A fiscalização da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Santa Catarina (SRTE/SC) flagrou mais uma situação de trabalho escravo no Sul do Estado. O flagrante aconteceu em uma plantação de fumo em Grão Pará, onde cinco trabalhadores, que moravam em um paiol em condições precárias há dois meses, foram resgatados. Um deles era menor de idade, o que é proibido por lei na indústria do fumo pelo risco de entorpecimento durante a colheita.

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O Ministério do Trabalho preservou a identidade dos empregadores e dos trabalhadores, assim como nos casos de Criciúma e Sombrio, no fim de outubro.

As imagens, registradas por auditores fiscais do MT no flagrante feito na segunda-feira, 17, foram divulgadas nesta quinta-feira, quando os trabalhadores receberam o pagamento com direito a férias, 13º salário, do empregador, e as vias de seguro-desemprego de resgatado do Governo do Estado.

Nas imagens, um esgoto a céu aberto aparece no terreno onde fica uma casa velha, cheia de frestas, entre outras condições precárias. Nos dois cômodos, havia sete camas, um fogão e um botijão de gás, além de roupas espalhadas e muita sujeira. Um banheiro improvisado ficava do lado de fora, distante do paiol.

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De acordo com a coordenadora de fiscalização do trabalho rural do SRTE/SC, Lilian Carlota Rezende, os trabalhadores são naturais de Urubici, na Serra de SC, e ficariam ao menos mais um mês na lavoura de Grão Pará. A situação se agravou em função de um deles ser menor de idade, o que é proibido por lei na indústria do fumo devido à pigmentação com que os trabalhadores entram em contato durante a colheita e oferece risco de entorpecimento.

Além das condições sub-humanas de moradia, Lilian aponta que os trabalhadores não usavam equipamento de proteção para trabalhar, não tinham vínculo empregatício, registro na carteira de trabalho, recibos de salário ou comprovantes de recolhimento do FGTS.

– A parte mais triste da questão do resgate do trabalho escravo é que o próprio empregado não tem noção da condição, ele não acredita que é um cidadão com direitos a uma condição digna. Ele mesmo acaba não contribuindo – lamenta Lilian.

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O dono da plantação foi multado em mais de R$ 100 mil e deve responder na Justiça, assim como a indústria que compra fumo da lavoura irregular, também responsabilizada.

Desde 2012, o Ministério do Trabalho faz fiscalizações nas plantações de fumo e batata da região. O trabalho, que antes era feito por pessoas da família dos agricultores, passou a contar com empregados contratados de forma irregular. A fiscalização é constante e deve ser intensificada até janeiro, quando termina a colheita de fumo. A mudança na regulamentação de 2014 é para as indústrias de fumo, que compram dos produtores irregulares e também estão sendo multadas.

Outros flagrantes

No final de outubro, a fiscalização da SRTE/SC, junto à Polícia Federal, flagrou 17 pessoas em condições de trabalho escravo em uma plantação de batata em Criciúma e 20 paraguaios irregulares em uma plantação de fumo em Sombrio.

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Segundo Lilian, o agricultor da lavoura de batatas de Criciúma deve responder por aliciação, sonegação de informações ao governo e trabalho escravo e pagar cerca de R$ 200 mil em multas.

O principal problema dos 20 paraguaios que foram flagrados trabalhando irregularmente em Sombrio, no Extremo Sul, é a documentação. Os estrangeiros entraram como turistas no Brasil.

A Polícia Federal e o Ministério do Trabalho fiscalizaram a situação dos estrangeiros, que foram notificados com uma multa de cerca R$ 160 cada um e receberam um prazo de oito dias para deixar o país, sob pena de deportação. O empregador foi noticiado com uma multa de R$ 2.500 por funcionário.

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:: Leia a entrevista com a coordenadora de fiscalização do trabalho rural do SRTE/SC, Lilian Carlota Rezende, sobre a situação de trabalho escravo em SC.

Diário Catarinense – Que tipo de auxílio esses trabalhadores recebem agora?

Lilian Carlota Rezende – O Governo Federal para o seguro-desemprego a eles por três meses. O que a gente espera, até porque há condições de que isso aconteça, é de que esses produtores arrumem o alojamento, para estar de acordo a lei, para estar digno, arrumem a frente de trabalha para estar de acordo com a lei. E que eles continuem a contratar essas mesmas pessoas, mas em condições dignas.

DC – Existe algum trabalho de conscientização, tanto com os trabalhadores como com os empregadores, para evitar esse tipo de situação?

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Lilian – Infelizmente o Governo do Estado de Santa Catarina tem sido muito omisso. A Ideli Salvati é presidente da Comissão de Direitos Humanos e preside a Comissão Nacional de Trabalho Escravo, vários estados do Brasil já tem comissões estaduais de combate ao trabalho escravo. Nós já temos computados 50 resgates nos últimos cinco anos, mas continuamos encontrando no Governo negação de que essa situação existe. O Governo não se interessa em trabalhar conosco para combater essa situação de outras formas.

DC – Há mais registros no Sul de Santa Catarina?

Lilian – O que acontece é que o Sul não tinha muita produção agrícola. Tinha muita economia familiar. Só que as famílias diminuíram, os filhos estão saindo do meio rural. Os meios de produção estão fazendo com que se produza mais no mesmo pedaço de terra e, principalmente as lavouras de fumo e batata têm passado essa necessidade de mão de obra. Mas eles não estão tomando o cuidado e o zelo de dar condições para esses trabalhadores. Como dá lucro, a gente já tem encontrado produtores que aumentaram sua produção. Dois produtores do Sul do Estado têm 100 hectares de produção de fumo e contratam 30 trabalhadores para ficar cerca de seis meses na lavoura. Então vemos que a realidade está mudando.

DC – E em Santa Catarina?

Lilian – Em 2009, fomos o terceiro Estado em número de trabalhadores resgatados no Brasil. Isso porque fizemos um resgate com número alto de trabalhadores, eram 159. Mas o número em Santa Catarina ainda é muito grande considerando a condição econômica do Sul, o PIB, a condição cultural. Não justifica, a gente tem condições de fazer diferente. Os produtores que mantém trabalhadores nessas condições o fazem por omissão, por descaso. Informação é fácil obter, ele (o empregador) realmente não vê naquele trabalhador um ser humano, mas alguém com menos direitos.

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