Na segunda parte da entrevista, o eletricista João Terba dos Santos revela por que seus colegas de acidente tentaram fazer um pacto de silêncio.

Continua depois da publicidade

DC – Esse sistema, com óleo, era adequado?

Santos – Ali era um local fechado, tinha muita poeira, mas o problema não era o óleo…

DC – E o maçarico?

Santos – Não tinha como fazer outra coisa ali sem o maçarico.

Continua depois da publicidade

DC – Era normal usar o liquinho ali?

Santos – Sim, normal!

DC – Era a primeira vez que vocês estavam fazendo um serviço na ponte?

Santos – Esse tipo de serviço a gente fazia constantemente. Nossa equipe tinha anos e anos trabalhando naquilo ali, fizemos vários cursos. Tanto é que a gente pegou todos os diplomas e mostrou ao Ministério Público.

DC – De quanto em quanto tempo tinham de ir à ponte fazer manutenção?

Santos – Quem comandava aquilo ali era a Pirelli. Nós só trabalhávamos com os cabos de média tensão. Ali (na Ponte Colombo Salles) corriam os alimentadores de alta tensão e de baixa tensão, onde a gente estava trabalhando. Estava tudo desligado, eram cabos novos. E deu uma explosão, ninguém sabe por que, nem o que houve…

DC – Estavam usando o maçarico?

Santos – Não sei te dizer, não estava lá na hora. Algum tempo depois, quando conversamos (os cinco técnicos que estavam na ponte), os três disseram que foi uma explosão, mas não deram detalhes. Nunca mais falaram nada.

DC – O senhor viu na hora que era grave?

Santos – Na hora, a gente correu! Quando chegamos lá fora, a fumaça já tinha tomado conta de tudo.

Continua depois da publicidade

DC – O senhor inalou fumaça?

Santos – Não aconteceu nada comigo. E os dois (que pularam) fizeram errado, tinham que ter corrido pela passarela. Mas ficaram tão assustados com a explosão… Achavam que o cabo ia explodir, decidiram pular.

DC – Onde o senhor estava exatamente quando apagou tudo?

Santos – Quando a gente saiu e correu, parou num canto e a fumaça tomou conta de tudo. Automaticamente parou tudo. Escutamos o barulho do alimentador desligando… A partir dali, ficou tudo escuro. Aquela altura, não adiantava mais nada, ninguém podia fazer mais nada, nem nós nem a central. Foi coisa de louco.

DC – E não explodiu?

Santos – Não. O cabo pegou fogo, tem óleo dentro e até queimar leva um tempo. Mas claro que ficaram com medo, lógico, uma linha de transmissão do lado da gente, não tem como não ter medo.

DC – O senhor também sentiu medo?

Santos – Não deu tempo de pensar em nada. Pensamos que poderia explodir.

DC – Até se aposentar, o senhor continuou na mesma função?

Santos – Trabalhei inclusive na recuperação dos cabos, logo depois do incêndio (ainda durante o apagão de 55 horas). Dentro da ponte precisava fazer várias conexões e a gente sabia fazer. Nossa equipe tinha os equipamentos próprios para trabalhar nessas situações.

Continua depois da publicidade

DC – Houve falha humana?

Santos – Não posso dizer. Eles mesmos que estavam lá (fazendo a manutenção no cabo que pegou fogo) disseram que houve explosão.

DC – Houve problema no equipamento?

Santos – Não sei. Ali tinha risco porque o alimentador estava ligado do teu lado e não tinha como desligar porque o alimentador abastecia toda a cidade. Então, esse era sim um risco que a gente estava correndo. Mas não tinha outra opção.

DC – Hoje ainda é assim?

Santos – Não. Ainda na época pegaram esse alimentador de baixa tensão e passaram para a outra ponte. Na Colombo Salles está o alimentador de alta tensão e, na Pedro Ivo, o de média. Agora também jogaram um alimentador submarino que vai até o Campeche. Está tudo interligado.

DC – Tem mais segurança agora?

Santos – Agora dificilmente a Ilha fica sem luz.

DC – O atual sistema é mais seguro?

Santos – O sistema subterrâneo é o futuro.

DC – Pergunto com relação à ponte.

Santos – Debaixo da ponte está tudo fechado com tijolos. Colocaram uma porta, cadeado e placa. Agora, para entrar ali, só com autorização da Celesc. Até para evitar que um desavisado da vida entre ali e faça besteira.

Continua depois da publicidade

DC – O senhor disse que para o senhor nada mudou, mas para os outros quatro a história é um pouco diferente, parece que eles têm receio de falar…

Santos – O Vado (Evaldo Rocha Floriano) saiu, voltou para a iluminação, que já era o setor dele. O Mário (César de Matos) também saiu, foi para a emergência, sai de madrugada e troca poste. Só quem trabalha no subterrâneo da nossa época é o Jacques e o Sydney.

DC – Por que a manutenção da ponte não ocorreu num final de semana?

Santos – Já tínhamos feito algumas conexões e naquele dia a gente ia concluir o trabalho porque a gente tinha pressa…

DC – O senhor mantém contato com a equipe daquela época?

Santos – Conversamos esporadicamente.

DC – Vocês tinham relação pessoal, eram amigos?

Santos – A gente de vez em quando ia na casa um do outro, conhecia a esposa um do outro, a vida de cada um…

Continua depois da publicidade

DC – E por que até hoje não gostam de falar nisso?

Santos – Não sei o que se passa na cabeça deles. Nem mesmo a gente gosta de falar…

DC – Mas o senhor parece que lida melhor com a situação.

Santos – Talvez porque eu estava mais distante da situação, não sofri tanto como os outros três. Se eu estivesse ali, no lugar que pegou fogo, eu teria morrido porque eu não sei nadar. Eles caíram ali, nadaram e se afastaram, mas eu…

DC – Por que vocês não falaram nada naquela época?

Santos – Acharam que era conveniente (não falar) e a gente respeitou.

DC – Quem?

Santos – O sindicato achou conveniente não conversar e a empresa acatou.

DC – Seus amigos brincam com o senhor sobre o episódio?

Santos – Sempre tem uma piadinha, dizem que coloquei fogo na ponte! Mas graças a Deus, passou e tudo deu tudo certo.