Lutar exige destemor e perseverança. Quando o combate inicia é risco, é usar os melhores golpes contra o adversário, revidar e tentar o nocaute. Cada impacto sofrido remete a incerteza da vitória, o segredo está em não demonstrar que está ferido. Estratégia que o joinvilense Vitor Miranda, atual atleta do Ultimate Fighting Championship (UFC), tira de letra, porque traz para o octógono o que aprendeu na vida.
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– As dificuldades vão aparecer, mas não acuse o golpe, aprenda com o erro, levante a guarda e continue em frente tanto na luta quanto na vida – explica ele.
O lutador visita Joinville para rever os amigos, familiares e fãs. Também aproveita o tempo de descanso para realizar palestras sobre sua trajetória de atleta em escolas da comunidade. Neste mês, esteve no Centro Educacional Dom Bosco, na Univille e na Udesc.
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Vitor tem 36 anos, é brincalhão, chocólatra e diz que adora passar as madrugadas jogando videogame. O atleta começou a fazer aulas de Muay Thai por indicação de um amigo, aos 21 anos, idade relativamente tarde para atletas profissionais, mas adquiriu a habilidade rápido. O preparo físico, ele trouxe do basquete, esporte que praticava na escola desde os 13 anos.
– Antes de fazer as aulas de Muay Thai, a única referência que eu tinha eram os filmes do Van Damme que eu via várias vezes seguidas gravados da TV em fitas VHS lá em casa – brinca.
O Muay Thai foi paixão “à primeira aula”. Em apenas dois anos, os treinos de três horas por dia e seis dias por semana valeram a pena quando Vitor foi campeão do K-1, competição de Muay Thai, na Turquia. O atleta decidiu largar o emprego em uma locadora de Joinville e se dedicar somente ao esporte, intercalando os dias como professor de Muay Thai e os treinos.
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Mudança para o Rio de Janeiro
O destino pregou uma peça em Vitor: no mesmo ano que recebeu o título de campeão de K-1, o evento declarou falência. Uma ligação inesperada do treinador Pedro Rizzo, no entanto, reativou as esperanças de Miranda. O convite era para Vitor treinar com ele no Rio de Janeiro. Lá, o joinvilense conheceu o MMA e teve a oportunidade de substituir um atleta no ringue. A preparação foi rápida, durou somente um mês e Vitor perdeu. Chateado, enquanto chorava no vestiário, um treinador que até então ele não conhecia o encorajou com a frase que ficou gravada na mente do campeão: “Você dá pra esse negócio, cara!”.
Em 2010, Vitor se mudou definitivamente para o Rio de Janeiro com a esposa e o filho para ser treinado por especialistas na modalidade MMA.
Mudança para os EUA
A segunda ligação inesperada recebida por Vitor ocorreu no final do ano de 2010. Um treinador brasileiro que morava na Flórida ofereceu treino e hospedagem para o lutador. Ele lembra com bom humor de ter vendido o videogame e de pegar R$ 500 emprestados de um amigo para passar um mês de teste nos Estados Unidos. A esposa e o filho se mudaram no mês seguinte.
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Morte do filho
A data de 20 de junho de 2011 está fixada na mente do lutador para lembrar que nenhum golpe no ringue será mais duro do que a perda que sentiu nesse dia. Vitor conta que era uma segunda-feira, saiu de casa para dar uma aula de Muay Thai enquanto a esposa ficou com o filho em casa, Igor, de apenas três anos. O menino sentiu vontade de comer um biscoito e foi buscar na casa do lado na qual estava. No trajeto, se deparou com uma piscina.
A mãe, Paula Miranda, percebeu a demora do filho e, quando foi procurá-lo, viu o filho boiando na água. O menino ficou internado em coma por três dias, mas não resistiu. Ele morreu no dia em que completaria quatro anos. Vitor ainda se emociona ao lembrar o fato e permite que uma lágrima caia durante a entrevista.
Volta para o Brasil
Depois da morte do filho, Vitor, com o visto vencido, para o Brasil. A mudança foi para Curitiba, onde a família da esposa dele mora.
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– Eu e a Paula tínhamos apenas duas malas. Ficamos morando na casa do meu cunhado por tempo indeterminado até eu resolver o que faria – lembra.
No final de 2011, Vitor tentou participar da primeira edição do The Ultimate Fighter (TUF) Brasil, mas foi reprovado no primeiro teste. O dia terminaria com um convite irrecusável. Enquanto Vitor estava no hotel no Rio de Janeiro, um dos integrantes do Team Nogueira chamou o lutador para fazer parte da equipe.
– Por mais que eu tenha passado por muita coisa difícil na vida, sempre caía um anjo do céu para ajudar, sabe? Nunca aconteceu alguma coisa que eu não conseguisse superar, sempre alguém estendia a mão – lembra.
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De volta ao Rio de Janeiro
Com Vitor dentro do time da Team Nogueira, o casal voltou para o Rio de Janeiro. Em 2012, ele conta que começou a se dedicar aos treinos em tempo integral sem precisar dar aulas para complementar o orçamento.
– Foi a partir dali que eu comecei a virar um lutador de MMA de verdade. Três meses depois, eu já participava de eventos – diz.
Desde então, a única vez que perdeu uma luta foi para Antônio Carlos na final do TUF Brasil 3. Em abril de 2014, foi contratado pelo UFC, vencendo as duas primeiras lutas, a primeira em dezembro de 2014 contra Jake Collier e a segunda no início deste mês contra Clint Hester.
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– Eu tenho mais segurança agora. Provei para mim mesmo e para aqueles pentelhos que não acreditavam que eu consigo. Agora é outra história, mas eu cheguei até aqui e isso já é uma vitória – comemora.
A próxima luta não está marcada ainda, mas o atleta pretende participar de pelo menos mais uma luta no UFC até o fim deste ano. Por enquanto, o atleta comemora a última vitória com um período de férias para visitar a cidade natal, rever os amigos, família e comer alimentos fora da dieta (como os chocolate que são sua tentação). E, além disso, poder ficar até de madrugada jogando vídeo game.
Planos futuros
– É surreal, eu não gosto de pensar se não fico com uma pressão muito grande, ao mesmo tempo fico muito orgulhoso. Até o final de 2016, pretendo estar entre os 15 melhores do UFC na categoria peso médio – avisa.
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