Dona Cecília Morgado, de 65 anos, uma paulistana que se mudou para o bairro dos Ingleses, em Florianópolis, em 1985, acordou mais cedo nessa sexta-feira. Ela tinha um compromisso inadiável, um reencontro que aguardou ansiosamente por seis anos. Com a ajuda da equipe da Delegacia de Polícia de Pessoas Desaparecidas de Santa Catarina, ela achou seu filho, João Henrique Lopes Morgado, 43, que estava sumido desde 2010. Quando o dia amanhecia, ela e os policiais que acompanharam sua saga estavam lá, a postos no Terminal Rita Maria, para receber o filho da aposentada.

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Nestas horas, observa o delegado responsável pela pasta, Wanderley Redondo, até quem precisa ter uma postura muito séria não consegue deixar de se emocionar. Dona Cecília estava radiante por ver seu filho mais velho novamente. Ele foi achado em um albergue em Guarulhos, São Paulo, com a ajuda da assistência social da prefeitura da cidade paulista.

Segundo Dona Cecília, João, um dia, saiu para fazer panfletagem no Centro de Floripa e não voltou mais. Ela sabia que o filho tinha vontade de conhecer o país, o mundo. Mas o coração apertou. Cinco dias após o sumiço, ela registrou um boletim de ocorrência na delegacia dos Ingleses. Um mês depois, uma carta do primogênito: ele queria sua documentação original. Ela enviou para o endereço em Guarulhos, mas não recebeu novos contatos.

A busca passou a ter o apoio, nos anos seguintes, da Delegacia especializada. Dona Cecília e os outros dois filhos, inclusive, chegaram a realizar exames de DNA, caso algum cadáver sem identificação fosse encontrado.

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— Mas meu coração de mãe não sentia que ele estava morto — disse a mãe.

O trajeto de João

Neste meio tempo, João saiu de Curitiba para Guarulhos, do estado de São Paulo conheceu vários outros estados e parou na Bolívia.

— Eu perdi todos os números de telefone. Eles (a família) também se mudaram de casa no Ingleses, e as cartas voltavam. Aí eu conheci uma mulher na Bolívia e fiquei por lá — relata o filho.

Ano passado ele resolveu voltar ao Brasil. Passou pela fronteira e com a ajuda das assistências sociais das cidades, conseguiu voltar para o albergue em Guarulhos. E foi lá, há dois meses, que a Polícia Civil de SC descobriu seu paradeiro. O primeiro contato de mãe e filho foi por telefone, quando João descobriu que nestes seis anos, além de a mãe ter tido um câncer, perdeu seu pai e suas duas avós. O desafio agora era comprar uma passagem de ônibus para voltar para casa. A equipe da delegacia, inclusive, cogitou até em fazer uma vaquinha para ajudar Dona Cecília. Mas a prefeitura de Guarulhos pagou, e João pode matar a saudade que consumia sua mãezinha.

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— Voltei para ficar. Vou cumprir meu papel de filho mais velho agora que meu pai não está mais aqui — confirmou.

Desafio na DP

Atualmente, 5,5 mil pessoas estão cadastradas como desaparecidas em Santa Catarina. Deste total, avalia o delegado Wanderley Redondo, 800 devem estar realmente sumidas. O grande problema, explica, é que as pessoas são reencontradas e as famílias não comunicam à polícia.

— De 100 boletins de ocorrência, podemos dizer que 99 são encontrados horas ou poucos dias depois, e a polícia não é informada. Na maioria dos casos, os desaparecimentos são problemas de comunicação entre familiares. A pessoa não aparece, não avisa onde foi, é feito um BO, e horas depois, reaparece — observa o delegado.

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Hoje, os dois grandes casos de desaparecidos acompanhados em Santa Catarina são da menina Emili Miranda Anacleto, de Jaraguá do Sul, e do menino Ícaro, de Balneário Camboriú.