A denúncia feita pelo Fantástico de que pelo menos dois pacientes do Hospital e Maternidade Marieta Konder Bornhausen em Itajaí, Litoral Norte de SC, receberam implante vencido no coração durante cirurgias cardídacas levou o Ministério Público e o Conselho Regional de Medicina do Estado de Santa Catarina (Cremesc) a anunciar investigações sobre o caso na tarde desta segunda-feira. O hospital instaurou sindicância para apurar o uso de stents fora do prazo de validade assim que foi procurado pela reportagem da RBS TV.
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Uma ex-funcionária de uma fornecedora de implantes do Rio de Janeiro revelou ao Fantástico que distribuidores oferecem comissões maiores aos médicos à medida que a data de vencimento do produto se aproxima. A ex-vendedora denunciou que pacientes operados no Marieta foram vítimas do esquema. A mulher apresentou cópias de e-mails e planilhas da empresa contendo nomes de pacientes. A lista foi entregue pela reportagem do Fantástico ao hospital e deu origem à sindicância que confirmou o uso dos implantes vencidos em dois pacientes.
A promotora substituta da 13ª Promotoria de Justiça de Itajaí, Sandra Faitlowicz Sachs, informou por telefone nesta segunda-feira que vai abrir inquérito civil o mais rápido possível.
– Caso a denúncia seja comprovada, o próximo passo é instaurar a ação civil pública, que é a investigação judicial – explica Sandra.
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O delegado regional do Cremesc em Itajaí, Delmo Dumke, disse que apesar de o órgão estar em recesso até 27 de janeiro, sempre há um conselheiro de plantão e que a sindicância deve ser instaurada nos próximos dias.
– Se a sindicância comprovar que houve irregularidade médica, será aberto processo ético profissional – afirma Delmo.
O delegado regional esclarece que, em caso de comprovação, a punição para o médico pode ser desde uma advertência sigilosa até a cassação do registro profissional.
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– Ao fim do processo os conselheiros votam em plenário na punição que eles consideram que o profissional está sujeito, de acordo com a gravidade do caso – esclarece Delmo.
O vice-presidente do Cremesc, Antônio Silveira Sbissa, reiterou que o órgão de fiscalização da ética médica vai iniciar a sindicância “o mais rápido possível, devido ao vulto que a história tomou”. Conforme Antônio, o delegado regional será encarregado de conversar com o diretor-técnico do Marieta o quanto antes para pedir as informações já apuradas pela sindicância do hospital.
– Se a sindicância trouxer indícios importantes de tudo o que foi apresentado, é seguro que o processo será aberto – afirma.
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O vice-presidente do Cremesc, que também é cardiologista, disse esperar que a denúncia seja uma exceção:
– Espero com muita intensidade que não haja essa possibilidade em outros locais.
Paciente deve pedir uma segunda opinião
Conforme Antônio, a pessoa mais importante na indicação de um cirurgião cardiologista é o médico do paciente (cardiologista clínico). O ideal, segundo ele, é que o médico seja da confiança do paciente para que ele também possa indicar um profissional conhecido e idôneo para fazer a cirurgia.
O vice-presidente do Cremesc recomenda que no caso de dúvida por parte do paciente ao ser informado da necessidade de uma intervenção cirúrgica, ele deve sempre consultar uma segunda opinião.
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Cirurgiões foram afastados judicialmente em 2013
Em outubro de 2013 três cirurgiões cardiovasculares do Hospital e Maternidade Marieta Konder Bornhausen foram afastados judicialmente dos atendimentos e procedimentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A decisão foi tomada com base na alta taxa de mortalidade dos pacientes submetidos a cirurgias pela equipe médica.
A análise do prontuário de 49 pacientes pelas Comissões de Ética e Sindicância do próprio hospital concluiu na época que a taxa de mortalidade era de 34,7%, quando o ideal seria entre 4,5% e 8%. Além disso, a equipe médica também era suspeita de submeter pacientes a cirurgias de alto risco sem a necessidade. A reportagem do Sol Diário consultou o processo no site do Tribunal de Justiça (TJ), mas ainda não saiu a sentença.
Contraponto
Por meio de nota divulgada à imprensa o Hospital e Maternidade Marieta Konder Bornhausen informa que após denúncia verificou que em 2008 houve dois casos de stents vencidos usados em pacientes da cardiologia. Conforme a casa de saúde, os implantes estariam entre cinco e sete dias fora do prazo de vencimento. O hospital enfatiza que ambos os pacientes passam bem e “não apresentaram nenhuma intercorrência após a realização dos procedimentos, tendo sido atingido o objetivo desejado, com evolução pós cirúrgica dentro dos padrões normais”.
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Segundo o Marieta, nos últimos anos foram implantados sistemas de controle de materiais e procedimentos para evitar a ocorrência de situações semelhantes.
– Implantamos desde 2013 várias barreiras para que ocorrências desse tipo não aconteçam. Hoje nós temos toda a segurança relacionada a qualquer ocorrência de fatos que venham a prejudicar o paciente. Temos 100% de controle dessas ocorrências – afirmou a assessora jurídica do hospital Zilda Bueno em entrevista à RBS TV.
O hospital também negou envolvimento com o uso dos implantes vencidos, dizendo que “jamais adotou as práticas apontadas na denúncia, nem tampouco pactua com tais fatos e continuará realizando as investigações para identificação de motivos que levaram à implantação dos referidos materiais”.
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Na entrevista à RBS TV, Zilda relatou que a partir do momento que a reportagem do Fantástico forneceu a lista de pacientes que teriam recebido o implante vencido, imediatamente se iniciou uma investigação interna:
– Infelizmente detectamos que em dois pacientes foi feita a implantação do stent vencido. Fizemos a avaliação, consultamos os cardiologistas clínicos que tratam destes pacientes e solicitamos um relatório para saber o estado clínico em que eles se encontravam.
A assessora jurídica também informou que após a comprovação da denúncia, os pacientes foram chamados e passaram a ser acompanhados por médicos clínicos. Segundo Zilda, a documentação sobre o caso já foi encaminhada à Vigilância Sanitária.
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