade. Temos outros problemas em Santa Catarina.
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DC – Há muitas construtoras com atraso nas obras?
Cobalchini – Ah, tem, tem. Por exemplo, tivemos concorrências internacionais e há duas empresas de Portugal executando obras, e elas não estão andando como deveriam. Também tem outras catarinenses que deveriam ser banidas, porque as obras que elas executam são obras com problemas.
DC – Mas há muitas empresas que atrasam a obra com má fé?
Cobalchini – A obra, quanto mais rápida for executada, mais lucro a empresa vai ter. Ao contrário disso, há incapacidade técnica e má gestão ou falta dela. Se a legislação for aperfeiçoada, não haverá mais espaço para esse tipo de empresa porque acaba não sendo um bom negócio. Quando atrasa de forma indefinida, ela acaba perdendo também. É ruim para o Estado, para a sociedade, mas é também ruim para a empresa.
DC – Mas receber correção a cada ano de atraso ou receber aditivos também é uma forma de lucrar e podem existir empresas de olho nisso?
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Cobalchini – O Estado está sendo muito rigoroso, não está concedendo aditivo. O Estado vai deferir aditivo quando está muito claro, quando há mudança de objeto no curso da obra. A empresa que tem essa estratégia vai dar com os burros na água. Não acontece mais. Há alguns anos essas empresas não apareciam. Mas hoje não tem chance porque o Estado não permite mais esse tipo de coisa. Se tiver de rescindir contrato, o Estado vai rescindir, não tenha dúvida.
DC – Em que casos os aditivos não são mais permitidos?
Cobalchini – Quando não é uma situação técnica, em que for comprovadamente necessária a mudança. Afora isso, a regra é não conceder o aditivo. Os aditivos são de obras que não estavam previstas no projeto, ou depois no curso da obra, ou por vontade do Estado. São situações como a última da ponte (Hercílio Luz). E, às vezes, o reflexo dessas mudanças não é financeiro, às vezes não custa nada e até barateia.
DC – Quem decide isso?
Cobalchini – Quando a construtora pede, a empresa supervisora também vai ter de justificar esse aditivo. Aí vai para o grupo gestor para ver se há fonte de pagamento, se está na programação financeira da secretaria, se tem saldo contratual para fazer antes de aprovar. E ainda antes disso há um comitê dentro do governo que analisa os aditivos. Secretaria de Administração e da Casa Civil analisam questões técnicas e legais, o contrato, o projeto. Esse comitê foi criado no atual governo. Tudo isso para dificultar. Hoje, para passar um aditivo é muito difícil. As empresas têm diminuído muito os pedidos, tanto que as obras do novo acesso ao aeroporto e da SC-403 não têm aditivos. Em torno de 50% do custo com aditivos, se não mais, já foram reduzidos com essa peneira.
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DC – E os atrasos que continuam, o que os justifica?
Cobalchini – Má gestão. Aí não tem o que se fazer. A empresa tem os dias contados, ela vai quebrar.
DC – Mas até que isso aconteça, ela tem de entregar uma obra ao Estado. Como se cobra isso?
Cobalchini – Ou a empresa abandona ou entrega a obra. Não tem tido problema em relação a isso. Ela atrasa, mas vai entregar. E quando você vê que ela não tem condições de entregar faz rescisão do contrato. Não há mais hoje uma obra que se arraste de forma indefinida, sem que o Estado tome providências.
DC – Mas e a ponte?
Cobalchini – Estamos aguardando a entrega do novo cronograma, na quarta (amanhã), para decidir o que fazer. O governador não descarta romper o contrato e já disse isso.
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DC – E as obras de acesso ao aeroporto? A Espaço Aberto retirou o corpo técnico do canteiro de obras há quatro meses.
Cobalchini – No acesso ao aeroporto teve um outro problema, não exclusivo da empresa. Tivemos uma licença ambiental que era impossível executarmos sem desapropriar mais de 100 residências. Pelo custo e porque os moradores do Santos Dumont (loteamento) se mobilizaram. Nós íamos dividir um bairro ao meio. O custo seria maior que a obra. Então não posso culpar a empresa.
DC – Mas ela poderia adiantar outros serviço. O engenheiro que fiscaliza a obra afirmou isso.
Cobalchini – Sim. Tem ali um trecho mais próximo ao novo terminal que poderia ter sido atacado. Há sim problemas decorrentes da gestão da obra e há outros problemas, como o terreno da UFSC que foi permutado e só foi liberado agora. Antes disso não havia como cobrar a empresa.
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DC – Mas isso foi há 30 dias. A obra não deveria estar andando?
Cobalchini – Se tirar todos esses problemas, a empresa poderia sim estar ali. O Estado tem feito a sua parte, tem cobrado. Notificou a voltar a trabalhar. Pediu novo cronograma, apresentado na semana passada, e começamos a analisar. Se for o caso, a rescisão vai ser o caminho. E não estou falando só dessas três obras. Eu podia fazer um relatório de quantos problemas temos.
DC – De que forma o Estado pretende fiscalizar as empresas que continuam atrasando obras?
Cobalchini – O Estado está sendo rigoroso. Eu te garanto que a Espaço Aberto não está tendo lucro. Ela e outras que não trabalham, não medem, não entregam a obra. Cada vez menos empresas vão participar de licitação contando que o Estado vai ser uma mãe. O Estado não pode ser uma mãe, generoso, complacente, fazer de conta que não está vendo. Tem de exercer papel fiscalizador, cobrador, monitorar, impor metas.