Analfabeta, Madalena Macedo assinou um papel (desistindo da guarda do filho) que abriu um buraco de 31 anos na vida dos dois. O menino nasceu em 1983, em uma cidade no Oeste de Santa Catarina. Mas mãe e filho só se conheceram há apenas um mês, na casa dela, em Joinville. Por anos, Madalena imaginou como estaria o bebê de alguma forma “roubado dela”: se tinha tudo o que precisava, se era menino ou menina. A única certeza era de que o filho estava vivo.
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– Fui para casa com os peitos desse tamanho – mostra ela com as mãos – com o corte da cesárea na barriga e cadê meu filho? – lembra ela.
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Toda vez que via uma mulher com um bebê no colo, Madalena lembrava da sua criança. Datas comemorativas eram dias daquele olhar perdido pela janela que emolduraria o sonho do reencontro. Quando passava alguém pela rua, então… Nesses dias, a saudade apertava e o pensamento de que poderia ser o filho tão esperado a angustiava. A cada nascimento dos netos, ela vivia a reprise da perda e se desesperava. Ficava em pânico com a possibilidade de sofrer a mesma dor de novo.
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– Não leio. Não escrevo. Só assino meu nome – conta.
Sem saber, ela concordou em desistir da maternidade e entregar para adoção a criança que mal conseguiu ver. Quem olhou bem o menino foi a avó. Seu então namorado não quis mesmo assumir a paternidade e era a segunda gestação de Madalena. Ela já era mãe de um menino.
Foi assim que mãe e filho se perderam e experimentaram um pouco do mesmo vazio. Ela casou com Laurindo Prudente um ano depois do desencontro e teve mais um filho, o caçula Daniel, de 29 anos.
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Rodrigo, que não é Macedo e sim Marmentini, passou 31 anos da vida imaginando de onde veio. Sempre soube que era adotado. Na certidão de nascimento dele já constava o nome dos pais adotivos. As histórias que muitos contavam adiou ainda mais o reencontro. Rodrigo sentia raiva. Aos 19 anos, trabalhava em uma loja, na qual viu entrar um rapaz. Ele não sabia, mas era Paulo, seu irmão mais velho que hoje tem 35 anos. Seguindo pistas desencontradas, Paulo procurava um rapaz com deficiência motora, enquanto Rodrigo se fechava à possibilidade de qualquer reencontro.
O filho perdido se casou com Geice, moradora da cidade onde foi tomado dos braços da mãe. Quando a história se desvendou, todos descobriram que pessoas muito próximas eram cúmplices das mentiras que duraram mais de três décadas.
Quando Rodrigo se tornou pai, a vontade de entender seu passado tomou o lugar da raiva.
– Sou um homem, um pai e um amigo totalmente diferente hoje – disse ele, após o reencontro com a mãe biológica.
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Agora, ele reconhece a própria origem, percebe que é parecido com o irmão mais novo e descobriu a quem a filha mais velha, de seis anos, puxou. Ao olhar para Madalena, reconheceu as orelhas arredondadas da menina, para as quais não encontrava nenhuma explicação de parentesco.
A saga da procura pela mãe
Decidido a conhecer seus passado, Rodrigo Marmentini procurou o hospital onde nasceu. Descobriu o nome de Madalena. Mas somente essa informação não seria suficiente para encontrá-la. Na Justiça Eleitoral, ele conseguiu o último endereço em que ela votou.
Conversaram por telefone, ele subiu na moto e viajou para Joinville, saindo de Barão de Cotegipe, cidade que fica no Rio Grande do Sul, onde mora hoje e trabalha como representante comercial.
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Madalena o esperava na varanda em Joinville. Viu uma motocicleta passar direto e sabia que era ele. Foi em direção ao portão. Quando ele desceu, tirou o capacete vindo na direção dela e abriu os braços. A mãe caiu. Chegou a ficar desacordada. Nos quatro dias em que permaneceu hospedado na casa, que também é dele, Madalena e Rodrigo visitaram todos os parentes.
A cada ronco da cuia de chimarrão, mãe e filho experimentavam doses de perdão. As mentiras do passado não fazem mais diferença. O segredo que a mãe e o padrasto de Madalena levaram para o túmulo sobre como tudo aconteceu jaz num passado a sete palmos da terra, como a mágoa.