Desembargador e chefe do Judiciário em Santa Catarina, Cláudio Barreto Dutra diz que redução de repasses implicaria em corte de serviços prestados pelo TJ-SC à população do Estado e avalia que a falta de investimento em áreas como Saúde e Educação é um problema de gestão do Executivo.

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Diário Catarinense – O senhor considera a possibilidade de rediscutir os valores de repasses?

Cláudio Barreto Dutra – Não. O tribunal de Justiça vê de uma forma absolutamente inviável a rediscussão da redução do orçamento. Porque todo nosso comprometimento está em cima exatamente dos compromissos que o tribunal tem com a sociedade. Não pretendemos transigir no percentual que está mantido hoje em dia. Estou sendo sincero. Não sou político e não vou fazer média. Não pretendemos discutir redução do duodécimo de forma nenhuma. Podemos até conversar com os poderes e explicar nossa atitude, mas o tribunal não abre mão do percentual do orçamento pré-fixado.

DC – Mas e quanto os investimentos do executivo em áreas essenciais como saúde, educação e segurança? Não existe a possibilidade do TJ abrir mão de sua fatia para que haja recursos para essas áreas?

Dutra – Essa áreas todas são fundamentais para a população. Agora, isso não implica necessariamente que os recursos para esses investimentos tenham de ser tirados dos outros poderes. O problema, na minha visão, é de administração de recursos. Como nós temos que administrar nossos recursos para poder manter o Judiciário, o Executivo deve ter suas formas próprias de arrecadação e gestão. Educação, saúde, segurança e outras obras são importantes, mas isso não significa que sua realização deva ser às custas dos recursos dos outros poderes. Todo orçamento do Judiciário já está comprometido e planejado. Eu não acredito que a Assembleia Legislativa tome essa atitude de diminuição. Mas se isso acontecer, teremos que reduzir drasticamente a prestação de serviço, inclusive fechando inúmeras unidades e programas relacionados à família, com adolescentes, com execução penal.

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DC – Se for determinada uma redução, quais as áreas vão ter impacto no curto e no longo prazo?

Dutra – Nós temos instaladas inúmeras comarcas. E algumas até de arrecadação de impostos, como Varas da Fazenda. Nós vamos ter que, lamentavelmente, se isso ocorrer, fechar várias delas. Câmara Regional de Chapecó, unidades de atendimento à criança e adolescentes – que o CNJ tem como meta-, unidades fazendárias e uma série de outras unidades em prejuízo da própria população. Porque nós não teríamos como tirar os recursos que já estão todos comprometidos anteriormente.

DC – Hoje o Tribunal de Justiça tem três fontes de recursos: os repasses do Executivo, o Fundo de Reaparelhamento do Judiciário e o Sidejud (Sistema Depósitos Judiciais). O repasse do Estado seria mais para pagar a folha dos funcionários?

Dutra – Exatamente. Praticamente toda comprometida.

DC – E o que sobra das outras duas fontes de recurso? Não daria para garantir a continuidade dos trabalhos?

Dutra – Não, porque são recursos pré-determinados de fundos. E aí vem a Lei de Responsabilidade Fiscal, que não permite realocação de recursos já pré-estabelecidos. Aqueles recursos lá são destinados exclusivamente à manutenção material do Tribunal de Justiça. Então nós não poderíamos desviar recursos daquela área para outras áreas, inclusive para folha de pagamento. Ela é separada das demais. Então nós não teríamos como repassar esse recursos que tem uma fixação já definida pela Constituição para outros investimentos.

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DC – Uma outra forma de dar suporte ao Executivo seria se comprometer com investimentos. No caso do Judiciário, seria a Defensoria Pública ou o sistema penitenciário, por exemplo. O TJ concordaria com esse tipo de modelo?

Dutra – Nós já fazemos repasses. Por exemplo, uma parte é destinada à Execução Penal e à antiga defensoria dativa, que era feita pela OAB. Isso já é feito. O tribunal já adota uma parte de seu orçamento para esses fins. Para outros investimentos, há uma proibição legal de que se desviem recursos disso para aquelas outras determinadas áreas. Não temos como fazer isso diante da Lei de Responsabilidade Fiscal, mesmo que seja para uma contribuição válida e legítima.

DC – Quanto à defensoria dativa, ela foi extinta e passou a existir apenas a Defensoria Pública. Na época, se falou em um empréstimo do TJ ao Executivo para pagar algumas dívidas que ainda existiam do modelo antigo. Por que não aconteceu esse empréstimo?

Dutra – Porque eles queriam parte do Fundo de Reaparelhamento, que tem uma destinação específica. Ele não pode ser alocado para questões pessoais. Além do mais, há uma grande confusão que se procura estabelecer, acho até que propositadamente. A Defensoria Pública é uma instituição do Poder Executivo e não do Poder Judiciário. Ela está diretamente ligada ao Judiciário, assim como o Ministério Público e a OAB, mas ela não é uma atividade do Poder. É do Executivo, em prol da população. E esses recursos devem vir necessariamente do Executivo.

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DC – Em 2011 houve uma discussão bem maior sobre os duodécimos onde ficou estabelecido alguns percentuais que vem sendo seguidos e estão previstos para 2014. De lá para cá, o orçamento do Estado aumentou ano a ano, assim como os repasses. O gasto do Judiciário também aumenta no mesmo ritmo?

Dutra – Aumenta. Aumenta um pouquinho. Todos os anos. A folha de pagamento aumenta em razão das próprias determinações constitucionais, pelas reposições anuais e os aumentos salarias necessários. Na medida em que vai se desenvolvendo (o Estado), as obrigações também vão aumentando. Então, na medida em que a arrecadação aumenta, também aumenta as necessidades de pagamento. Por exemplo, da folha de pagamento, com todos esses direitos decorrentes da Constituição e que nós temos que arcar. Nós não podemos dizer aos servidores: “Não, a partir de hoje, como temos que emprestar dinheiro ao Executivo, nós não podemos pagar os vencimentos”. Geraria, inclusive, uma conturbação de ordem social. Nós temos 503 magistrados, 5.982 servidores efetivos, 503 exclusivamente comissionados. Isso compromete 99,33% do duodécimo.