Quando Sandro Meira Ricci deu o apito final da vitória do Joinville sobre a Chapecoense no domingo, não demorou para o celular de Hemerson Maria tocar com inúmeras manifestações parabenizando pela classificação do JEC à final do Catarinense. Algumas dessas mensagens vieram de um lugar que ocupa um espaço especial na memória do treinador. Do grupo Moleque Bom de Bola no WhatsApp, o comandante recebeu o reconhecimento dos ex-garotos com os quais aprendeu o que é ser técnico de futebol.

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Foi em 1995 que Hemerson Maria deu a Antônio Carlos – município catarinense com cerca de 8 mil habitantes – o título de campeão estadual do Moleque Bom de Bola. O início promissor de carreira é até hoje lembrado com orgulho pelo técnico, que nesta quarta-feira – contra o Comercial/MS, pela Copa do Brasil – completará a expressiva marca de 100 partidas à frente do Tricolor. Vinte e um anos se passaram. Aquela conquista do treinador amador, então com 23 anos, era apenas o rascunho de um currículo que ganharia o quilate de um campeão. Mas, ao contrário do que possa parecer, nem tudo mudou.

– Só o que mudou nele foi a fisionomia, que ficou um pouco mais velha. É a mesma pessoa simples de sempre. Joguei 15 anos profissionalmente e aprendi muito com ele. Desde aquela época, era muito detalhista. Sempre falou para nunca desistirmos das coisas, dentro e fora de campo, para sempre lutar até o final, independentemente das situações adversas – resume o meia Éder, atleta campeão com o time de Antônio Carlos em 1995.

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Na foto, Hemerson Maria é o segundo da direita para a esquerda (Foto Ari Martendal / Acervo Pessoal)

Foi por um acaso do destino que Hemerson Maria virou técnico de futebol, mas os resultados que colheu ao longo da carreira não podem ser creditados à sorte. Quem conhece muito bem esta trajetória é o olheiro e consultor de futebol Jaime Farias. Diretor de escolinhas do Inter (RS) na região da Capital na década de 1990, o caminho de Jaime se cruzou com o de Hemerson em um ônibus de linha. Após ser informado pelo Figueirense que não seria profissionalizado como atleta, o futuro treinador disse ao amigo, no ônibus, que não sabia o que iria fazer. Aí pintou o convite para trabalhar em uma das escolinhas. O resultado foi o bicampeonato (1995 e 1996) do Moleque Bom de Bola com a equipe da Grande Florianópolis.

– Por mais que a gente imaginasse, não tinha ideia de que ele se tornaria este grande treinador. Mas a gente sempre soube que, como profissional, como caráter, é nota mil. Ele dorme e acorda com futebol. Ele conhece cada jogador do time adversário, como pisa no chão, como anda – conta Jaime, responsável por dar as primeiras dicas na profissão ao futuro técnico.

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O desfecho dessa história todo mundo conhece. Hemerson Maria trabalhou durante anos na base do Figueirense, antes de ser campeão no Avaí e no Joinville.

Um currículo tão vitorioso e uma identificação tão grande pelos clubes em que trabalhou que deixam uma certeza: na decisão entre Chapecoense e Joinville, os torcedores do time da Capital não irão apoiar nenhuma das equipes, mas certamente irão torcer por Hemerson Maria.

Hemerson Maria fala sobre os 100 jogos no comando do JEC

Grande sonho

Hemerson Maria já conseguiu o acesso para a Série A, o título da Série B e levou o JEC a três finais de Estadual. Mas ainda há sonhos que motivam o seu trabalho:

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– Conseguir a vaga para a Libertadores. Sempre falo para os meus atletas que a maior verdade do mundo é que se vive para realizar sonhos. Tenho, aqui no Joinville, atletas que não disputaram Libertadores, assim como eu. Para isso, temos que passar por etapas: buscar o Catarinense, buscar o acesso, disputar Série A. Um time como o Joinville sempre parte do princípio de fugir do rebaixamento, depois buscar a zona intermediária e, enfim, esse tão sonhado objetivo.

Modelo de jogo

– Jamais vou fazer Joinville jogar como o Bayern ou Barcelona, mas posso transformar o Joinville em um Atlético de Madrid, um Chelsea. Não falo em termos de títulos, mas em questão de modelos de jogo. Hoje, sou muito realista. No cenário nacional, O Joinville é clube de pequeno para médio e que está buscando o seu espaço. O Joinville não terá os melhores jogadores em termos de qualidade técnica. E quando não se tem isso, tem que ter modelo de jogo bem definido. Em cima disso, fazer eles terem força mental para cumprirem à risca as funções ofensivas e defensivas que esse modelo de jogo exige.

Time da cidade

– O futebol agradável, às vezes, não é feito de uma caneta, de um elástico ou de drible. Você pode fazer um futebol atraente a partir de uma equipe organizada. Se vender essa imagem para o torcedor, ele vai gostar. O JEC é a imagem da cidade de Joinville. E qual é o perfil dos moradores de Joinville? São todos trabalhadores. É uma cidade trabalhadora, feita de pessoas decentes. É essa imagem que a gente quer vender e é essa imagem que o torcedor compra. Às vezes, ele aceita que o time perca o jogo, mas não aceita que seu time baixe a cabeça e aceite a derrota.

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Jogos marcantes

– Em termos de futebol plástico, bonito, que eu gosto de relembrar, foi um jogo que não ganhamos. Empatamos o primeiro jogo de 2014 com o Criciúma em 1 a 1. Aquele jogo, no primeiro tempo, o placar moral era para ser 3 ou 4 a 0. Por incrível que pareça, não vencemos. Ficou bastante marcado por ser minha estreia, em que foi gerada bastante expectativa. Agora, sem sombra de dúvida, o que não sai da minha memória é o jogo do acesso, contra o Sampaio Corrêa, em 2014. Eu fecho os olhos e lembro de tudo. Lembro da viagem, da preleção, do que falei no intervalo, do trajeto do hotel até o campo, da viagem de retorno, da festa aqui.

Lições no JEC

– A lição que aprendi, sem dúvida alguma, é que não tem receita certa para você trabalhar com determinado grupo. O que fiz em 2012, com o Avaí, não serve para trabalhar nesse grupo aqui. Cada grupo, cada jogador tem uma chave e você tem que saber onde vai tocar na chave. Às vezes é com bronca, às vezes é com conversa particular, às vezes é com conversa em grupo ou mostrando um vídeo. Aprendi que as relações humanas são muito mais importantes que o próprio treinamento. Não que o treinamento não seja importante, mas se não tiver elo de confiança, se o atleta não confiar, ele não vai acreditar em você e não terá evolução.

Carreira

A carreira de Hemerson Maria como técnico começou em 1995, quando ele levou o time de Antônio Carlos à conquista do Moleque Bom de Bola. Na foto acima, o treinador – o segundo da direita para a esquerda – está juntamente com os seus comandados em uma cerimônia com o ex-governador de Santa Catarina Paulo Afonso. Mais de duas décadas depois, Maria mantém contato com os jogadores, assim como faz com os atletas com quem trabalhou no Avaí, no Crac-GO e no Red Bull-SC.

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– Atletas de várias gerações falam deste meu perfil didático e da questão humana também. Eu passo essa imagem de ser um profissional capacitado e, ao mesmo tempo, de ser um profisisonal honesto.