A revelação de documento da CIA que atribui ao presidente Ernesto Geisel autorização para execuções de opositores radicais do regime militar, a partir de 1º de abril de 1974, deixou no ar uma pergunta. Afinal, quantos morreram após o suposto diálogo em que o general-presidente endossa o plano de aniquilação de esquerdistas armados no Brasil?
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Relatório da Comissão Nacional da Verdade, que reuniu 4.328 páginas em três volumes, resultado de levantamento feito durante dois anos e meio por pesquisadores e representantes de direitos humanos, constatou que 401 pessoas foram mortas ou desapareceram nos 21 anos de ditadura (1964-1985). O auge foi durante o governo Emílio Médici (1969-1974). Já nos governos Geisel e Figueiredo morreram ou desapareceram 89 pessoas (1/4 do total desde o início do regime).
O documento da CIA fala de execuções autorizadas por Geisel, sucessor de Médici. A grande novidade é que, pela primeira vez, se fala em autorização para execuções dada pessoalmente pelo presidente – e há um certo espanto pelo fato dessa autorização ter sido dada por Geisel, mentor da abertura política “lenta e gradual” no Brasil.
Na realidade, uma análise das mais de 4 mil páginas elaboradas pela Comissão da Verdade mostra que as mortes continuaram durante os governos Geisel e Figueiredo, mas o padrão mudou. O governo Médici dizimou as diversas guerrilhas brasileiras e sua rede de simpatizantes (inclusive muitos que não pegaram em armas). Já na gestão Geisel ocorreram mais assassinatos seletivos. Foi o caso da chacina da Lapa, que em dezembro de 1976 aniquilou a cúpula do Partido Comunista do Brasil (PC do B, maoísta), metralhada em São Paulo. Outro caso célebre foi a morte, em 1975 e sob tortura, do jornalista Vladimir Herzog, que era diretor de jornalismo na TV Cultura e militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB, pró-soviético). Nem ele nem os dirigentes do seu partido pregavam a luta armada, mas morreram nas mãos do regime militar. Assunto até hoje polêmico nas Forças Armadas.
Foi também no governo Geisel que foi aniquilada a Guerrilha do Araguaia, conduzida também pelo PC do B. As últimas missões contra os guerrilheiros foram chefiadas pelo general João Figueiredo – que, anos depois, viria a ser presidente da República.
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Foi também durante os governos Geisel e Figueiredo que bolsões radicais das Forças Armadas planejaram atos terroristas. Um deles foi a sabotagem que matou, em 1976, a estilista Zuzu Angel, celebrizada ao denunciar crimes da ditadura. Grevistas, mesmo sem qualquer ligação com guerrilhas, também foram mortos – é o caso do operário Manoel Fiel Filho, em 1975. Outro foi o atentado a bomba que matou uma secretária da Ordem dos Advogados do Brasil, Lyda Monteiro, em 1980.
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