Quando o presidente Ernesto Geisel decretou o fechamento do Congresso Nacional para garantir a vitória nas eleições para governador, o Cleacir estudante de Direito na UFSC e de Administração na Udesc pegou o cartaz e correu para a rua. Estava a 1,6 mil quilômetros de Brasília, mas não poderia deixar passar aquela violação. Era abril de 1977 e o Brasil estava sufocado pela ditadura militar.

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Quase quatro décadas depois, o já aposentado Cleacir acordou cedo no último domingo, vestiu a mesma camisa amarela e o mesmo boné de todos setes de setembro e foi sozinho até a Beira-Mar Continental. O verde-amarelo que pintava a avenida naquela manhã não o acanhou: ele ergueu o cartaz e caminhou até o palanque das autoridades protestando contra as máscaras e a maioridade penal.

São 36 anos que separam aquele jovem idealista de 1977 para o adulto experiente e prestes a completar 60 anos de hoje. Aposentado, com a visão comprometida e os cabelos esbranquiçados, Cleacir Ferraz ainda conserva o mesmo perfil sonhador de tantos anos antes: virou um exemplo do que fazer para mudar a pátria que leva no coração.

Depois daquele 1977, ele voltou às ruas tantas e tantas vezes que já nem se lembra mais. Esteve no Diretas Já e pintou a cara pelo impeachment de Collor. Nos protestos de junho, também marcou presença. Ferraz é um grande sonhador. Fala com paixão e encanta qualquer ouvinte.

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Em casa, guarda pastas com documentos, recortes de jornais, revistas históricas e até o folder com as promessas de campanha de Cesar Souza Junior, prefeito da Capital de SC. Pequenos tesouros particulares, que apelidou de “Assuntos Políticos”. Não adianta tentar fugir: Ferraz adora acompanhar a política federal. Sabe tudo o que ocorre em Brasília. E em época de eleição, não vota sem antes pesquisar profundamente o passado de cada candidato. A quem conhece um por um.

E de tanto acompanhar, ele também aprendeu a reclamar. Envia e-mails, comenta em blogs. E antes da internet, escrevia cartas. Ferraz é daqueles que incomoda mesmo. Mas incomoda porque é cidadão.

Em 1998, não concordou com a mudança na aposentadoria prevista na reforma previdenciária. Então, escreveu cartas para os 513 deputados e para os 81 senadores explicando em detalhes porque a medida do tempo de serviço, se aprovada, não seria boa para a população.

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– Chamei os amigos para um mutirão: enquanto um dobrava, outro colocava dentro do envelope, outro colava. Quase como uma produção de fábrica. No dia seguinte cheguei com duas caixas cheias no correio.

E a proposta não foi aprovada.

E assim Ferraz segue. Sozinho, que seja. No 7 de setembro, ninguém da família, ninguém da cidade o acompanhou. E mesmo assim, ele foi: para lutar pelo que acredita. Mais uma vez.

– Isso está dentro de mim. Enquanto eu tiver forças para brigar contra a corrupção, contra esse jeitinho brasileiro, contra a falta de transparência, contra o apadrinhamento, é assim que vai ser. Com isso, eu nunca vou concordar. Acho que é assim que devemos agir.

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