Além do estímulo do parto normal e o esforço para reduzir o número de cesarianas, o país também começa a discutir a violência obstétrica. Não é de hoje que há relatos de mulheres que se sentiram desconfortáveis sobre algo ocorrido no parto. Para evitar violências pelas quais as gestantes e parturientes passam, que envolvem ofensa verbal e física, foi sancionada no início do ano e entrou em vigor em março deste ano a Lei 17.097, contra a violência obstétrica em Santa Catarina.

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De autoria da ex-deputada Angela Albino, a lei obriga a implantação de medidas de informação e proteção à gestante e parturiente. Dentre elas está a elaboração de uma cartilha pela Secretaria de Saúde de SC sobre os direitos da mãe e do bebê e também a exposição de cartazes sobre o tema em hospitais, unidades de saúde e demais locais de atendimento à gestante. O objetivo é conscientizar as grávidas sobre seus direitos.

A doula Gabriela Müller destaca a importância da mulher estar sempre informada. Antes mesmo da hora do parto é necessário avaliar e escolher um obstetra que esteja de acordo com o desejo e a escolha da grávida.

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– É preciso que as mulheres se informem, que façam curso de gestante, que busquem dados sobre os profissionais e que tirem todas as dúvidas antes do parto. Precisam conhecer os riscos das cesarianas, tanto para elas quanto para os bebês. Se não estiverem satisfeitas com o profissional, não precisam ter medo de ir para SUS, por exemplo, e ir em busca de um atendimento qualificado – ressalta.

Para denunciar a violência obstétrica basta ligar para 180, ir até a secretaria de Saúde da cidade, ligar para 136 na Ouvidoria do SUS ou na ouvidoria do hospital.

O QUE É VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA?

Confira algumas violências citadas na Lei 17.097, de 2017:

– Tratar a mulher de forma grosseira, não empática, grosseira, zombeteira

– Recriminar a parturiente por gritar, chorar ou ter dúvidas

– Não ouvir as queixas da mulher

– Fazer a gestante acreditar que precisa de uma cesariana quando não é necessário

– Impedir que seja acompanhada por alguém de sua preferência durante o trabalho de parto- Submeter a mulher a procedimentos dolorosos, desnecessários e humilhantes como lavagem intestinal, raspagem de pelos pubianos e posição ginecológica de pernas abertas

– Deixar de aplicar anestesia quando for requerida- Proceder a episiotomia quando não é imprescindível

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– Fazer qualquer procedimento sem previamente pedir permissão e explicar, com palavras simples, o que está sendo oferecido ou recomendado

– Submeter o bebê saudável a aspiração de rotina e injeções na primeira hora de vida sem antes ter contato com a mãe

– Retirar da mulher o direito de ter o bebê ao seu lado depois do parto no alojamento e de amamentar em livre demanda.

OPINIÃO

¿Que não aconteça com elas o que aconteceu comigo¿

Lucimar dos Santos, 32 anos, doula e mãe de três filhos

¿No primeiro parto eu tinha 15 anos e minha experiência não foi agradável. Apesar de eu ser menor de idade, eles (equipe envolvida no parto) não deixaram ninguém me acompanhar. No parto eu estava sozinha e não soube bem o motivo de ir para uma cesárea, não me explicaram nada. Antes do médico vir com a anestesia, a cada contração eu gritava. Então, com as contrações fortes, já ritmadas, a enfermeira passou e falou: `Na hora de fazer é bom, né? Agora vem aqui gritar.¿

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Como ela começou a me agredir verbalmente, eu tive medo de me expor. Me contraía para não gritar e não ser mais violentada ainda, estava com medo de ela fazer algo pra mim. Até na hora da anestesia, o médico não me explicou o que ia acontecer, então eles mandaram eu me abaixar para aplicar a injeção e eu estava com medo, me mexia toda hora virando para trás. Eles não me explicaram sobre os riscos de me mover durante a aplicação, só brigaram. O bebê nasceu prematuro e eu não consegui ver. Novamente a enfermeira veio e disse: ¿Você sabe o que é?¿ e eu disse que era uma menina, mas ela respondeu: `não querida, eu não coloquei saco no meio das pernas dele. É um menino.¿

O segundo filho eu tive de parto normal, faz só quatro anos. Já era lei o pai acompanhar o parto e meu esposo pôde entrar. Enquanto ele estava comigo, foi tudo certo. Só que teve uma hora em que a enfermeira falou: `cadê a bolsa do neném?¿. E a bolsa do neném não era necessária naquele momento, pois o bebê não tinha nascido e então meu marido saiu do quarto para pegar. Quando ele virou as costas, a enfermeira falou: `vai ficar gritando muito ainda?¿. Quando o bebê estava quase nascendo, ela pegou uma cadeira de rodas e me fez sentar à força enquanto eu estava com contração fortíssima. Foi um parto terrível. Eu não tinha conhecimento sobre as doulas.

Na minha terceira gestação, quando eu soube que estava grávida, eu entrei em depressão. Falava para o meu marido que eu não queria ter esse bebê, que eles iam me maltratar. Um dia estava mexendo no Facebook e vi uma publicação sobre gestantes e doulas e entrei em contato. Eu estava desesperada, tinha medo de ter o filho e já estava procurando médicos para pagar uma cesárea quando a doula me acalmou. Ela disse que ninguém ia me violentar porque ela ia me acompanhar. Ela trabalhou o meu emocional e foi um alívio. Eu questionava se ela podia entrar mesmo, se alguém ia me maltratar e ela me disse que se tivesse que gritar eu ia gritar, e quanto mais gritasse mais eu ia dilatar. E por fim, o terceiro parto foi o parto dos sonhos.

Hoje sou doula e quero fazer muita diferença na vida das mulheres: que não aconteça com elas o que aconteceu comigo. Lutarei por elas.¿

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