No dia 7 de setembro, o advogado e adminitrador aposentado Cleacir Ferraz, 59 anos, ergueu sozinho um cartaz de protesto durante o desfile cívico de Florianópolis. E não se intimidou: percorreu toda a Beira-Mar Continental e posicionou-se estrategicamente em frente ao palanque das autoridades, para que seu grito solitário fosse ouvido.

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Não foi a primeira vez. Cidadão brasileiro acima de tudo, Ferraz é um apaixonado pela pátria e acumula quase 40 anos de protestos. Conheça a história dele aqui.

Diário Catarinense – Uma das frases no seu cartaz de 7 de Setembro dizia que para protestar não precisa mascarar. Quem são os mascarados?

Cleacir Ferraz – São todos que se escondem atrás de uma máscara ou de um voto secreto. Quem se esconde é porque não está bem intencionado, seja lá pelo que for. As pessoas verdadeiramente de bem, que lutam por um Brasil mais ético, mais transparente, não têm medo de assumir o que fazem. Tive essa ideia uns dias antes do feriado. É um tema bem em voga e resolvi reforçar.

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DC – E o ‘Sr delegado, não pode me prender, sou di menor’. Muda já legislação?

Ferraz – Dia desses dias ouvi o comandante Araújo Gomes falar sobre um adolescente que já havia sido detido nove vezes e continuava solto. Ele teria dito aos policiais exatamente o que escrevi no cartaz. Isso é inadmissível. Os adolescentes, hoje, sabem muito bem o que fazem e não podem mais ficar sob o manto de uma legislação branda, que acoberta as verdadeiras atrocidades cometida por eles. Isso os estimula. Na França, eles já são punidos a partir dos 13 anos com a metade da pena do adulto. Na Inglaterra, com 10. Na Holanda, com 12. E na Alemanha e Itália, com 14. Por que aqui não pode ser assim?

DC – Qual é o maior problema do Brasil hoje?

Ferraz – O câncer do país é a corrupção. E vou dizer mais: o grande mal disso tudo, o que fomenta essa roubalheira sem fim é o financiamento de campanha. É aí que começa o problema. O dinheiro dado ali, independente de quem vai ganhar a eleição, volta sujo porque os candidatos precisam ajudar quem os ajudou . E a coisa toda perde o controle.

DC – Como isso poderia ser resolvido?

Ferraz – Quando a estrutura da família é fraca, os filhos viram criminosos. Criminosos de rua e criminosos de colarinho. Acho que boa parte da qualidade dos nossos políticos poderia ser corrigida pela educação que vem de casa. Uma vez li um texto do João Ubaldo Ribeiro, que dizia que o Brasil nunca vai mudar enquanto não mudarem as pessoas e suas famílias. É o texto mais lindo que já li na vida. Todo o mal dos políticos, toda a vontade de roubar, está na desestrutura familiar.

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DC – Em quase 40 anos de protestos, o que o senhor já viu mudar?

Ferraz – Estive no meio de muita coisa. As Diretas Já foi a maior de todas. A reforma previdenciária de 1998 também. Tenho certeza que impedi a aprovação da emenda constitucional por alguns votos. Se eu não tivesse enviado as cartas, seria uma avalanche de votos favoráveis.

DC – Qual é a sua maior luta?

Ferraz – Faz 20 anos que luto para tirar a penitenciária da Trindade. Entra governador, sai governador e eu continuo escrevendo, procurando, falando. Uma vez paguei um rapaz para distribuir panfletos no bairro por mim. Sozinho não faço nada. Se a vizinhança tivesse se mexido, cobrado, a prisão não estava mais aqui há 15 anos.

DC – O que o faz levantar do sofá para protestar?

Ferraz – Os políticos têm medo de povo na rua. Ulisses Guimarães já dizia isso. As coisas só não mudam, porque não o povo não se mexe. Eu nunca vou deixar de ir para a rua, porque me sinto cidadão, porque amo o Brasil. Se 10% da população fizesse isso, nós mandaríamos neles. O governo está acomodado e a culpa é nossa. É muito fácil as pessoas se justificarem dizendo que ir para as ruas não adianta nada. Elas precisam entender que adianta sim! Tem que acreditar.

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DC – E você acredita?

Ferraz – Eu acredito muito. Essas mudanças que aconteceram recentemente no país só aconteceram por causa dos protestos de três meses atrás. Estive em quase todos eles nos últimos 40 anos e acompanho de perto tudo o que ocorre na política. Faço o meu papel, porque sou eu quem elejo os políticos e sou eu quem pago o salário deles.

DC – Mas garantir mudanças, às vezes, demora e, às vezes, nem acontece. Você não cansa?

Ferraz – Às vezes me sinto impotente. Eu canso sim, mas a vontade sempre se renova. Acredito em um Brasil correto, justo, ético, numa vontade de mudança. Eu sonho com isso. Volta e meia, eu chego para a minha família e digo: “agora chega, cansei”. Mas na semana seguinte já vejo uma coisa errada e não me aguento. Eu sou assim, é meu jeito. Esse é o Ferraz.