A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) criada para investigar possíveis irregularidades no Escritório Central de Arrecadação (Ecad) aprovou, nesta quinta-feira, o relatório final. O documento, aprovado de forma simbólica, propõe uma reforma profunda no sistema de cobrança e no pagamento dos direitos autorais, além de pedir o indiciamento de 15 pessoas.
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Após seis meses de investigações, os membros da CPI concluíram que os diretores do Ecad e das associações de músicos e compositores que o compõem cometeram crimes de falsidade ideológica, formação de cartel e apropriação indébita. Os nomes dos acusados e seus respectivos crimes serão encaminhados para o Ministério Público para que eles respondam a processos.
– O relatório aponta para aquilo que o Brasil todo já sabe: que o Ecad é uma grande caixa-preta, uma estrutura burocrática, cara, ineficiente, que alimenta seus dirigentes. São pagos três planos de participação nos resultados diferentes por ano, bônus e mais bônus para os diretores. E os artistas, na ponta, recebem muito pouco – explicou o relator, senador Lindbergh Farias (PT-RJ).
O texto, apresentado pelo senador, em reunião na terça-feira, traz o resultado da investigação parlamentar sobre denúncias de irregularidades no órgão, com recomendações ao Ministério Público aos Poderes Executivo e Legislativo e à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Para regular esse sistema, o relatório da CPI propõe, entre outros pontos, que o Congresso Nacional aprove, em regime de urgência, o projeto de lei que dispõe sobre o Novo Sistema de Gestão Coletiva de Direitos Autorais. O projeto, proposto pela CPI, estabelece normas para o exercício das atividades do Ecad e das associações que cuidam de direitos autorais.
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O texto também prevê que as emissoras de rádio e televisão deverão, a cada trimestre, por meio da internet, disponibilizar planilhas com a relação completa das obras musicais executadas no trimestre anterior. A ideia é facilitar o controle dos direitos autorais.
Lindbergh Farias assinalou que o Ecad representou um avanço na gestão dos direitos autorais quando de sua criação, mas o sistema atual encontra-se obsoleto.
– Espero que com o resultado desse trabalho possamos criar um novo sistema de gestão coletiva de direitos autorais – disse o relator.
O relatório final da CPI também tira do Ministério da Cultura (MinC) e leva para o Ministério da Justiça (MJ) todas as questões relativas à gestão dos direitos autorais no país. Ele recomenda ao Executivo criar o Conselho Nacional de Direitos Autorais (CNDA) e a Secretaria Nacional de Direitos Autorais (SNDA), ambas subordinadas ao Ministério da Justiça.
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Elas teriam competência para regular, mediar conflitos e fiscalizar a gestão coletiva de direitos autorais. A CPI também propõe que o Executivo envie com urgência ao Congresso Nacional projeto para reformar a Lei de Direitos Autorais (Lei 9610/1998).
A expectativa de Lindbergh e do presidente da CPI, senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), é que esse projeto possa ser votado no plenário do Senado ainda este semestre.
– A CPI diagnosticou que este sistema antinacional, que beneficia meia dúzia de produtoras de audiovisuais internacionais, precisa ter uma nova formatação. Com a criação do sistema de regulação, vamos ter um portal da transparência que tenha os vencimentos e o salário dos dirigentes, um sistema de acompanhamento que será fiscalizado por artistas – afirmou Randolfe.
Lindbergh sugeriu, ainda, que após a criação Secretaria Nacional de Direitos Autorais (SNDA) seja examinada pelo órgão a pertinência de criação de uma autarquia autônoma vinculada no âmbito do governo federal para gerir o sistema de arrecadação e distribuição de recursos referentes ao direito autoral de produções artísticas musicais.
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O advogado do Ecad, Rodrigo Fragoso, disse na terça-feira – dia em que o relatório foi apresentado – que as apurações da CPI “ignoraram” o parecer do Ministério Público Federal (MPF), sendo, assim, “levianas”.
Indiciamentos
A CPI do Ecad também propõe indiciamento de 15 pessoas pelos crimes de apropriação indébita de valores, fraude na realização de auditoria, formação de cartel e enriquecimento ilícito. Os nomes serão encaminhados ao Ministério Público Federal e ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, onde fica a sede do Ecad.
Contraponto
Em resposta às recomendações apresentadas ao fim da CPI, o Ecad atualizou a nota publicada na terça-feira no site da entidade. Neste novo pronunciamento, o escritório reitera que “a CPI nada conseguiu provar apesar de ter analisado por mais de seis meses todas as atividades do Ecad dos últimos 10 anos”.
Na resposta, agora atualizada, o escritório afirma que “busca junto ao Judiciário o devido pagamento dos direitos autorais das músicas executadas”, e culpa as emissoras de rádio e de TV como donos dos “maiores índices de inadimplência com a classe artística musical brasileira”.
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Ainda, defende-se afirmando que “é uma entidade privada, sem fins lucrativos que trabalha para garantir que os artistas sejam remunerados pelos direitos autorais por execução pública musical das obras cadastradas em seu banco de dados”, e que o “pano de fundo” da discussão é “meramente econômico”.
Atividades
A CPI foi criada em junho do ano passado para investigar supostas irregularidades praticadas pelo Ecad na arrecadação e na distribuição de recursos oriundos do pagamento referente ao direito autoral de produções artísticas musicais, e as possíveis ocorrências de abuso da ordem econômica e da prática de cartel.
Em quase um ano de trabalho, a CPI, presidida pelo senador Randolfe Rodrigues, realizou 18 reuniões, das quais 11 foram destinadas a oitivas, audiências públicas e diligências para colher o depoimento de artistas, produtores, especialistas, dirigentes e funcionários do Ecad.
Veja a lista de pedidos de indiciamento:
1. José Antônio Perdomo Corrêa (UBC): crime contra ordem econômica, apropriação indébita e falsidade ideológica.
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2. Roberto Correa Mello (ABRAMUS) e José Alves da Silva (AMAR): crime contra ordem econômica, apropriação indébita, falsidade ideológica e violação do dever de lealdade (conflito de interesse).
3. Glória Cristina Rocha Braga Botelho (ECAD): crime contra ordem econômica, apropriação indébita e falsidade ideológica.
4. Marco Venício Mororó de Andrade (AMAR): crime contra ordem econômica e apropriação indébita.
5. Jorge de Souza Costa (SOCINPRO): crime contra ordem econômica, falsidade ideológica e crime de usura.
6. Chrysóstomo Pinheiro de Faria (SICAM): falsidade ideológica.
7. Angela Virginia de Rezende Lopes (ÁTIDA): apropriação indébita.
8. Edmilson Fernandes Machado (ÁTIDA): apropriação indébita.
9. Martha Estefaneli (ÁTIDA): apropriação indébita.
10. Cleide Santini (ÁTIDA): apropriação indébita.
11. José Alves da Silva (AMAR): falsidade ideológica.
12. Kleber da Silva (SBACEM): falsidade ideológica.
13. Maria Cecília Garreta Prats Caniato (ABRAMUS): apropriação indébita.
14. Denis Lobo (Presidente da SBACEM): crime contra ordem econômica.
15. Marcel Camargo de Godoy (Presidente da ASSIM): crime contra ordem econômica.