Quando a então ministra Dilma Rousseff disse, durante o Painel RBS em Joinville, em 2008, que o governo pensava em concluir a duplicação da BR-280 no terceiro trimestre de 2010, fez uma previsão ambiciosa. Em geral, este é o tempo que rodovias demoram para ficar prontas a partir da chegada das máquinas ao canteiro de obras, isso depois de todos os estudos, projetos e processo licitatório.

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Segundo o professor e secretário de engenharia e arquitetura do Ministério Público Federal em Brasília, André Kuhn, do surgimento da necessidade até a entrega de uma obra, estima-se que cinco anos seja um prazo razoável em países considerados ágeis, como o Japão.

Ex-integrante do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), em Brasília, onde trabalhou por dois anos e ocupou o cargo de coordenador-geral de desenvolvimento e projetos, ele explica que esse é o tempo mínimo necessário para se completar etapas essenciais. A título de exemplo, ele cita o estudo de viabilidade, que prevê a análise do ciclo das chuvas durante todo o ano. É, portanto, impossível concluí-lo antes de 12 meses.

– O grande problema de atrasos em obras rodoviárias no Brasil não se restringe ao processo licitatório, mas, principalmente, ao que acontece antes e depois da licitação. Deve-se dispor de um prazo adequado para elaboração do projeto de engenharia – avalia.

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O especialista explica que nos Estados Unidos, por exemplo, não se executa uma construção de obra rodoviária sem se investir, pelo menos, cinco anos em estudos e projetos. No Brasil, avalia Kuhn, as obras são imediatistas, muitas vezes decididas por questões mais políticas do que técnicas e gerenciais. Isso gera pressões para que a obra seja executada o mais rápido possível após a tomada de decisão.

– Obra rodoviária não é um produto de prateleira. Requer tempo para elaboração de projeto de engenharia, planejamento, execução, controle e entrega – explica.

Outro grande problema ocorre após a licitação. A fiscalização, muitas vezes, não tem o devido preparo quanto às questões legais e gerenciais que envolvem os contratos de obras públicas, o que facilita prorrogações de prazos e aditivos de valores indevidos, diz Kuhn.

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O que gera a sensação de demora e ineficiência é o que diferencia o Brasil dos países desenvolvidos: a ausência de planejamento de longo prazo. De acordo com o professor, nos países mais desenvolvidos, identifica-se uma necessidade para daqui a dez anos e as providências são tomadas no período adequado, de modo que o término da obra coincide com as necessidades da população. No Brasil, isto não acontece, explica Kuhn. As obras saem do papel a partir da necessidade, e quando ficam prontas, já estão defasadas em relação à radiografia que a originou.

Características da região tornam o projeto complexo

No caso da BR-280, não é apenas a complexidade da obra que justifica a longa espera. Outros fatores contribuíram para atrasar o cronograma. Um deles diz respeito à própria característica da região envolvida na duplicação. A rodovia passa por quatro municípios, com trechos pertencentes a proprietários particulares e passíveis de desapropriação e impacta terras indígenas e Mata Atlântica, além de atravessar solos de baixa densidade, que exigem soluções técnicas demoradas para adensá-los e suportar o peso do aterro.

Longos debates e negociações foram travados em torno destas questões por cerca de dois anos. Ibama e Funai pediram uma série de informações e ajustes.

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– No lote 2.2 (entre Guaramirim e Jaraguá do Sul), por exemplo, mesmo depois de concedida a licença de instalação, o Ibama identificou degradação ambiental potencial e solicitou que se alterasse o traçado da rodovia no acesso ao Morro do Vieira. O DNIT, então, introduziu um viaduto no projeto, que não estava previsto no contrato e vai gerar aditivo – explica Huri Alexandre, engenheiro do DNIT e coordenador da área de projetos de Santa Catarina.

Para o engenheiro, a falha está no sistema, não em um departamento em especial. Ele diz que cada órgão pensa de uma forma e um depende do outro para dar o parecer.

O Canal do Linguado é outra discussão presente na duplicação da rodovia. A sua abertura aguarda autorização judicial. Para evitar realizar obras que possam perder a validade posteriormente, o engenheiro do DNIT alega que é preciso aguardar a Justiça.

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Cartas marcadas e imbróglio na Justiça

Em 2011, a duplicação da BR-280 sofreu um baque quando surgiu a denúncia de que a obra estaria ligada a um esquema de corrupção. Na véspera da data marcada, o DNIT revogou a licitação, atendendo a orientação do Ministério dos Transportes, após indícios de que a empresa e o valor para duplicar um dos lotes já teriam sido escolhidos antes da abertura das propostas.

O procurador do Ministério Público Federal em Joinville, Mário Sérgio Barbosa, recorda-se de que, na época, recebeu uma ligação anônima informando qual seria a empresa vencedora. Ele chegou a registrar o nome em cartório, mas no dia em que seria divulgado o resultado a licitação foi cancelada. Barbosa não conseguiu confirmar a denúncia.

No trecho que liga a BR-101 a São Francisco do Sul, o mais atrasado dos três lotes, houve disputa judicial entre empreiteiras. Uma das empresas questionou o resultado e entrou com ação na Justiça para suspender a licitação. Diante do imbróglio, o DNIT decidiu, em fevereiro do ano passado, cancelar a licitação e começar tudo de novo.

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Questionamentos de órgãos ambientais, contestação judicial de empresas perdedoras e dúvidas sobre valores das desapropriações são fatores previsíveis em obras rodoviárias e considerados no momento da definição de seus prazos, explica o professor e secretário de engenharia e arquitetura do Ministério Público Federal em Brasília, André Kuhn.

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