A ascensão do pastor Marco Feliciano (PSC-SP) à presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara não teve contornos divinos ou milagrosos. Envolveu senso de oportunidade e articulação política, marcas da atuação da bancada evangélica no Congresso Nacional.

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Criada há 10 anos, a Frente Parlamentar Evangélica (FPE) – nome oficial do grupo – congrega 68 deputados em exercício, oriundos de 20 Estados e de 16 partidos. É reconhecida por ser um das bancadas mais coesas da Câmara. Monitora a tramitação, em comissões e plenário, de projetos que chocam princípios bíblicos e assegura trabalhar por um resgate dos valores da família. Assim, elenca bandeiras.

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Conforme o último Censo, o Brasil tem 22,2% de evangélicos (42,3 milhões de pessoas), porção que acaba representada pela frente parlamentar, que reúne membros de igrejas pentecostais e neopentecostais, tendo domínio da Assembleia de Deus. A composição é heterogênea. Há nomes conhecidos, como Benedita da Silva (PT-RJ) e Anthony Garotinho (PR).

– A bancada garante presença e voz em todos os espaços do parlamento – analisa o cientista político Leandro Gabiati.

A reforma do Código Penal, em andamento no Congresso, é um exemplo de projeto monitorado. O texto elaborado por uma comissão especial de juristas prevê a flexibilização do aborto e da eutanásia, além de permitir o uso controlado de drogas para consumo pessoal, propostas que já são vistas como derrotadas. Retirar estas leis do projeto faz parte do acordo com evangélicos para aprovar todo o código.

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A mesma mobilização é vista nas tentativas de legalizar a prostituição e no PL 122, que criminaliza a homofobia.

– Pelo projeto, padre ou pastor não pode dizer que é pecado homem casar com outro homem, isso tolhe a liberdade de pensamento e expressão – reclama Zequinha Marinho (PSC-PA).

Embora responda por 13% do parlamento, o grupo não tem peso para influenciar uma votação. Mas tem capacidade de mobilização popular a ponto de intimidar os demais deputados.

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– A frente reage aos projetos que discorda. Por não ter maioria, é comum se articular com grupos de católicos conservadores aumentando sua força – explica Gabiati.

Para impedir que propostas contrárias aos seus preceitos avancem, a frente marca território nas comissões. A divisão é definida nas reuniões do grupo, todas as terças, e respeita a formação e experiência dos deputados.

– É a forma de verificarmos o que está tramitando, onde podemos colaborar – explica o deputado Ronaldo Nogueira (PTB-RS), pastor da Assembleia de Deus.

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Além de Nogueira, o outro gaúcho que integra a frente é Onyx Lorenzoni (DEM).

Bancada mobilizada por pastor Feliciano

Centro da discórdia que se instalou no Congresso, pressionado a renunciar, o pastor Marco Feliciano (PSC-SP) resiste na presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias.

Apesar de pedir prudência e palavras bem dosadas ao religioso paulista, a Frente Parlamentar Evangélica é contra a saída do deputado acusado de racismo e homofobia. O grupo considera que chegou sua vez de mediar as discussões sobre direitos humanos no Câmara.

Feliciano não esperava assumir a presidência da comissão em que já atuava, isolado e detestado por movimentos sociais. Pouco privilegiada, a Comissão de Direito Humanos convive com assentos vagos nas 36 cadeiras que oferece. Apesar de tratar de temas relevantes, é preterida por áreas com maior peso no parlamento, como Constituição e Justiça ou Educação. Historicamente presidida pelo PT, a comissão, ao que imaginava o Partido Social Cristão (PSC), continuaria na mesma rédea. Foi no rateio das comissões, em fevereiro, que veio a surpresa – e a oportunidade.

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Quando um partido comanda uma comissão, é praxe escolher um parlamentar que já atuava nela, o que transformou Marco Feliciano em candidato natural. Motivo de preocupação para o líder do PSC, o sergipano André Moura. Na reunião semanal do PSC, Moura apresentou um dossiê sobre o pastor. Reuniu frases polêmicas no Twitter e reportagens.

– Vai ser um desgaste – alertou.

– Temos de matar no peito – rebateu um colega.

Mais da metade dos deputados do PSC são pastores ou missionários, grupo que lhe deu respaldo, movimento repetido dentro da frente evangélica.

– É a primeira vez que um pastor assume a comissão. A esquerda sempre teve o monopólio da discussão. Essa troca de pontos de vista faz parte da democracia – argumenta João Campos (PSDB-GO), que comanda o grupo parlamentar

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Crentes que são vítimas de uma manobra política, os evangélicos transformaram a eleição de seu membro em questão de honra.

– Com esse alarde todo, o PT e seus aliados tiram o foco dos seus problemas. Deveríamos estar protestando pela presença de dois mensaleiros condenados (João Paulo Cunha e José Genoino) na Comissão de Constituição e Justiça – esbraveja Campos.

As manifestações, contudo, continuam, a ponto de o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), pedir a saída do pastor e dar um prazo até a próxima terça-feira para uma decisão.

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