– Meu filho, está tudo bem aí?
– Tudo mãe, por quê?
– É que eu vi essa notícia da chuva em São Paulo, fiquei preocupada.
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– Aqui em casa nem está chovendo.
– Filho, está tudo bem aí?
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– Sim, mãe.
– É que eu vi essa notícia do prédio que pegou fogo em São Paulo e…
– É mesmo? Em que bairro? Vou procurar na internet.
– Filho, como estão as coisas?
– Aqui tudo bem, mãe.
– É que eu vi essa notícia do tiroteio na Av. Paulista e…
Mas eu moro longe da Paulista, mãe e…
:: Onze anos
Entre idas e vindas que me fazem morar um pouco em cada um desses estados com nomes de santo, acabo de completar 11 anos de pauliceia.
Não tenho do que reclamar, adoro aquele pedaço de concreto perdido no meio de prédios, shoppings e asfalto. É mesmo uma cidade que pode deixar qualquer um maluco e talvez as vindas a Santa Catarina funcionem como remédio, antídoto e não é à toa que tanta gente que mora em Sampa sonha em viver na terrinha.
Violência urbana? Tem o trânsito, a poluição visual, tudo isso é violento. E 11 anos depois, também são pontos delicados na Ilha. As placas e luminosos espalhados pela cidade, a falta de uma Lei Cidade Limpa, fazem Floripa perder para São Paulo, perder feio. O trânsito é ruim em praticamente toda capital brasileira, mas uma ilha não tem rotas de fuga. Fico assustado com a quantidade de empreendimentos em lugares como a SC-401. Mais ainda quando percebo que existem duas opções de deslocamento: carro próprio e ônibus, e este último é ligado por um sistema confuso e já saturado em determinados horários.
Ficar preso num engarrafamento por aqui não se compara à experiência paulista, seja num automóvel, seja dentro de um ônibus. Aqui se pode ver o mar. Mas quem vê todo dia, esquece que ele existe. Inclui na rotina o mar e o crescimento. Não percebe nem um nem outro.
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Perdi minha carteira três vezes em SP. Uma no ponto de ônibus. Acharam, e uma semana depois ela foi devolvida com tudo dentro. Outra dentro do ônibus, deixei cair e me chamaram quando eu já estava do lado de fora. Outra na rua mesmo, caiu e quem pegou me chamou e devolveu. Vivia contando isso para todo mundo que perguntava sobre a violência. Em 2012 fui roubado à mão armada. Acontece, não passa na TV e as mães nem ficam sabendo.
:: Cinema na praça
Na última edição do Festival Internacional de Cinema de Balneário Camboriú, o CineramaBC, tive a chance de participar de uma sessão na praça. Cerca de 300 pessoas estavam naquela sala de projeção armada à beira do mar, na Praça Almirante Tamandaré. Ao término de cada exibição havia uma conversa sobre o filme. Numa delas, um senhor disse que esse tipo de coisa era comum quando era criança: estar na praça e ver apresentações de circo, teatro. Durante a Mostra Internacional de Cinema de SP são feitas sessões no vão livre do Masp, também com enorme sucesso.
O público é formado por gente que não vê ou desliga a TV naquele dia, para um programa diferente ao ar livre. Uma lembrança de que somos seres livres – como o ar – e que temos o direito de caminhar em avenidas, sem sermos abordados, como nos fazem acreditar esses jornais com notícias sobre violência 24 horas. Que podemos escolher a programação, saindo de casa para ver um filme que não vai passar na TV, nem no shopping.
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