A morte da vereadora carioca Marielle Franco (PSOL) foi capaz de gerar comoção dentro e fora do Brasil. O luto e a busca por justiça mobilizaram mulheres e homens em São Paulo, Brasília, Porto Alegre. Em Florianópolis não foi diferente. A razão para essa onda de solidariedade se justifica na identificação das pessoas pelas bandeiras defendidas por Marielle e pela sensação de que a violência deixou de se restringir a núcleos periféricos da sociedade e já não distingue mais cargo, cor, sexo e crença.
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Reunidos nos fundos do Mercado Público, região central da capital de Santa Catarina, a manifestação de quem pensa assim foi diferente das que os moradores da Ilha estão acostumada a presenciar. Sem invadir ruas, mas com faixas e bandeiras em punho, mulheres se uniram para um minuto de silêncio na chamada “Esquina Feminista”. Na ausência dos ruídos, lágrimas e abraços fraternos deram o tom do ato que já havia começado às 17h. “Uma vida inteira de luta”, repetiam enquanto os tambores lembravam as batidas de um coração. “Marielle, presente”, falavam em coro.
Anelise Caetano, 24 anos, cursa Direito na UFSC. Nascida e criada em Florianópolis, e por ser, assim como Marielle, uma mulher negra, ela teme que o desejo de seguir carreira na advocacia seja perigoso.
— A gente sente medo, sente raiva. Um misto de muita coisa, porque pra gente, mulher negra, já é mais difícil. A gente sabe que está na base da pirâmide social, e quando vem uma pessoa, uma de nós que ascende, que vai para uma posição de visibilidade fazer algo por nós, porque ela estava participando do caso da intervenção militar no Rio, acontece uma coisa dessas. É mesmo um misto de sentimentos. A gente consegue se ver na situação porque é uma de nós. É uma dor real — disse.
A coordenadora da marcha Negritude Catarinense, Liliane Santos, 40 anos, pintava uma das muitas faixas que levavam o nome de Marielle. Gaúcha radicada em Florianópolis, Liliane diz que a solidariedade é o sentimento que fala mais alto nesta quinta-feira.
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— É sempre o sangue negro que é derramado. Qualquer pessoa que tem a coragem de levantar a voz para falar de excluído, do povo periférico, é quem sofre primeiro. Ela era uma mulher guerreira. A luta dela é a nossa luta. A luta pela inclusão social, pela inclusão étnico-racial. E a gente sabe o quão difícil é falar sobre isso. O quão difícil é militar sobre isso. Então a gente também é solidário a isso — disse.
Vereador do PSOL em Florianópolis, Marquito também acompanhou as homenagens. Ninguém do partido em SC conseguiu ir até o RJ velar Marielle. Para Marquito, a morte de Marielle foi uma forma de calar sua voz e a do povo que ela defendia e representava.
— Uma mulher da favela, negra, LGBT, que presidia a comissão em defesa da mulher, relatora do acompanhamento da intervenção militar no Rio de Janeiro, que estava sempre denunciando ações que extrapolam nas comunidades e periferias do Rio. A morte dela simboliza esse momento que o Brasil passa, que é uma mulher com aquela coragem e capacidade de articular com a sociedade e ser eleita pelas bandeiras que levanta ser assassinada por diversos tiros, sem explicação. Não tem como dizer que não foi um ato premeditado, que ele está motivado e movido por outras questões — disse, com a voz pausada.
Após uma hora e meia de homenagens na “Esquina Feminista”, o grupo iniciou uma caminhada com destino à Igreja do Rosário. Os lances da escadaria foram ocupados no encerramento do ato, que lembrou que a vida e a luta da vereadora Marielle não foram em vão. Poemas, discursos de apoio e canções ecoaram nas ruas do Centro. Nas mãos de muitas mulheres, as flores e velas acesas foram seguradas no lugar dos cartazes. Foi assim, em meio a palmas e gritos, que Marielle deixou de ser uma para ser milhões. Foi assim, que nesta quinta-feira à noite, Marielle esteve presente em Florianópolis.
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