Mais uma grande indústria de Joinville se vê forçada a recorrer à Justiça para tentar evitar a falência e sair da crise. A Duque, tradicional metalúrgica com mais de 50 anos de mercado, anunciou nesta sexta-feira que vai entrar com pedido de recuperação judicial.
Continua depois da publicidade
:: Confira a opinião do colunista Claudio Loetz sobre o caso ::
A decisão foi tomada pelo comando da Duque após sugestão da Corporate Consulting, consultoria paulista especializada em gestão estratégica de negócios contratada para fazer um diagnóstico financeiro da metalúrgica.
Advogados da Corporate trabalhavam para protocolar o pedido ainda nesta sexta-feira, mas a confirmação deve vir apenas na próxima segunda, dia 3. Para ter validade, a medida ainda precisa ser aceita pela Justiça.
-A recuperação judicial é uma ferramenta de alongamento de passivo e uma medida protetora para que se possa implantar ações que recuperem a empresa- explica Ricardo Vastella, diretor da Corporate Consulting.
Continua depois da publicidade
De acordo com Vastella, a alternativa representa uma medida emergencial que já havia sido apontada pelo diagnóstico que a consultoria está fazendo para a Duque, que ainda não está 100% concluído. O documento final será apresentado na quarta-feira.
O material vai continuar apontando quatro medidas essenciais para o salvamento da companhia, conforme “A Notícia” antecipou na edição da última quinta-feira.
Elas incluem o prolongamento do prazo para pagamento das dívidas da metalúrgica – hoje na casa dos R$ 180 milhões -, a injeção imediata de recursos para capital de giro e retomada de produção, a profissionalização da gestão e o enxugamento
do quadro de funcionários.
O presidente da Duque, Mario Hagemann, continua no comando da empresa. Mas, ao que tudo indica, ele deve acatar as recomendações da Corporate e deixar a gestão do negócio, abrindo caminho para Vastella, executivo indicado pela consultoria para administrar o processo de recuperação.
Continua depois da publicidade
-As conversas estão caminhando bem. Nós entendemos que se houvesse algo que impedisse isso, já teria sido discutido-, diz Vastella.
O pedido de recuperação judicial pode alterar o cronograma das ações. A partir de agora, qualquer medida vai depender de aprovação da proposta por parte da Justiça.
-Esta é uma condição importante para que possamos estipular um prazo de reestruturação-, conta o executivo.
Para Sindicato, decisão é tardia
A decisão da Duque não chegou a surpreender o Sindicato dos Mecânicos (Sindmecânicos), que representa os funcionários da metalúrgica. A própria entidade já havia sugerido a medida em reuniões realizadas ainda no ano passado. A direção da empresa, porém, sempre descartou a hipótese.
Continua depois da publicidade
O presidente do Sindmecânicos, Evangelista dos Santos, acredita que o pedido foi tardio. Para ele, a metalúrgica precisou chegar ao “fundo do poço” para tomar qualquer atitude.
-É triste. Parece que a Duque vai seguir o mesmo caminho da Busscar-, lamenta o dirigente.
Nesta sexta-feira, encerrou o prazo solicitado pela empresa para pagar os salários atrasados de novembro do ano passado. Como já era esperado pelo sindicato, o dinheiro não entrou na conta dos funcionários.
De acordo com Ricardo Vastella, diretor da Corporate Consulting, não há prazo para o acerto de contas com os operários. O Sindmecânicos convocou os trabalhadores para uma nova assembleia em frente à empresa nesta segunda-feira, dia 3, às 9 horas. O sindicato vai decidir o que fazer diante da situação.
“Um remédio fantástico”
Com quase 20 anos de experiência na área de perícias judiciais, Rainoldo Uessler tem em Joinville dois casos emblemáticos em sua carreira: é interventor judicial da Cipla e, no final de 2011, foi nomeado administrador judicial do processo de recuperação da Busscar.
Continua depois da publicidade
Para ele, o processo de reestruturação de uma empresa, via recuperação judicial, precisa ser feito no tempo exato, sob pena de não ter o sucesso esperado por sócios e credores.
-O que se precisa levar em conta é que a recuperação judicial é como um remédio em um tratamento. É um remédio fantástico, se aplicado cedo. O problema é que muitas empresas usam a recuperação judicial como um último recurso, quando já não têm ou quase não têm mais condições de sobrevivência-, explica.
Para ele, é importante que a empresa esteja focada em se reerguer, apresentando um plano que seja viável economicamente, que mostre que haverá, de fato, uma adequação de sua gestão e de sua estrutura administrativa.
-Quem decide o destino de uma empresa nesta situação são os credores. Então a empresa tem que se planejar e pensar muito bem em como apresentar um plano viável. O que ela precisa cuidar agora é em não apresentar um plano irreal, fantasioso, sob pena de não ter sua proposta aprovada e ir à falência.
Continua depois da publicidade
Recuperação judicial passo a passo
A recuperação judicial é um recurso utilizado por empresas que enfrentam dificuldades financeiras e não têm capacidade de pagar suas dívidas. O mecanismo foi criado em 2005, em uma tentativa de evitar a falência da companhia aérea Varig, substituindo a antiga concordata.
Atualmente, o caso mais emblemático no Brasil é o das empresas de Eike Batista, cujo grupo está em processo de recuperação judicial desde o fim do ano passado.
-O primeiro passo é protocolar um pedido de recuperação judicial na Justiça. Para a empresa ter seu pedido aceito, é preciso atender a uma série de regras. Entre elas, a companhia não pode ter passado pelo mesmo processo há menos de cinco anos.
-Aceitando o pedido, o juiz responsável pelo caso nomeia um administrador judicial, que faz o levantamento das dívidas e organiza a assembléia-geral dos credores. Paralelo à Justiça, a Corporate pode atuar como representante da Duque.
Continua depois da publicidade
-A partir do momento em que o processo é aceito, a empresa tem 60 dias para apresentar um plano de recuperação judicial aos credores. O plano detalha como a empresa pretende pagar suas dívidas e se reestruturar.
-Com o plano apresentado, os credores têm 30 dias para manifestar à Justiça se concordam ou não com ele. A partir desta data, o juiz pode convocar a assembleia-geral que votará pela aplicação ou não do plano.
-Por lei, os débitos trabalhistas precisam ser quitados até um ano após a homologação do plano. As dívidas com fornecedores, bancos e investidores podem ser acertadas em até 20 anos.
-A assembleia precisa ocorrer em até 180 dias após o início do processo. Neste período, a companhia conta com proteção judicial para propor o plano e fazer a votação.
Continua depois da publicidade
-Caso ela seja aprovada pela maioria dos credores, o administrador judicial acompanha a aplicação do plano durante dois anos, verificando se as medidas propostas estão sendo seguidas.
-Se os credores disserem não ao plano, a empresa pode ter sua falência decretada.